Com visões diferentes sobre o mesmo assunto, o consenso é que a saúde do público deve ser a prioridade no momento da retomada
Em junho de 2020, a bola voltou a rolar no Brasil após quatro meses de paralização devido à pandemia. Em meio a polêmicas e 151 jogadores da Série A contaminados até agosto, diversos brasileiros puderam acompanhar seu time do coração novamente. Para muitos, no entanto, a experiência não está completa se não houver público nos estádios.
Motivações
O jornalista da Gazeta Esportiva, Jonas Campos, explica como se iniciou a movimentação pelo retorno do público. “Foi uma bandeira levantada principalmente por autoridades, pela prefeitura do Rio de Janeiro, e o Flamengo. Além de ser um símbolo forte e grande movimentador de renda, o clube lidera esse processo.” Ainda segundo ele, o interesse dos times brasileiros favoráveis à volta do público é o lucro arrecado com a bilheteria.
Em setembro, a prefeitura do Rio de Janeiro autorizou a abertura dos estádios com somente 30% da capacidade, porém a CBF vetou em reunião com 19 clubes, sem a participação do Flamengo. “Ironicamente, é um time que teve um surto de covid-19 no próprio elenco e quer a volta do público no Maracanã, por exemplo. Mesmo com condições limitadas são cerca de 20.000 pessoas”, diz Jonas.
O agrupamento de muitas pessoas em um mesmo lugar é o que preocupa as autoridades de saúde, como informa a infectologista Flávia Trench. “Toda e qualquer atividade em que as pessoas se aglomerem favorecerá a transmissão viral e causará um impacto naquela localidade, ou até em um lugar distante, porque as vezes as pessoas vem de longe para assistir ao jogo”, conta.
Além disso, a médica lembrou que a volta do público aos estádios implica também no deslocamento para o local através do transporte coletivo, na maior quantidade de funcionários e que as possíveis aglomerações não seriam apenas nas arquibancadas, mas principalmente nas entradas e saídas.
Porém, Flávia declarou que existem momentos diferentes da pandemia no país e que isso pode influenciar a reabertura. “Você teria que ver cada cidade, cada região, cada estado ou cada país como se fosse um indivíduo com a sua particularidade e conhecer o perfil epidemiológico da doença naquele momento e naquela região”, explica.
Entretanto, presidentes de alguns clubes brasileiros como Corinthians e Palmeiras já se manifestaram contra a retomada parcial, defendendo que a volta do público só ocorra quando ela seja autorizada em todos os estados do país. “Esportivamente, seria completamente injusta uma volta regional de público em determinados estados”, diz Jonas Campos.
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Torcedor
Por outro lado, não é fácil apoiar de longe o time do coração. “A pandemia foi um bloqueio para essa paixão que eu tenho e que outras pessoas têm” desabafa Daniel Balassiano, torcedor do Flamengo. O estudante universitário comparecia ao estádio com frequência, mas durante a pandemia vê os jogos dentro sua casa. “Não tem mais o contato com seu time, com os jogadores e aquele clima de ir ao estádio que não tem comparação. Em casa você também torce, mas é diferente, você não sente a mesma energia.”
Mesmo com a vontade de acompanhar o seu time, o torcedor concorda que ainda é cedo para que o público volte aos estádios. “Eu acredito que, atualmente, nós temos coisas mais importantes a lidar, para discutir e para conversar”, reconhece Daniel, que afirma que não iria às partidas caso a reabertura ocorra agora.
Outro torcedor que está vendo seu time de casa é o publicitário Guilherme Giannini Rodrigues. Ele tem uma página chamada Santos Depressivo, que conta com 135 mil seguidores só no Instagram. “A pandemia foi bem prejudicial para nós, como criadores de conteúdo do Santos. Claro que a gente respeita e entende esse isolamento, mas nós estávamos acostumados a estar em todos os jogos. Não poder acompanhar o time no estádio e ter que torcer a distância deixa a gente até com a relação mais esfriada, porque gostamos do calor da arquibancada, de estar com os torcedores”, explica.
Apesar disso, o santista diz que “a gente tem que pensar na vida em primeiro lugar, para quando chegar os jogos de fato.” Mas, mesmo assim, confessa que no caso de uma possível volta, compareceria às partidas “por esse amor falar mais alto”.
Se a reabertura dos portões realmente for autorizada, a infectologista Flávia Trench reforça que há necessidade do uso correto da máscara e do álcool em gel a todo momento. Somado a isso, cita algumas medidas de segurança importantes a serem implementadas nos estádios, como um tempo estendido nos horários de entrada e saída, manter pelo menos 1.5m de distância entre as pessoas presentes, suspender alimentação nos intervalos e interditar os bebedouros.