Além do Glamour - Revista Esquinas

Além do Glamour

Por Beatriz Oliveira e Caroline Andrade : fevereiro 13, 2019

Foto: Reprodução

A jornalista Mônica Salgado revela detalhes de sua experiência nas redações e os paradigmas do jornalismo de moda

Com apenas 38 anos de idade, a jornalista Mônica Salgado, já passou por diversas revistas do universo feminino, entre elas Elle, Vogue e Glamour, sendo esta última lançada no Brasil com a linha editorial criada por Salgado. Atualmente, após sua saída da Revista Glamour, ela começou a se dedicar aos projetos pessoais, que conta em detalhes, nesta entrevista.

Embora seja uma jornalista com a carreira de sucesso e consolidada na área da moda, ela se dedica muito a sua família – faceta que expõe em seu Instagram, no qual se descreve como mãe e esposa. Apesar de ter uma agenda lotada, que se divide entre as gravações do seu quadro Selfie da Verdade no Vídeo Show (hoje extinto), administração da sua imagem como influencer e sua família, Mônica Salgado recebeu ESQUINAS para uma entrevista, em seu apartamento no Panamby, zona sul de São Paulo.

Entre os temas comentados, a jornalista fala sobre as mudanças no mercado de trabalho, apresentando sua visão das principais revistas em que trabalhou. Ela acredita que a Vogue é uma “instituição de moda” que dificilmente irá se extinguir, enquanto a Glamour já nasceu antenada nas mídias sociais e que está sempre se reinventando.

A conversa rendeu esses e outros assuntos, assim como dicas para os estudantes de jornalismo que desejam ingressar na moda e a relação entre a vida pessoal e a profissional.

ESQUINAS Por que você escolheu jornalismo? Você sempre quis trabalhar com jornalismo de moda?

Eu escolhi jornalismo muito por influência da minha mãe. Ela era professora de Português. Hoje é aposentada. Então sempre tive uma intimidade com esse universo, minha mãe lia muito e me estimulou. Eu fui lendo as revistas dela e me encantando por aquele universo. Sempre quis trabalhar com revista feminina, nunca pensei em fazer jornalismo para trabalhar em jornal, minha paixão sempre foi escrever, então eu não tive muita dúvida do que eu prestaria, por causa da minha paixão pelo Português.

ESQUINAS Você chegou a trabalhar em outros ambientes do jornalismo, fora moda e revistas femininas?

Sim, eu trabalhei em assessoria de imprensa. Nunca foi só moda, sempre foi o universo feminino, então todos os lugares dos quais eu já trabalhei, Vogue, Glamour, trabalhei com marketing também, assessoria de imprensa, mas sempre foi ligado a moda e assuntos femininos.

ESQUINAS Você conseguiu realizar os sonhos que tinha no início da sua carreira?

Acho que no jornalismo consegui. Tem outras coisas que eu quero realizar agora fora do jornalismo nessa nova fase. Quando eu cheguei na Vogue com 27 anos eu falei: “É isso que eu quero, é aqui que eu quero trabalhar”. Ai fiquei 5 anos na Vogue, depois 5 anos na Glamour, então cheguei ao ápice, fui diretora de uma revista que eu amava, que tinha tudo a ver comigo, que eu construí. A gente construiu ela aqui no Brasil, moldamos a revista do jeito que achávamos que tinha que ser, então foi uma experiência muito intensa. Eu acho que dificilmente na minha carreira vai se repetir uma história assim tão intensa quanto foi trazer a Glamour para o Brasil. Então, eu me considero muito plena nas coisas que eu realizei no jornalismo.

ESQUINAS E para você foi difícil o começo na Vogue?

Eu acho que foi mais difícil antes, por que eu achava que eu nunca ia conseguir, as coisas não aconteciam para mim. Então, quando eu entrei na Vogue passei muito perrengue, por que tinha uma estrutura muito pequena, não tinha dinheiro pra fazer nada, eu comecei como editora de projetos especiais, que basicamente a equipe era eu. Mas sabia que era aquilo que eu queria, então foi um estímulo a mais pra aguentar. Na Vogue foram 5 anos bem intensos, mas nada se compara ao o que eu vivi na Glamour, além da quantidade de trabalho, tinha a responsabilidade de não ter ninguém acima de mim pra filtrar.

