Psicólogos analisam os impactos do isolamento na saúde mental. Para Rodrigo Chaise, quarentena afeta a condição humana, uma vez que somos “seres dialógicos”
ERRAMOS: conteúdo atualizado às 22:10 do dia 17 de abril de 2020 para corrigir a definição de fobia social e alterar as aspas do psicólogo Rodrigo Chaise sobre o encaminhamento de pacientes a outros profissionais em caso de inaptidão e não de exaustão psicológica.
As consequências da pandemia de coronavírus e a necessidade de isolamento social, principal meio de combate à proliferação da doença, podem trazer pressões psicológicas com o aumento de ansiedade e depressão, que atinge, inclusive, profissionais da saúde mental. ESQUINAS conversou com um psicólogo e um psiquiatra a respeito dos desafios enfrentados na quarentena e as consequências psicológicas do isolamento.
“O meu sofrimento mental também tem aumentado”, afirma Deyvis Rocha. O psiquiatra do AME (Ambulatório Médico de Especialidades) Dra. Jandira Mansur em São Paulo diz que a imprevisibilidade causa medo. Segundo ele, os mais atingidos são os idosos, que se encontram no grupo de risco e encaram uma ambivalência. “Para eles a quarentena é mais difícil porque há um medo maior da morte ao contrair a doença. Ao mesmo tempo, sentem-se sozinhos porque são obrigados a ficar longe dos familiares”, pontua.
De acordo com o médico psiquiatra, colocar-se em posição de igualdade em relação aos pacientes pode trazer benefícios em seus tratamentos. “Não tornar o sofrimento algo exclusivo pode dar um alivio para a pessoa. Eu procuro dizer que a situação também me afeta. Eu não consigo mais levar meus filhos ao parque nos finais de semana, tampouco ir ver os meus sogros”, diz Deyvis.
Segundo Rodrigo Chaise, psicólogo porto-alegrense, quem trabalha com saúde mental deve ter consciência dos seus limites para lidar com atendimentos. “Se eu não estiver bem comigo mesmo como vou cuidar dos outros? O psicólogo deve encaminhar o paciente a outro profissional caso não se sinta apto a atendê-lo”, coloca.
Chaise lembra, ainda, que cada situação tem sua especificidade. Para ele, não se pode inferir que o isolamento esteja sendo ruim para todos os casos: “Quem tem fobia social, medo excessivo e persistente de situações sociais, acaba tendo um ganho secundário na quarentena. Enquanto isso, pessoas que possuem transtorno obsessivo compulsivo por limpeza sequer vão conseguir ir ao supermercado”.
Com o intuito de manter a sanidade mental de quem está isolado, a Organização Mundial de Saúde lançou no dia 20 de março uma cartilha com dicas de como enfrentar esse momento. Dentre os principais pontos contidos nela, está a instrução de reduzir o contato com notícias que podem causar ansiedade ou estresse. A recomendação é procurar atualizações uma ou duas vezes ao dia. “O bombardeio de informações pode fazer alguém confundir um ataque de pânico com os sintomas do coronavírus”, afirma Rodrigo.
Essa apreensão em torno das noticias também atinge os profissionais da área da saúde mental. “Eu elegi um veículo como fonte de informação. Só há um assunto no momento, e, junto com ele, vem uma carga de incertezas que faz com que a gente pense quando vai haver uma notícia boa’” afirma Deyvis. Rodrigo aponta que além de evitar o excesso de informações devemos manter uma rotina na quarentena. “É importante mesmo nos finais de semana. Assim como usar o quarto da nossa casa apenas para descansar e trabalhar e realizar atividades em outros cômodos.”
Com relação aos que não estão aderindo ao isolamento social, Rodrigo aponta que a imprevisibilidade pode ser a causadora da descrença: “É muito mais fácil negar a existência do coronavírus, por isso muitas pessoas rompem o isolamento. O ser humano não se desenvolve na solidão. Ele é um ser dialógico que se constitui nas relações com o outro”.
Tanto o psicólogo quanto o psiquiatra atentam para situações pós-quarentena. O psiquiatra Deyvis prevê a continuidade de alguns hábitos adquiridos durante o isolamento. Ele afirma que “deve haver um monitoramento da perpetuação dos quadros apresentados, como insônia, estresse e ansiedade”. Já para Rodrigo, é importante armazenar os dados adquiridos nesse período para uma análise futura, com eles a psicologia só tende a ganhar. “Muitas coisas ficaram mais evidentes com a pandemia. Ela não está tornando os homens mais violentos, por exemplo, só está expondo mais o problema”, conclui.