'Odisseia do papel': entenda como coprocessamento dá destino a materiais não recicláveis - Revista Esquinas

‘Odisseia do papel’: entenda como coprocessamento dá destino a materiais não recicláveis

Por Luca Uras, Amanda Donola, João Pedro Rodrigues e Samuel Kyriazi   : setembro 27, 2024

Caminhão da empresa Votorantim em uma das etapas do coprocessamento do resíduo. Foto: Divulgação/Votorantim Cimentos

A partir de um outro “olhar”, e com a adição do coprocessamento, shopping center em Londrina aumentou o percentual de reciclados e orgânicos

Imagine que você é um guardanapo. Usado, ainda. Todo engordurado, um nojo. Seu destino é o lixo, mas e depois? Provavelmente um aterro sanitário, para onde vai a maior parte do resíduo sólido, mas esse não precisa ser o caso. Se você foi usado no Boulevard Shopping Londrina, por exemplo, seu destino pode ser outro: o coprocessamento. Uma destinação ainda pouco conhecida, mas que é uma opção para o resíduo que não pode ser destinado à reciclagem ou à compostagem. 

Segundo Gessica Almeida, que trabalha no Shopping londrinense, por volta de 2021 a equipe de sustentabilidade enfrentou um dilema: 78% do lixo produzido no shopping já era gerido de alguma forma, mas, conforme esse número crescia, mais difícil ficava a tarefa de achar algum destino para os 22% que sobravam. Foi então que surgiu a ideia do coprocessamento.

E deu certo. Em 2022, o primeiro ano em que o coprocessamento foi utilizado durante o ano inteiro, a taxa de gestão do resíduo sólido – cerca de 100 toneladas por mês! – foi de 97%. E não foram só os resíduos coprocessados que contribuíram para esse aumento. “Esse processo contribuiu para o aumento do percentual de reciclados e orgânicos, porque começamos a dar uma olhada melhor no resíduo”, relata Gessica.

Ela também diz que o maior custo envolvido nesse processo é o de transporte, pois o resíduo precisa ser enviado a Curitiba para o coprocessamento e que, para Shoppings da capital paranaense, o custo é igual ou menor do que enviar tudo para um aterro. 

Mas voltemos ao guardanapo: o que acontece com ele depois de ser jogado no lixo? Primeiramente, uma equipe do próprio Shopping faz uma primeira separação do resíduo orgânico e rejeitos, que vão, respectivamente, para a compostagem e o aterro, e o que pode ser reciclado e processado. Depois disso fico a cargo da Germanplast, uma empresa especializada, transportar esse resíduo – agora cerca de 30 toneladas – e fazer uma segunda separação, que segrega o reciclável do coprocessável.

Todo esse material é colocado numa esteira de segregação e é separado manualmente por uma equipe de 4 a 5 pessoas. O interessante do coprocessamento é dar um destino para o material sem valor ou que geralmente seria recusado pelas empresas de reciclagem, conta Emerson Germano, que cuida do processo na Germanplast. Depois disso, o material é prensado e, a cada dois meses, enviado para Curitiba. 

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Nosso guardanapo, então, faz a jornada de 386 km para a capital paranaense, rumo à Verdera. A empresa da Votorantim Cimentos é quem faz a gestão desse resíduo. Junto com o protagonista dessa história, o guardanapo, esses outros materiais que normalmente iriam para o aterro, acabam sendo usados como combustível para fornos de cimento.

Após chegar na indústria, o resíduo é triturado e misturado com restos de pneu também triturados com biomassa, para então formar o combustível que queima nos fornos. Assim, inclusive, pode-se substituir, em partes, o coque, derivado do petróleo usado na indústria para esse fim, o que reduz a emissão de gás carbônico. “Cerca de 30% da matriz energética do setor é proveniente de energia renovável, cuja fonte são resíduos de diversas origens”, aponta a Associação Brasileira de Cimento Portland – ABCP. 

Segundo Frederico de Oliveira, gerente comercial da Verdera, a queima desses materiais não chega nem a deixar resíduo. Isso acontece pois, ao usá-los de combustível na produção do clínquer, o cimento numa fase inicial, as cinzas da queima são incorporadas ao produto. É importante ressaltar que o coprocessamento não é uma solução mágica e nem tampouco deva ser a primeira opção para a destinação do resíduo: No caso do Boulevard Shopping Londrina, por exemplo, somente cerca de 7% do lixo gerado tem esse fim.

A ideia do coprocessamento é de justamente lidar com resíduos que seriam rejeitados e destinados a aterros sanitários, o que não deixa de ser algo importante. Dessa forma, o processo ainda luta para ganhar visibilidade. “Há pessoas que já estão há décadas na área e nunca ouviram falar em coprocessamento”, completa o gerente. 

Recapitulando a história do guardanapo, temos: primeiro ele é usado e descartado. Depois disso separado junto do reciclável e mandado para uma empresa especializada. Lá é de novo segregado e prensado. Então enfrenta uma viagem de Londrina a Curitiba, onde é misturado com restos de pneu e biomassa para finalmente ser queimado. Por fim, suas cinzas são incorporadas ao clínquer, que mais tarde vira cimento. É assim que algo tão descartável quanto um guardanapo usado pode ser reaproveitado e, em vez de passar o resto de seus dias num aterro sanitário, pode ganhar uma nova vida. 

Editado por Clarissa Olivia

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