ESQUINAS Como foi quando você assumiu a Glamour?

Ah, quando eu assumi a Glamour queria fazê-la dar certo. No começo a revista foi mal recebida, acho que a revista se lançou de um jeito muito único, um vídeo clipe com as pessoas da redação, lançamos a camiseta “I Love Glamour” e a primeira estrela da capa que era a Juliana Paes estava vestindo a camiseta. Encaramos o universo do Jornalismo de um jeito diferente, vendemos a marca Glamour antes de estar nas bancas. O primeiro ano foi muito difícil, muitas pessoas achavam que era uma revista teen e não era. Era uma revista feminina, mas acho que no começo, talvez a primeira capa tenha sido um erro, no sentido de que ela realmente imprimiu muito teen, então ficou na cabeça das pessoas. E eu era muito cobrada pelos meus chefes, a linguagem da revista era muito diferente, era bem-humorada, então as pessoas achavam que era um produto de menor qualidade, mas o jornalismo que era praticado ali era de boa qualidade, isso tudo me irritava muito. O auge só chegou em 2014 o nosso terceiro ano, aí a Glamour estourou de vez e as pessoas começaram a entender que era uma revista de qualidade, mas uma revista leve. Foram dois anos muito felizes, então no último ano com a mudança do mercado começou a cair um pouco.

ESQUINAS Das revistas da edição globo, você trabalhou na Vogue e na Glamour e elas tem essa pegada diferente. Acho que a Vogue ela tem uma proposta mais conceituada, enquanto a Glamour é mais leve. Isso era perceptível na redação também, quando você esteve nelas?

Sim, com certeza. O ambiente, as pessoas, o jeito de se relacionar com o mercado e o entorno é totalmente diferente. Tudo é a filosofia, acho que tem a vibe da revista, como revista é alegre e leve, acho que acaba atraindo para trabalhar gente que conjuga desses valores (comenta referindo-se a Glamour) e a Vogue é uma instituição de moda, uma revista que está acima do bem e do mal para quem trabalha com moda, é uma qualidade excepcional, o clima é diferente.

ESQUINAS E você acha que tem muita competitividade entre os jornalistas nesse ramo da moda?

Não sei se tem especialmente no mundo da moda, não acho que tenha. Eu acho que tem no sentido de que sempre foi uma área muito restrita, tem pouquíssimas revistas e cada revista tem um time de moda restrito.

ESQUINAS Você sentiu que você conseguiu levar alguma amizade com a sua equipe?

Não, pouquíssimas pessoas, infelizmente. Essa foi uma das grandes dores da minha vida, apesar de ter saído em um clima relativamente bom, eu pedi para sair e esperei. O andamento da revista depois da minha saída foi meio complicado, eu acho que as pessoas não queriam ser vistas comigo, bem triste. Mas tem algumas pessoas sim, pouquíssimas, mas eu sei que vão ser minhas amigas  para o resto da vida.

ESQUINAS Foi diferente de quando você saiu da Vogue?

Ah total, da Vogue eu saí para a mesma editora. Tinha um clima de alegria e celebração. Eu não fiquei triste ao sair da Glamour, fiquei mais triste com a reação das pessoas. Eu fiquei seis meses me preparando para sair, então já era uma coisa muito certa para mim, eu estava louca, tinha um monte de compromissos para cumprir assim que eu saísse.

Tem jornalista que é preconceituoso, principalmente o jornalismo de moda que estava numa zona elitista, mas a moda virou assunto de todos e as blogueiras podem opinar

ESQUINAS Quando você saiu do marketing de moda e foi pra Vogue você tinha alguma expectativa nas redações, por que a gente cria muito uma expectativa de como vai ser, você tinha alguma?

Então eu já tinha uma experiência do que era uma redação porque trabalhei um ano com Elle. Mas trabalhar na Vogue era algo completamente diferente. Eu lembro todo dia que eu entrava na redação e falava: “Tô trabalhando na vogue”, entrava com orgulho. A Vogue na carta editorial, era uma estrutura menor, mas o processo do dia a dia, aplicar o texto, bater as imensas,  fazer a revisão, passar pra Daniela que lia tudo, eu aprendi. Não sei qual era a minha expectativa, eu entrei como diretora de projetos, eu nem sabia o que era isso ou o que eu iria fazer. Então eu não tinha muita expectativa, pra mim era tão legal estar ali que qualquer coisa que me mandasse fazer eu faria.

