Os impactos que a pandemia do novo coronavírus trazem – e continuarão trazendo – para o mercado de alimentos, que já prevê falências e adversidades
Setores econômicos como o mercado de alimentos – varejista ou no atacado – vêm sendo muito afetados pela pandemia do novo coronavírus. Desde o início da crise global, a queda nas vendas desse mercado chegou a 35%, afirma Gerson Charchat, sócio da Strategy&, divisão da consultoria PwC responsável por projetos para a indústria de consumo. De acordo com o especialista, as restrições na circulação, embora essenciais para a saúde pública, podem mudar a cara desse ramo de atividade.
Uma primeira consequência da redução da demanda é impactante: se não forem socorridas, redes de supermercado podem ir à falência, gerando um efeito dominó que prejudicaria outros atores do sistema, como fornecedores. “Trata-se de um prejuízo em toda a cadeia de produção e venda e alimentos”, diz Charchat. A queda não tem sido compensada nem mesmo pelo crescimento significativo do consumo de produtos sanitários e de higiene, que antes apresentavam um padrão estável. “Itens considerados supérfluos, que tendiam a ter seu consumo ampliado devido ao cenário de maior poder aquisitivo da população, passaram a ter sua demanda reduzida”, afirma o especialista.
Charchat aponta também a tendência de migração de muitas redes de supermercados, que previamente trabalhavam somente com vendas físicas, para o ambiente digital, por meio do e-commerce e delivery. Além do fortalecimento desse tipo de venda – tanto com entrega própria quanto com o uso serviços de entrega como Rappi e Ifood –, o especialista acredita na sobrevivência dos mercados “de vizinhança”. “Diante da restrição à movimentação, pequenos negócios e produtos saudáveis passaram a ser mais procurados”, diz.
Outros setores devem experimentar uma queda ainda maior. Restaurantes, bares e padarias seguem fechados e, caso não se recuperem, devem ampliar o desemprego entre as classes populares. O agronegócio, principal categoria de exportação da economia brasileira, já sente a redução global da procura por alimentos. “Mas pode avançar com a eventual recuperação da China, grande importador de soja, milho e carne”, afirma Charchat, citando ainda o preço competitivo do real em relação ao dólar.
A saída da crise vai depender fundamentalmente da recuperação do consumo. Apesar das projeções positivas feitas para 2020 em 2019, ano em que houve um crescimento de mais de 10% tanto no varejo quanto em vários setores da indústria de alimentos, Gerson confirma a possibilidade de recessão. “A crise pode durar de três a seis meses, indicando uma recessão técnica — pelo menos dois trimestres de crescimento negativo”, afirma. Contudo, o cenário de depressão, que consiste em uma estagnação profunda da economia, está descartado a princípio. “Após aproximadamente seis meses de queda, deve haver uma recuperação em função dos vários incentivos concedidos à população”, finaliza.