Após desistir de sediar a COP 25, a Conferência do Clima da ONU em 2019, o País registra descasos com a agenda ambiental, segundo especialistas da área
Enquanto a Conferência Internacional Cidades Sustentáveis ocorre em São Paulo nesta semana, é difícil não pensar que o Brasil não será mais palco de um dos maiores eventos voltados para as questões climáticas e ambientais. No final de 2018, foi anunciado que o País deixaria de sediar a Conferência das Partes das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP 25, por restrições orçamentárias. O evento, que reúne países integrantes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), é um dos principais para discutir a redução de gases estufa e as alterações climático-ambientais do planeta, além de avançar nas discussões sobre o Acordo de Paris, assinado em 2015 por representantes de quase 200 Estados. O atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, afirmou que pressionou o governo anterior, de Michel Temer, a assumir a desistência de abrigar o evento. Agora, a COP 25 acontecerá no Chile, em dezembro deste ano.
A decisão federal certamente transmite uma mensagem para o mundo. Na opinião de Inamara Mélo, secretária-executiva de sustentabilidade do estado de Pernambuco, “é mais um sinal de descompromisso [do governo]”. Para ela, o País demonstra que a agenda climática e ambiental não é prioritária, apesar de ser uma questão de sobrevivência. “Não participar do acordo significa negar qualidade de vida às futuras gerações”, declara.
O desinteresse tanto pelas questões ambientais como por abrigar um evento internacional de grande porte como a COP afasta investidores do país. É o que explica Ilan Cuperstein, vice-diretor regional para a América Latina do Grupo C40 de Grandes Cidades para a Liderança Climática. “O Brasil perde a oportunidade de trazer financiamento internacional, especialistas capacitados para ajudar nossa comunidade científica e empresas preocupadas com essas questões.”
No âmbito internacional, a decisão de não sediar a COP 25 abala a imagem brasileira e passa uma péssima mensagem, segundo Cuperstein. Isso porque o País possui uma longa história de preocupações climáticas, começando pela Rio-92, uma das reuniões pioneiras para debater políticas ambientais. Entretanto, Lina López, orientadora dos planos de ações climáticas do C40, afirma que a visão negativa é temporária e não se estende a todos os brasileiros. “O governo brasileiro tem, sim, uma perspectiva contra as ações de proteção ao meio ambiente, mas as cidades, os pesquisadores e a população continuam discutindo e acreditando nas questões ambientais.”
No final do mês de agosto, as queimadas na Amazônia – que ganharam destaque após escurecerem o céu paulistano – agitaram o cenário brasileiro e renderam comentários e críticas vindas do mundo todo. “Fumaça mergulha São Paulo na escuridão repentina, frustrando a maior cidade do hemisfério ocidental“, escreveu o jornal norte-americano The Washington Post, por exemplo. O Greenpeace, grupo que luta pelas causas ambientais, pediu que deputados europeus vetassem o acordo comercial entre União Europeia e os países do Mercosul por causa desse descaso.
Apesar das tentativas governamentais de reverter essa imagem negativa, o gerenciamento da situação salienta os problemas políticos que envolvem a proteção ambiental. “Infelizmente, o que temos assistido é o desmonte do sistema nacional de meio ambiente. Aquilo que era pra ser o controle do desmatamento da Amazônia, os organismos responsáveis olham, mas não cuidam”, critica Mélo. “O Brasil é o maior país da América do Sul. Nós esperamos que ele dê exemplo sobre sustentabilidade, conservação de florestas e seus ecossistemas”, completa López.
O pessimismo frente à situação atual não impede uma expectativa de superação e melhoria. “Esse vazio deixado pelo governo federal é, felizmente, ocupado por ações estaduais e municipais”, chama a atenção Ilan Cuperstein, ao falar que a própria Conferência Internacional Cidades Sustentáveis demonstra o interesse da cidade de São Paulo por esse assunto. “Espero que o problema seja resolvido o mais rápido possível”, comenta a secretária-executiva de Pernambuco, esperançosa.