ESQUINAS Então você acha que você foi adquirindo experiência da moda e tendência que não são uma coisas simples, precisam que ser estudadas, conforme você ia conhecendo?

Eu sempre fui muito estudiosa. Na verdade meu interesse por moda vem bem antes da Vogue, quando eu entrei na Elle eu comecei  a cobrir SPFW em 2001. Então eu já tinha uma intimidade, já tinha feito bastante curso, fiz história da moda, jornalismo de moda, texto de moda e aí eu ficava conhecendo as pessoas do mercado, é muito legal fazer curso por causa disso. Fiz meu networking. Quando eu cheguei na Vogue já tinha uma boa noção de história da moda, do século XX, até hoje, são coisas que você não esquece, eu uso muita coisa para as palestras ainda.

ESQUINAS Nós estivemos na redação da Glamour recentemente e eles falaram que lá o ambiente é muito agradável, que as pessoas realmente são amigas. Você também percebia esse ambiente amigável?

Não sei, gostaria de dizer que sim, mas acho que as relações no mercado de trabalho elas são muito contaminadas pela hierarquia. Não que não exista amizade, eu também achava que na minha época era todo mundo uma família, depois que acaba a hierarquia as pessoas se … então sinceramente não sei.

ESQUINAS A gente vê agora revistas como a Elle fechando. Você acredita que o jornalismo de moda tenha que se reinventar, assim como os outros, para não perder espaço no mercado, primeiramente impresso?

Eu acho que o jornalismo já tinha que ter se reinventado a muito tempo, muita gente demorou para se reinventar. A Glamour nasceu com essa vantagem, em 2012 já tinha Instagram, as redes sociais já eram uma realidade forte e as blogueiras já estavam ali começando a dominar o cenário. Olhar para isso ensinou pra gente muita coisa.

Então eu acho que o jornalismo demorou sim, tem jornalista que é preconceituoso, principalmente o jornalismo de moda que estava numa zona de conforto muito elitista, mas a moda virou assunto de todos e as blogueiras podem opinar. Alguns dos meus colegas e as revistas olharam para isso com muito preconceito e indignação. Hoje todo o conhecimento de moda é fragmentado, antigamente quando alguém queria entender de moda comprava uma Vogue, hoje em dia se você quer entender de moda, você segue a alguém influente ou uma marca. Acho que o jornalismo de moda ele vai ter que primeiro enxergar o seu lugar diante dessas mudanças, não adianta enxergar um passado que não existe mais. A Elle era uma revista gostosa de ler por exemplo, eu gostava.

ESQUINAS E você acha que essa sua visão em 2012 com a Glamour, para esse novo mercado com as blogueiras te ajudou hoje a trabalhar como influencer e com publicidade, como você faz agora?

Eu acho que todas as coisa são uma coisa só. A minha cabeça era muito aberta para as coisas novas que estavam acontecendo e aí as blogueiras entraram, a nossa sacada foi ficar ligada no mundo e onde as nossas leitoras, que não estavam lendo, estavam buscando a informação. Então trabalhamos com as blogueiras, uma linguagem mais ágil e moderna, uma diagramação mais que converse com o feed do Instagram ou com a tela de um site,nos aproximamos daquilo que as pessoas estavam achando gostoso de consumir. O interesse por essas coisas acabou me levando pra esse universo, fui me interessando e gostando de fazer. Eu gosto de redes sociais e de fazer conteúdo pro Instagram, dizer quem eu sou. As minhas cartas do editor sempre foram cartas que eu colocava ali episódios da minha vida, acho que isso foi uma coisa que me ajudou a chegar até aqui, as pessoas me conhecerem e saberem quem eu sou, me colocar como humano foi uma fonte de identificação.

