Alertas climáticos no seu celular: o novo normal? - Revista Esquinas

Alertas climáticos no seu celular: o novo normal?

Por Isabella Ladalardo, Laís Souza Gomes, Letícia dos Santos Venâncio e Rafaela Monteiro Mina : abril 7, 2025

O aumento da frequência e intensidade das chuvas torna os alertas climáticos essenciais, mas sem infraestrutura adequada, os danos continuam. Foto: Sveta K/Pexels

A intensidade e frequência dos eventos climáticos extremos impactam o dia a dia dos paulistas e exigem medidas para reduzir riscos de segurança

Em meio ao cenário atual de aumento de eventos climáticos extremos no Brasil, como fortes ondas de calor e tempestades atípicas, é necessário que os governos tomem medidas de prevenção e proteção da população. Diante disso, em dezembro de 2024, a Defesa Civil do Estado de São Paulo anunciou a adoção do ‘São Paulo Sempre Alerta‘, um novo sistema de emissão de alertas climáticos para os paulistas.

O que são os alertas e como funcionam?

Desde fevereiro de 2023 — motivado pelas tempestades na região de São Sebastião — o Governo do Estado de São Paulo desenvolveu o ‘São Paulo Sempre Alerta’. Implementada no início de 2025, a ferramenta tem o objetivo de alertar pessoas que se encontram em regiões de risco, que podem ser afetadas por ondas de calor, alagamentos, deslizamentos ou chuvas persistentes, e indicar como proceder na situação para reduzir possíveis danos causados pelos eventos.

Há cinco anos, o envio de alertas vem sendo aprimorado em uma parceria entre a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), as Defesas Civis dos estados e as operadoras de telefonia do Brasil. O sistema funciona por meio da tecnologia ‘cell broadcast’, que possibilita o envio de mensagens de acordo com a geolocalização dos dispositivos.

As Defesas Civis de cada estado e município do país são responsáveis pelo envio de suas próprias mensagens por meio da Interface de Divulgação de Alertas Públicos (Idap). Esse modelo de notificação existe desde 2007, mas, em dezembro do ano passado, foi aprimorado para que, em vez de precisar ativá-los com cadastro prévio, qualquer pessoa que possua um aparelho compatível, com conexão 4G ou 5G, os receba automaticamente. Até o momento, os alertas estão disponíveis apenas para moradores da região de São Paulo, mas há previsão de expansão para outros estados em um futuro próximo.

No envio das mensagens, a notificação do órgão se sobrepõe a qualquer outro conteúdo na tela, emitindo um som de sirene e vibrações no dispositivo. Como parte de um protocolo pré-estabelecido, existem três principais critérios para definir o tipo de alerta a ser enviado: o histórico de ocorrência e o número de pessoas que moram naquela região, o volume de chuva que está caindo no momento e a previsão de chuva que ainda está por vir. Os alertas podem ser “severos”, quando o risco não é tão alto e há um maior intervalo de tempo para que as pessoas possam tomar as medidas necessárias, ou “extremos”, caso o perigo seja maior e exija ações rápidas.

@governosp 📱 Mais segurança, em tempo real! O sistema Cell Broadcast entrou em operação em SP! Agora, moradores de áreas de risco recebem alertas da @Defesa Civil SP ♬ som original – Governo de São Paulo

De acordo com o tenente Maxwel Souza, diretor de comunicação e porta-voz da Defesa Civil de São Paulo, a coleta de dados para realizar o envio dos alertas é feita pelo Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) do órgão. A equipe, formada por analistas e meteorologistas, monitora questões climáticas e a previsão do tempo por meio de sete radares meteorológicos pertencentes ao estado de São Paulo e de satélites do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

Sobre questionamentos que abordam a eficácia da implementação do sistema e o momento de envio dos avisos, Souza destaca que “a ferramenta funciona como um alerta emergencial”. Segundo ele, “não tem como a gente (Defesa Civil) saber quando a chuva começa até que ela comece. O que nós conseguimos fazer é prever a possibilidade da chuva acontecer”. Por isso, devido às inconstâncias e variações da natureza, é necessário que a chuva inicie para que os radares meteorológicos identifiquem seu ponto exato e sua severidade, no modelo de ‘previsão nowcasting’.

Os testes começaram no segundo semestre de 2024, em agosto, em 11 municípios das regiões Sul e Sudeste. Atualmente, a ferramenta vem sendo implantada em outras regiões do país e será de utilização permanente. De acordo com o tenente Maxwel, desde a implantação oficial do sistema até o dia 23 de março de 2025, 125 alertas foram emitidos pela Defesa Civil de São Paulo.

Melhorias para o São Paulo Sempre Alerta e as precauções do governo

Diante da operação da ferramenta São Paulo Sempre Alerta, o Governo de São Paulo e a Defesa Civil visam aprimorar a eficiência da tecnologia e realizar mais obras de melhoria. Segundo o diretor de comunicação do órgão, desde 2023 já foram investidos R$ 1,7 bilhão em obras de combate a enchentes, construção de piscinões, drenagem de rios e instalação de sirenes em áreas de risco, localizadas em Franco da Rocha, São Sebastião e Guarujá. Em abril, serão inauguradas quatro novas sirenes em outras regiões do estado.

