Com pouco dinheiro, mochileiros nas Filipinas, Camboja e Arábia Saudita dependem do governo para voltar ao Brasil - Revista Esquinas

Com pouco dinheiro, mochileiros nas Filipinas, Camboja e Arábia Saudita dependem do governo para voltar ao Brasil

Por Beatriz Calais : abril 14, 2020

Devido à pandemia do novo coronavírus, muitos mochileiros estão em lugares de difícil acesso e com poucos recursos para se manterem.

Texto publicado simultaneamente no Huff Post
ATUALIZAÇÃO: texto atualizado às 19h57 de 17 de abril com a resposta do Ministério das Relações Exteriores e novas informações sobre o voo de repatriação vindo das Filipinas.

Desde o início do fechamento de fronteiras por conta da pandemia do novo coronavírus, 12.700 brasileiros que estavam no exterior conseguiram retornar ao país, segundo dados do Ministério de Relações Exteriores (MRE). Na estimativa do Itamaraty, faltam ainda cerca de 5.500 repatriações — são pessoas espalhadas em 80 países nos cinco continentes.

Com a malha de voos internacionais quase totalmente cancelada pela covid-19, a alternativa é esperar pelo resgate humanitário. A espera é mais longa e aflitiva para turistas de países distantes dos maiores hubs aéreos. Explorando o mundo com dinheiro contado, mochileiros vivem situação ainda mais incerta.

Caso do economista Rafael Dallacqua, 33 anos. Viajando de carro pelo Sul da Arábia Saudita rumo ao Irã, viu seus planos frustrados com o fechamento das fronteiras. “O aeroporto também parou de funcionar. Em resumo, não dava para fazer nada”, lembra. Para permanecer no país, recorreu ao couchsurfing, modalidade de hospedagem em que as pessoas oferecem acomodações para viajantes dormirem. Contou com a sorte: fez amizade com o dono da casa, que o convidou para ficar por tempo indeterminado, recebendo ajuda financeira.

Com quarentena rígida, a Arábia Saudita adota um sistema de multas — que chegam ao equivalente a 13 mil reais — para quem sai do isolamento sem motivo. “As pessoas também podem ser presas caso não obedeçam às autoridades”, conta. Para o economista, o Itamaraty não prioriza a Arábia Saudita por conta dos poucos brasileiros no local. “Com o cancelamento das ligas de futebol e vôlei, são cerca de 100 querendo voltar”, afirma. 

“A maior dificuldade do momento é manter a sanidade mental”, diz Rocío Maria Quiroga. Natural da Argentina e casada com um brasileiro, Wagner Adornetti, morou no Brasil por 25 anos e em 2019 começou a viajar pelo mundo . O destino da vez era o Camboja. Com hospedagem garantida em um resort na cidade de Kampot, no Sul, o plano no início de março era permanecer 21 dias no local. Mas, em menos de uma semana, começaram as restrições por conta da covid-19. “O resort fechou e nós ficamos sem ter onde nos hospedar”, conta.

A solução provisória veio na forma de uma casa alugada pelo aplicativo Airbnb. Lá, Rocío e Wagner dividem os gastos com outro casal que também estava sem acomodação. “Estamos preocupados até quando vamos conseguir nos manter. O orçamento comporta mais algumas semanas”. A opção mais próxima de retorno, a Tailândia, não está acessível — as fronteiras estão fechadas. “Mas, mesmo se estivéssemos em Bangcoc, não teríamos condições de pagar 20 mil reais para retornar ao Brasil, que é o preço que nos pediram”, afirma. Até o momento, a embaixada não conseguiu um voo de repatriação para os brasileiros que estão no Camboja e no Laos. “Quando as fronteiras abrirem, não sei nem para onde vamos correr. Estamos vivendo um mundo paralelo”, relata o mochileiros.

Destino incerto

Nas Filipinas, o drama de Thales Gomes, 32 anos, um desses mochileiros, durou quase um mês. Mochilando no litoral de Port Barton, foi surpreendido na praia, em 17 de março. “Um funcionário do governo apareceu de megafone avisando que a ilha ia entrar em quarentena. Às oito da noite começaria o toque de recolher”, relembra.

Receoso com a severidade das medidas, Thales diz não ter colocado o pé na rua desde aquele dia. Seguiu pagando 300 pesos filipinos (o equivalente a 30 reais) por dia no hostel em que estava hospedado — e de onde quase foi expulso. Como era o o único hóspede, os donos não queriam manter o local aberto com prejuízo. Conseguiu um acordo com uma filipina que inspecionava o local toda manhã e compra mantimentos para ele. “Apenas os filipinos, com passe, podem comprar coisas pra gente. Eu dava o dinheiro e eles buscavam.”

Até o voo de repatriação, foram dezenas de mensagens à embaixada. “Informei que não tinha o valor da viagem — o preço estava na casa dos 16 mil reais. Felizmente, o governo brasileiro fretou um voo de retorno”, afirma. Com mais de dois dias de viagem passando por rotas terrestres, voo doméstico e um voo internacional com escala no Qatar, finalmente voltou ao Rio de Janeiro em 12 de abril. Indagado pela reportagem sobre os brasileiros que seguem no exterior, o Ministério de Relações Exteriores afirmou que “continuará trabalhando, sem interrupção, para assegurar a volta ao Brasil de todos os nacionais retidos no exterior em decorrência da pandemia.”

 

Thales Gomes em Port Barton, Filipinas
Acervo Pessoal

Presa no Camboja ao lado de marido, Rocío conta como está sendo a experiência
Acervo Pessoal

Na Arábia Saudita, Rafael espera a repatriação
Acervo Pessoal

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