ESQUINAS E por mais que a moda seja mais acessível para a população em geral, você acha que ainda tem aquele preconceito que moda é uma coisa mais superficial. Eu falo isso em relação a própria faculdade

Ah não mas na faculdade de Jornalismo é outra coisa. Aí que preguiça gente, eu me formei a 20 anos e isso ainda acontece… A gente sempre vai ter emprego, hoje em dia existem tantas assessorias de comunicação que conectam os parceiros, fazem estratégias de marketing e tem também as próprias marcas gerando conteúdo de moda, todas as marcas tem site. Realmente vão sobrar pouquíssimas revistas femininas e de moda, mas essa mão de obra vai ser absorvida pelas marcas que geram conteúdo e assessorias de comunicação, enquanto que eles vão trabalhar aonde?

Mônica Salgado trabalhou em diversas publicações do universo feminino
Instagram/ Rodrigo Zorzi

ESQUINAS Você acha que no futuro as revistas de moda vão passar a ser só no digital?

Eu acho que muitas vão, a Glamour por exemplo, certamente vai pro digital muito rápido. Mas acho que uma revista como a Vogue por exemplo ela tem uma vantagem. A Vogue dificilmente acaba, ela é uma instituição, uma Bíblia, a marca Vogue. A tendência é que a revista se torne cada vez mais luxuosa, mais cara, como um item de colecionador.

ESQUINAS A tendência é que ela fique mais conteudista e específica?

Sim, mais análises e mais editoriais do que notícias e notinhas. Eu acho que a ideia pra você pagar aquele valor (alto) é que seja uma revista mais perene e não uma revista que no mês que vem vai estar necessariamente com notícia velha.

ESQUINAS Teve algum momento que você pensou em desistir ou que você se decepcionou com alguma situação que aconteceu?

Não, desistir não. Teve aquele momento que eu falei que eu achava que as coisas não aconteciam pra mim do jeito que eu queria e aí eu estava um pouco decepcionada mas nunca pensei em desistir, nem saberia o que eu ia fazer se não fosse isso sabe ?

ESQUINAS E trabalhar no Vídeo Show, como é essa experiência, sair da redação e da posição que você tinha lá e ir direto para as câmeras.

Então, no começo foi bem difícil. Eu tive que reaprender a trabalhar, operar em outro ritmo e a não ter uma equipe trabalhando para mim, isso faz muita diferença. Os primeiros seis meses foram mais difíceis. A minha terapeuta fala que você precisa de dois anos pra mudar de vida, agora que eu to com um ano e meio eu acho que estou super adaptada, mas leva um tempo.

ESQUINAS Mas você gosta de trabalhar assim agora, uma frequência menor também…

Gosto, é diferente o é ritmo menor. Por exemplo, amanhã é um dia que eu não tenho nada de trabalho. Mas viajo bastante, as vezes fico quatro meses no Rio. Tenho muita autonomia na minha agenda, é um trabalho gostoso, as reuniões, palestras e jantares que são trabalho e ao mesmo tempo não rs, eu posso escolher o que faço. E aí as gravações eu faço na hora que eu acho que tenho que fazer, controlo o número claro, mas não fica ninguém me enchendo o saco “Mônica você tem que produzir mais, Mônica isso”, tenho muita liberdade pra produzir tudo.

ESQUINAS E é claro que você atingiu esse patamar depois de ralar muito área, todo o esforço que você fez nas revistas…

Sim o Vídeo Show sim, porque eu conheci muitas pessoas nas revistas. Acho que muita coisa também é um legado da Glamour, e as palestras com certeza, as marcas me contratavam porque eu tenho uma história lá. Agora as marcas me contratam porque eu já fiz muitas palestras e aí eles vão vendo o meu serviço com a divulgação. Outra coisa que eu tenho feito muito além da palestra é mestre de cerimônia, é muito legal. Também tenho feito muita mediação de bate papo. Não é necessariamente moda, mas são coisas que eles precisam de alguém com credibilidade, por isso que gostam de fazer com jornalistas que saibam improvisar e conduzir a conversa. Então eu tenho feito isso e tá sendo muito legal, gosto de fazer.

ESQUINAS Quais são os seus planos para o futuro ? Coisas grandes, igual quando você tinha quando entrou na faculdade, algo bem idealizado.

Eu tenho meu livro que eu já estou trabalhando com a Companhia das Letras. Acho que escrever livro é uma coisa que deve ser muito legal, mas esse livro não é ficção que eu vou fazer é uma coisa meio de auto ajuda ao contrário, a ideia é interessante.

