3 anos após sua morte, legado político da ativista permanece vivo e as “rosas da resistência” continuam brotando, em seu nome
No último domingo, 14 de março de 2021, completaram três anos do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes. Apesar da falta de respostas e informações sobre a arma e os mandantes do crime, de o processo de federalização do caso ter sido negado e do desrespeito de personalidades políticas acerca de sua figura, o legado político de Marielle vive — assim como suas aspirações para garantir os direitos e melhor qualidade de vida à população negra, periférica e LGBT do Rio de Janeiro.
Uma das tantas homenagens feitas com o intuito de manter viva a imagem da ativista foi o documentário original Globoplay que leva seu nome. Segundo Caio Cavechini, diretor de Marielle – O Documentário, “nesta data [14 de março de 2020], exibimos o filme como um tributo à memória e ao legado da Marielle, mas também como uma forma de exigir respostas”.
O caminhar da vereadora na política e o assassinato amplamente noticiado pela mídia foram costurados em uma série de seis episódios com “duas histórias que correm em paralelo, mas em tempo diferentes”, explica Caio.
Esse formato foi uma forma de aproximar a figura de Marielle, uma vez que “a maioria de nós não teve esse contato de como ela era no dia a dia com as pessoas mais próximas. Brincalhona, firme, durona, divertida. E essa é uma coisa que você nunca está preparado: ter contato com essa Marielle que não é só o símbolo, é a Marielle pessoa”.
Segundo o diretor, humanizá-la para além de suas causas era um objetivo do documentário, “mas a gente não imaginava que teríamos esses detalhes tão concretos e palpáveis da perda de alguém na vida de uma pessoa”. “O fato de você tentar explicar que ela era uma pessoa como qualquer outra, que tem sua família, que tem sua vida anterior, dá uma concretude pro crime. Parece que torna tudo mais brutal, ainda mais absurdo”, diz Caio.
A estrutura narrativa é “acima de tudo, um documento histórico sobre a Marielle, sobre essas novas vozes na política e sobre o que a gente viveu depois disso — a transformação dela em uma bandeira. [O documentário] está ali para registrar essa história, com um espaço grande para que as pessoas possam acessar, tanto agora quanto daqui a dez, vinte anos, e lembrar que o Brasil passou por esse capítulo horrível.”
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Marielle vive
A escritora brasileira Conceição Evaristo uma vez escreveu: “Não, nós nos negamos a acreditar / que um corpo tombe vazio / e se desfaça no espaço / feito poeira ou fumaça […]”.
A perpetuação de Marielle e de sua luta se evidencia nas ações tomadas pelo Instituto fundado por sua família e que carrega seu nome.
O Instituto Marielle Franco tem plataformas e agenda feministas e antirracistas e realiza, entre outras coisas, pesquisas como “A violência política contra mulheres negras”, que expôs os ataques sofridos por candidatas durante as campanhas eleitorais. 78% das 142 mulheres negras entrevistadas relataram ter sido vítimas dos discursos de ódio na internet e agressões institucionais dos próprios partidos, e apontaram a necessidade de suporte e proteção.
Durante a pandemia de covid-19, o Instituto também criou, em parceria com o portal Favela em Pauta, o mapa “Corona nas Periferias”, que dá visibilidade às iniciativas de combate contra o coronavírus nas favelas e periferias do Brasil. Além disso, liderou um mutirão de apoio a mais de 1900 mulheres negras periféricas do Rio de Janeiro, com o objetivo de ajudá-las a conseguir cestas básicas e se cadastrar no auxílio emergencial.
O legado de Marielle se mostrou presente nas eleições de 2020, quando Mônica Benício, viúva da ativista, e Tainá de Paula (com quase 25 mil votos) foram eleitas vereadoras no Rio de Janeiro. A porcentagem de ocupação de mulheres na Câmara Municipal do Rio aumentou 43% — antes, 14%, hoje, 19%.
A herança de Marielle também está em Paris, Lisboa e Buenos Aires, com seu nome homologado permanentemente em espaços de visibilidade.
Em um de seus últimos pronunciamentos, ela disse que “as rosas da resistência nascem do asfalto”. Para Caio, o assassinato de Marielle e o símbolo que ela se tornou na política suscitou o nascimento de outras dessas rosas: “Ajudou a visibilizar as que já existiam e também deu força para que jovens mulheres negras, da favela e homossexuais assumissem isso como compromisso de vida”.