O movimento maker se mostra uma tendência mundial de pessoas comuns fabricarem seus próprios produtos
A palavra maker, que se aproxima de algo como “fazedor” em português, foi usada pela primeira vez em 2005 por Dale Dougherty, fundador da Make Magazine – uma das mais importantes do movimento “faça você mesmo”. A expressão foi utilizada para caracterizar uma tendência mundial que, apesar do caráter inovador, acompanha toda a jornada de desenvolvimento tecnológico e industrial do homem. Como o próprio site da revista americana diz, o movimento maker carrega consigo criatividade e aprendizado para melhorar as comunidades e hábitos de vida do ser humano. A cultura maker acredita que qualquer um é capaz de construir, consertar e modificar os mais diversos tipos de objetos e projetos com as próprias mãos.
Seis anos após a primeira publicação da revista, em uma palestra do TED Talks, Dougherty afirmou que a América foi construída por criadores de todos os tipos, cuja curiosidade resultou em indústrias e eras completamente novas. Esse processo se repete da subsistência até a produção tecnológica de alto nível que acontece, por exemplo, no Vale do Silício. O ser humano é, por natureza, um fazedor. Seja nos projetos amadores de jardinagem, na produção em larga escala ou no lançamento de um foguete, ele consegue transformar suas limitações biológicas em projetos de mudança que o levaram a uma constante e crescente perfectibilidade, o que o filósofo Jean-Jacques Rousseau definiu como “faculdade de se aperfeiçoar ao longo da vida”.
A massificação de produtos tecnológicos ligados à comunicação permitiu que usuários não desempenhassem apenas o papel de recepção das informações. Já os avanços das ferramentas tecnológicas resultaram em mudanças que aproximaram o indivíduo de sua própria capacidade de criar, e não apenas comprar os objetos e serviços que antes eram controlados por oligopólios. Ricardo Cavallini é o fundador da plataforma de educação e inovação Maker e o criador do kit educacional eletrônico RUTE, que tem por objetivo oferecer instruções para um maior entendimento sobre eletrônica por um preço acessível e com a possibilidade de utilizar peças de sucata. Ele enfatiza a importância da democratização do conhecimento para o que prefere chamar de “momento maker”. “Quando usamos a palavra movimento, temos a impressão que ele é orquestrado por uma empresa, pessoa ou grupo, mas isso não é verdade, ainda que algumas pessoas ou empresas se destaquem. Por isso costumo dizer que o correto seria chamar de ‘momento maker’”, comenta Cavallini. Ele enxerga os dias atuais como uma época em que qualquer pessoa pode criar, produzir, vender e distribuir o produto que quiser.
Muito além da necessidade de possuir tecnologia nos projetos, a possibilidade de compartilhar informação é o que dá suporte para cada vez mais pessoas terem seu “momento maker” oficializado. “A palavra que define o momento atual não é ‘tecnologia’, é ‘acesso’”, adiciona o “inovador de negócios”, como Cavallini se chama.
Sendo assim, aqueles que já reproduziram um DIY (do inglês “faça você mesmo”, uma versão em menor escala do movimento) ou que procuraram novas combinações para uma receita que viram na internet fazem parte do clube e também são considerados makers. Marcela Santos, engenheira elétrica e entusiasta do assunto, define bem a essência dessa cultura em seu blog. “Ser um maker é ser protagonista em um projeto, é ter autonomia de, ao se deparar com um problema ou tarefa, poder propor uma solução e desenvolvê-la usando algum tipo de ferramenta”, escreve no site. Como nenhuma cultura sobrevive sem seus próprios valores e paradigmas, o livro “The Maker Movement Manifesto”, escrito por Mark Hatch em 2013, definiu nove categorias indispensáveis para um maker: fazer, compartilhar, dar, aprender, ter as ferramentas certas, brincar ou experimentar, participar, apoiar e mudar.
Para melhorar as qualidades de compartilhamento, e assim criar uma comunidade mais presente de fazedores online, o YouTube é a plataforma que makers de todo mundo encontraram para entrar em contato direto com um público interessado em exercer suas capacidades de criação. Jimmy DiResta, por exemplo, exercia o seu “momento maker” em programas americanos até se tornar, aos 51 anos, um dos youtubers mais influentes no meio após ser convidado para a Maker Faire, um evento promovido pela Make Magazine, que acontecia em Nova York, sua cidade natal, em 2011.
O canal de DiResta possui mais de um milhão de inscritos e, em seus vídeos, o maker ensina usuários a, entre outras coisas, construir uma casa de abelhas e uma mesa para fazenda. Ele revela que seu objetivo é compartilhar o que sabe para incentivar a audiência. “Algo sobre a minha apresentação faz com que as pessoas se sintam confortáveis em me considerar um amigo e eu gosto disso. Quero continuar aprendendo novas habilidades e compartilhando com o público”, conta o youtuber. Além de Jimmy, April Wilkerson, Laura Kampf e Giaco Whatever também compartilham no Youtube suas experiências como makers na intenção de oferecer apoio a outras pessoas que se identificam com a ideia de anticonsumismo que integra a cultura maker.
O movimento se tornou tão relevante que, em junho de 2014, o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, realizou o primeiro evento maker em Washington D.C., na Casa Branca. Segundo o ex-presidente, essa tendência pode modificar – e melhorar – a indústria norte-americana lançando novos negócios, espalhando o conhecimento científico nas escolas e criando empregos sem depender dos que controlam os meios de produção. A busca por um estilo de vida mais orgânico e a constante evolução das técnicas que juntam o pensar e o fazer estão transformando as famosas “gambiarras” em um mercado lucrativo e inovador.