ESQUINAS Você tem vontade de fazer uma autobiografia?

Não, a minha não, imagina é muita pretensão. Eu tenho a vontade de fazer a biografia de alguém. Mas o livro às vezes me dá um pouco de preguiça, que eu penso “ai meu Deus tem que parar tudo”, precisa  ter uma concentração pra fazer, talvez ainda não seja o momento. Então esse livro que eu faria agora seria ótimo porque não é exatamente uma autobiografia, são lições a partir da minha historia,da parte mais negra da minha história. Não da parte legal, da parte que eu fiz a entrevista e passei, mais do lado b das coisas. Quando eu não passei, quando eu quase desisti. É uma auto ajuda meio que ao contrário, mas que no fim ajuda. O caminho é muito tortuoso até ele ajudar, não é “seja otimista que tudo vai dar certo”, eu não acredito nisso. Você precisa se mexer, não adianta gratidão se você não fizer. O livro é uma coisa. Eu tenho um projeto especial que é o “Talk com Môni”, que eu quero viabilizar de viajar o Brasil  sem necessariamente ser alguém me contratando. Quero fazer  negócio com isso, uma marca minha que vou comercializar. Esse são dois projetos que eu tenho mais viáveis de fazer acontecer.

Queria ter um programa no GNT ou na TV fechada queria ? Queria. Um programa de entrevistas porque eu gosto de gente, mas com essa pegada de tentar mostrar o “lado b”, uma coisa que ninguém mostrou.

ESQUINAS Já pensou em criar um canal no YouTube?

Então, teria essa possibilidade sim. Mas enquanto eu estiver na Globo não, porque pelo meu contrato eu nem posso. Teria que ver como as coisas vão se desenhar.

ESQUINAS E sobre as coisas que deram certo durante sua carreira, teve alguma pessoa que você gostou bastante de entrevistar ou algum projeto que você conseguiu pôr em prática?

Tudo o que eu fiz na Glamour me deixou muito feliz. A capa com as blogueiras em julho de 2013, que mudou a história da Glamour e me deu muito orgulho. Quando fizemos também aquele projeto “Cara lavada com Glamour”, que foi um editorial que depois acabou viralizando e tornou-se mais tarde uma exposição. A forma como a gente lançou a revista, com um clipe e uma camisa exclusiva. O prêmio geração Glamour e o Beauty Festival, que construímos aqui no Brasil, durante a minha gestação. Tudo isso me dá muito orgulho e foram coisas muito suadas que nunca caíram do céu, tínhamos que fazer acontecer, mesmo quando a diretoria não queria.

ESQUINAS Em algum momento da sua vida profissional você precisou colocar o dinheiro acima do seu amor pela área escolhida?

Não, nunca. Muito pelo contrário, na Glamour eu estava tão focada na marca, que o dinheiro não era algo primordial, claro que o dinheiro era importante e eu tinha um salário “ok”,sabemos que essa não é uma área bem remunerada. E eu não podia fazer nada por fora, me chamavam pra fazer palestras e raramente eu podia aceitar, isso gerava uma “tristezinha”. Mas eu nunca optei por uma coisa só porque pagava melhor, nem agora, quando aparece propostas de parcerias ou eventos em que eu acho que não me sentirei à vontade realizando, eu não faço. Apesar de às vezes ser uma dor no coração o dinheiro que eu vou perder.

ESQUINAS Mas você conseguiu colocar suas vontades mesmo dentro de uma revista, que querendo ou não tinha uma linha editorial própria, com interesses próprios também?

Ah, as limitações aconteceram um pouco no final… Mas a linha editorial fui eu que fiz, eu tive total liberdade para criá-la. Lembro quando comecei a escrever “pra” ou invés de “para” e o meu diretor geral disse que era um absurdo, que eu estava assassinando o português. Mas então eu disse que a língua portuguesa se reinventa, ela é um organismo vivo. Enfim, precisamos estar abertos, a gente fala “pra” no cotidiano, e nem por isso eu deixarei de utilizar a vírgula ou uma crase. A linha editorial da Glamour foi uma criação minha, então por um bom tempo não tive problemas com isso. Ela começou a mudar, com a chegada de uma diretora editorial, que estava acima de mim e a partir desse momento houveram muitas discussões entre nós duas e foi quando eu me senti desconfortável e comecei a preparar minha saída.