Além dos investimentos em infraestrutura, Maxwel Souza afirmou que é necessário “criar a cultura e a consciência de risco nos cidadãos e internalizar essas práticas na próxima geração”, trabalho que está sendo feito por meio de projetos de ensino de ações de prevenção da Defesa Civil, criação de núcleos comunitários para realizar treinamentos com lideranças das regiões mais afetadas e a elaboração de uma cartilha de bolso, que contém um mapa das áreas de risco e orientações preventivas.

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Isso passará a ser o novo normal?

Em São Paulo, os recorrentes temporais trouxeram diversas enchentes que destruíram moradias e causaram prejuízos a muitos comércios. Adolfo Rodrigo, dono da Adolfo Gelato, relata grandes prejuízos após a enchente de janeiro: “Fico fechado sábado, domingo, perco tudo. Essas chuvas vêm e causam uma queda de energia, e eu acabo perdendo meu sorvete”.

A quantidade crescente de eventos extremos ocorrendo em intervalos cada vez menores evidencia que, seja causando ou potencializando fenômenos já existentes, o aquecimento global e suas consequências continuam avançando. Secas, alagamentos, deslizamentos e outros desastres já fazem parte da nova realidade do Brasil e serão acompanhados pelo envio recorrente de alertas.

Ao ser questionado se esse deve ser o “novo normal” a ser esperado pelas pessoas, o professor e geógrafo Jorge Luiz Jesus Oliveira aponta uma relação com as dinâmicas da La Niña previstas para 2025. No entanto, ele destaca que os problemas não são causados exclusivamente pelo clima: a própria estrutura das cidades é um fator determinante. Segundo ele, o problema “é potencializado pelo mal planejamento urbano e o modo como as cidades não estão estruturadas para essa intensidade de chuvas, […] sem falar também da ocupação irregular das encostas, você vê que é o momento em que mais se tem escorregamento de terra”, e não apresenta previsões de melhora. 

Os alertas têm eficácia?

O envio dos alertas também se destaca em regiões que já apresentavam alagamentos frequentes, mas que se intensificaram, como é o caso do famoso ponto turístico da Vila Madalena, o Beco do Batman. O local enfrentou grandes chuvas e alagamentos nos últimos meses, como mostrado em um vídeo viral publicado no dia 27 de janeiro deste ano, no qual o beco aparece sendo consumido por uma correnteza de água.

A região, por estar em um vale, sempre passou por essas situações, mas nos últimos anos comerciantes locais percebem mudanças. Luciana Rojas, ambulante no Beco do Batman, relata que os impactos das mudanças climáticas já são visíveis: “Você vê que é estranho, você vê que antes não era assim, a gente tinha as quatro estações, agora já não tem mais. […] A chuva aumentou consideravelmente em termos de quantidade, […] às vezes, em dez minutos, alaga tudo.”

Em relação aos alertas enviados pela Defesa Civil, o sorveteiro Adolfo Rodrigo conta que a região recebeu avisos sobre o risco de chuvas fortes, mas que, mesmo com a preparação prévia dos comerciantes, já acostumados com a situação, não foi possível evitar estragos. Ele explica por que os avisos não são tão eficientes para quem já está habituado aos alagamentos: “Esse alerta, para quem está aqui e é sobrevivente de ponto de enchente e alagamento, está no nosso feeling. A gente olha para fora, olha para cima… Qualquer nuvem um pouco mais sinistra, qualquer barulhinho, já começamos a recolher as coisas. Ou seja, o nosso alerta somos nós mesmos.”

Oliveira também aponta limitações no sistema promovido pelo governo. Segundo ele, o problema não é apenas alertar as pessoas, mas garantir que elas tenham alternativas seguras para onde ir: “Não é falta de inteligência das pessoas que sofreram com os danos, é falta de opção.”

No entanto, os alertas dividem opiniões. Luciana Rojas afirma que eles a ajudam muito, pois saber a intensidade da chuva permite que ela saia do local antes das enchentes. “A gente recebe o alerta e todo mundo (vendedores ambulantes) sai.”

Porém, Luciana também destaca que, mesmo com os alertas, a falta de auxílio governamental para a recuperação do local prejudica a região, especialmente por ser turística. No Beco do Batman, por exemplo, após a chuva que transformou a área em um “rio”, as lixeiras foram levadas pela água e, até o dia 13 de março, apenas uma foi reposta. A vendedora autônoma reforça a necessidade de investimento em prevenção: “Eu acho que falta isso, investimento na famosa prevenção […] eles podiam nos ajudar.” A ausência de locais adequados para descarte de lixo contribui para o entupimento de bueiros e agrava os alagamentos.

Editado por Enzo Cipriano

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