Sumário Fechar
Por Mariana Gonzalez Edição #60

Ouro digital

O bitcoin vale muito: atingiu a marca de 100 mil usuários brasileiros. Mas afinal, como funciona essa moeda virtual?

Um investimento vem driblando as desconfianças na economia e crescendo mundo afora: o bitcoin. Essa tecnologia não é novidade – nasceu em 2009 – mas ganhou destaque em 2016, ano em que atingiu a marca de 100 mil usuários no Brasil, de acordo com o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio). Conhecida há algum tempo por investidores e prestadores de serviço que costumam realizar grandes operações internacionais – já que dribla impostos e barreiras burocráticas – a moeda vem ganhando espaço entre usuários comuns, que podem usar a tecnologia para investimento, contando com sua valorização, ou para fazer transações em lojas comuns, como a lanchonete Las Magrelas e a Adolfo Brownie Shop, localizadas na capital paulista.

Mas antes de apostar as fichas, é importante entender como o bitcoin funciona. Afinal, ao mergulhar no universo tecnológico, o usuário é o único responsável pela segurança do investimento, já que essa moeda digital segue a lógica P2P, peer to peer (de igual para igual), ou seja, o negócio é realizado pelo vendedor diretamente com o comprador, sem a intermediação de um banco. Essas características garantem a independência e protege a identidade dos usuários, mas torna os procedimentos mais arriscados: “Ao investir, você é seu próprio banco. Isso significa que, diferentemente de um investimento tradicional, você não tem a quem recorrer se acontecer um erro na transação ou se a moeda desvalorizar e o investimento for por água abaixo”.

A engenheira de dados Patrícia Estevão ainda completa: “Bitcoin é informação. É preciso conhecer as possibilidades de valorização e desvalorização da moeda, que é muito flutuante”. Sendo assim, é exatamente como investir em ouro, explica o economista Gabriel Aleixo, que pode gerar muito lucro, mas é preciso que o usuário entenda a lógica de compra e venda caso ao contrário pode sair no prejuízo.

Alcance

O Mercado Bitcoin é um dos maiores portais que aproxima compradores e vendedores de bitcoins no Brasil e ainda oferece consultorias para investidores de primeira viagem. Rodrigo Batista, CEO da empresa, ressalta que a maioria dos usuários do site usa a moeda como um especulativo, ou seja, compra para vender quando seu valor subir, mais ou menos como quem investe em ações na bolsa de valores.

A parcela dos usuários comuns, que se encaixam nesse segundo perfil definido por Batista, tende a crescer. O empresário Adolfo Delorenze, dono da confeitaria The Brownie Shop, começou a se arriscar nas moedas digitais há quatro anos e, hoje, é um investidor bastante à vontade com a tecnologia. Há cerca de um ano, levou o investimento que realizava por conta própria para seu estabelecimento e, desde então, a resposta tem sido positiva: “Pelo menos uma vez por semana um cliente opta por pagar as comprar em bitcoins”, calcula. Adolfo conta que, durante os Jogos Olímpicos, a procura por essa opção de pagamento aumentou consideravelmente. Ele garante que a opção não encarece os produtos e acredita que, se o uso do bitcoin fosse mais frequente, os clientes é que sairiam no lucro: “Se fosse mais popular, os comerciantes não pagariam as taxas de transação nem o aluguel das máquinas de cartão e essa economia poderia refletir na queda do preço”.

Diferentemente da The Brownie Shop, existem estabelecimentos de pequeno e médio porte que aceitam pagamento em bitcoin e recebem pouca demanda dos clientes que optam por esse recurso. É o caso do Giramondo Hostel, na Vila Madalena, em São Paulo. Aberto há quatro anos, o estabelecimento aceita pagamento em bitcoin desde a inauguração, para facilitar a transferência internacional de hóspedes. Mas William Cardoso, que trabalha no Giromondo há seis meses, só viu um cliente usar o recurso para pagar as diárias – justamente um francês, que evitou as taxas de câmbio ao transferir moedas digitais. A clínica veterinária Prevet, no centro de São Paulo, é um exemplo ainda mais extremo:  começou a aceitar pagamento em bitcoins em 2014, mas desde então, nenhum cliente optou por pagar os cuidados com os pets com moedas digitais.

Enfrentamento

“Bitcoin é, em muitos casos, resistência”, para o economista Gabriel Aleixo, “o bitcoin pressiona as grandes empresas bancárias a estarem sempre se renovando”. Ele acrescenta, ainda, que trata-se de um caminho sem volta: “Se o serviço tradicional não é eficiente, surge uma novidade que atrai os consumidores por ser mais segura, mais barata ou mais eficaz. É o que acontece com qualquer tecnologia. Aconteceu com o Uber, que obrigou os táxis a melhorarem o serviço. Está acontecendo com o bitcoin”.

O obstáculo ainda é um caso de estrutura tecnológica. Para Rodrigo Batista, trata-se de “uma tecnologia ainda que precisa ser bem aprimorada em termos técnicos para que, de fato, se popularize”. Isso porque, segundo o CEO do Mercado Bitcoin, o sistema das moedas ainda não suportaria uma grande quantidade de pequenas transações simultâneas como os bancos tradicionais – que chegam a realizar até 35 mil operações ao mesmo tempo em todo o mundo. Mas, como foi destacado por Patrícia Estevão, os desenvolvedores estão focados na missão de aumentar a capacidade de processamento da moeda digital e o desempenho deixa Gabriel Aleixo otimista: “O bitcoin ainda não é eficiente para pagar um cafézinho. Mas tem tudo para ser”.

Veja mais:

A voz e o corpo da luta antimanicomial

+ Entre o gozo e o gatilho