ESQUINAS Esse foi um dos motivos para você sair?

Ah foi. Acho que também. Se pegar 10 motivos, este será um deles. Mas tiveram outros, o mercado, minha vontade de fazer outra coisa, minhas oportunidades fora, a sensação de eu ter esgotado tudo o que eu queria fazer ali, ter esgotado minha história lá e a minha  família, eu estava muito cansada. Eu quase nunca tinha levado meu filho para a escola e agora almoçamos juntos todos os dias, eu tento até não marcar nada nesse horário para poder desfrutar desse momento e levar meu filho para a escola. Então até hoje quando a gente senta para almoçar, eu falo “Nossa eu estou almoçando em casa em plena segunda feira com meu marido e o meu filho”.

ESQUINAS Você sente que perdeu muitos momentos com eles em prol da carreira?

Hmm… Perdi, algumas coisas. Mas nunca foi algo em exagero, por exemplo eu nunca perdi uma apresentação da escola do meu filho, nunca aconteceu. Mas são fases né, eu tinha que fazer aquilo naquele momento.

ESQUINAS Você sentiu como mulher algum grande desafio nesse universo que não é composto por homens?

Eu acho que ainda é um universo muito feminino então eu nunca sofri nenhuma discriminação de gênero. Como mulher o preconceito em geral é mais porque é um trabalho que exige uma dedicação full time, pelo menos para mim era assim. Acabei me dedicando demais, teve um período que eu vivia 100% aquilo. Um homem viver 100% do trabalho termina sendo mais aceito, apesar de todos os avanços, ele tá trazendo dinheiro pra casa. Agora mulher não, mulher é ausente em casa, vão achar você não é uma boa mãe, então  é mais complicado ser uma mulher workaholic com família. Eu fiquei realmente durante um tempo pouco disponível pra eles (marido e filho) e aí depois no último ano lá eu já estava bem mais consciente e equilibrada, hoje é completamente diferente.

ESQUINAS No seu Instagram você se coloca como mãe, mulher, jornalista e apresentadora, você acha que hoje você consegue se dedicar mais a sua família do que antes? E é melhor para você?

Muito mais, agora é equilibrado. Nada que é em desequilibrado na vida é bom. Eu acho que essa geração de vocês enxerga o trabalho de um jeito diferente e acho positivo. Mas ao mesmo tempo tudo tem fases, então às vezes você tem uma fase que você abraça um projeto e é o projeto da sua vida. Não posso dizer que eu me arrependo daquilo que eu fiz na Glamour porque foi assim que consegui transformar minha carreira e fazer o que faço hoje, trabalho menos, ganho mais e tenho muito mais qualidade de vida. Então eu tinha que passar por aquilo, mas não é o ideal, fiquei doente de trabalho.

ESQUINAS Mas você acha que é difícil ser mãe e trabalhar em uma redação?

Não, eu acho que hoje em dia as redações são bem mais humanas. Na Vogue eu fui a primeira a engravidar, então não tinha uma rede de apoio de pessoas que entendiam isso, mas eu nunca tive problema. Nunca fiz corpo mole também, trabalhei até o fim da minha gestação e voltei para a redação depois de 3 meses e pouco de ganhar bebê. Acho que hoje em dia a realidade nas redações são bem diferentes do que eram a 10 anos atrás.

Mulher, mãe, esposa e jornalista, Mônica acredita que às vezes a imprensa usa o feminismo de forma oportunista
Reprodução

ESQUINAS Então é possível conciliar maternidade com a profissão?

Lógico que dá, qualquer profissão dá. Claro que nenhuma profissão em que você tenha um cargo de confiança dará para se dedicar integralmente ao seu filho, mas você consegue organizar as coisas para que tudo dê certo. Acho que hoje em dia as pessoas têm bem mais consciência, na Glamour raramente acontecia de virar a noite em dia de fechamento, mas na Vogue, por exemplo, era um inferno, a gente virava a madrugada toda vez nesses dias, pois tinha muita desorganização. Na Glamour dá pra contar nos dedos as vezes em que saímos às 2 horas da manhã, em 5 anos que eu trabalhei lá.

ESQUINAS Você acredita que a Glamour ainda segue o que foi deixado por você lá?

Eu não leio mais a Glamour. Magina, eu nem quero ler o que acontece lá. Eu acompanho nas redes sociais,  mas eu prefiro não ler, pois foi uma relação muito intensa. Eu acho que a Glamour não é mais uma revista que fala para mim, acho que foi uma guinada meio fake, sabe? De querer se tornar uma revista séria, de mil bandeiras, querer abraçar todas as causas… Virou uma mini Marie Claire. Eu acho que existem questões importantes na sociedade que precisam ser debatidas e que devem estar ali no editorial da revista de alguma forma. Mas ficou algo demais, eu lembro que já chegou a ficar 4 meses seguidos em que todas as chamadas de capa eram feminismo, igual as da Marie Claire. Eu gosto da Marie Claire e é uma revista que eu respeito, é autêntica nesse sentido porque sempre defendeu esse tipo de coisa, mas assim você pega a última Marie Claire e não tem uma matéria que não fale sobre feminismo ou algo relacionado. E isso fica um pouco enfadonho… Porque hoje em dia, parece que falar sobre beleza e moda nas revistas femininas, virou algo superficial. Ou seja, se você não fala sobre militância, dá a impressão de que você é fútil e superficial.

ESQUINAS Você acha que as revistas muitas vezes usam o feminismo como mercadoria?

É, eu acho que utilizam de forma oportunista. Com é o assunto do momento para que precisam falar sobre. Mas por outro lado, eu acho que é um assunto importante e que precisamos falar, porém, há medidas para isso acontecer. A Glamour pesou muito na mão, mas pode ser que hoje já tenha suavizado, não sei, precisaria ver para falar. Mas é muito chato… Se você fizer hoje em dia uma capa bonita com uma modelo vão te apedrejar, porque hoje não pode mais. É uma loucura!

ESQUINAS E qual conselho você daria para quem faz Jornalismo e que trabalhar com moda, trabalhar em uma revista de moda, mas com as alterações que estão acontecendo  fica difícil crescer nessa área.

É legal abrir a mente até mesmo porque você pode passar por ambientes que vão te deixar muito mais sabida, muito mais forte e preparada quando você for pra uma revista. O mercado tá muito restrito, é importante que vocês tenham em mente…Não ter preconceito com site porque é o futuro de tudo e hoje em dia os profissionais de redação fazem de tudo.

ESQUINAS E você acha que esses cursos relacionados a moda pra quem é jornalista, principalmente os no exterior talvez gerem uma certa vantagem para entrar no mercado?

Ah sim, lá fora são, ter curso fora é uma vantagem sem dúvida.

ESQUINAS Vocês fez cursos fora do Brasil?

Não. Eu nunca fiz porque eu trabalho desde muito cedo e sempre trabalhei muito, nunca consegui tirar um sabático.Eu estava inserida em um mercado que me interessava, conhecendo as pessoas e tudo, então não tive necessidade de fazer curso.  Mas quando eu recebia um currículo, uma coisa que fazia  diferença era um curso fora. Se a pessoa tivesse um estágio de revista de fora me chamava muita atenção, e tinha a possibilidade de trazer o que viu lá fora pra cá, poder melhorar os processos, isso era uma coisa que eu gostava muito.

ESQUINAS Você acha que é importante para os estudantes de jornalismo receber oportunidades semelhante ao que você deu a nós duas? E você teve isso no início?

Magina, nunca. Eu mandava e-mail para todo mundo e ninguém me respondia. E não era um e-mail preguiçoso, eu estudava a revista e mandava sugestão de pauta para eles. Eu dificilmente deixava de responder um e-mail na época da Glamour, eu gostava muito disso pois eu já fui aquela pessoa que mandava o e-mail para a redação. O único que me respondeu e, é uma pessoa que eu tenho uma imensa gratidão, foi o então redator chefe da Elle, Edson Possi, que disse que gostou das minhas sugestões e me chamou para tomar um café na redação. Eu fui e comecei a trabalhar muito com a Elle. Então esse tipo de pessoa eu valorizo muito, afinal, pode ter mudado a minha vida com esse e-mail que ele me respondeu. A Elle que me inseriu no meio da moda. Por isso eu sempre penso nisso quando alguém me escreve.