Disparidades no ensino de escolas públicas e privadas são evidenciadas durante o período da crise sanitária em todo o País
A pandemia do coronavírus de 2020 no Brasil trouxe diversas disparidades, como na educação brasileira em escola pública e privada, a qual se mantém em níveis desiguais de aprendizagem e estrutura. Daniela Haddad, do 3º ano do ensino médio do Colégio Dante Alighieri, conta que suas aulas online eram bem organizadas. “Havia tarefas com prazo e utilizamos uma plataforma exclusiva do meu colégio (Webex). Me sentia mais confortável no online, mas precisava do contato humano”, disse.
Por outro lado, o aluno Gabriel Souza do 9º ano do ensino fundamental da Escola Municipal Vereador Waldemar Freire Veras, de Guarulhos, relata dificuldades. “Eram muitas atividades. Os professores passavam as tarefas por WhatsApp e acabavam acumulando. Os professores faltavam nas aulas por problemas de conexão e eu não compreendia muito bem os conteúdos”, relata.
A digitalização das escolas, implantada com urgência, fez com que muitos profissionais enxergassem a chegada da tecnologia como um obstáculo para a aprendizagem. “Para muitas atividades, nada substitui o presencial”, afirma Rodrigo Ratier, professor de Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero e colunista do UOL. “No presencial é muito mais simples iniciar um debate, conhecer melhor a trajetória de cada aluno. No remoto, vai acontecer aquela situação dramática de encontrarmos as pessoas ano que vem e não sabermos quem são, se foram nossos alunos”, complementa o profissional da educação.
Em contrapartida, há educadores que veem a chegada da tecnologia como um avanço no ponto de vista metodológico, como o professor de Economia da Faculdade Cásper Líbero, Adalton Franciozo Diniz, que diz ter sido obrigado a usar uma tecnologia já disponível, porém subutilizada, e obteve um rendimento positivo. “Acho que a educação tem que incorporar essas tecnologias com o objetivo pedagógico sempre em primeiro lugar”, diz o economista. Adalton espera que essas tecnologias sejam utilizadas como auxiliares e não como substitutas no processo educacional.
O ponto de encontro da escola pública com a particular
Outras dificuldades ocasionadas pela pandemia foram problemas relacionados à saúde mental dos alunos, tanto da escola pública quanto privada. Com o retorno das aulas presenciais, a discussão passou a ser ainda mais acirrada. A coordenadora de escola particular bilíngue, mestre em Linguística Aplicada e pesquisadora do movimento de dessilenciamento na sala de aula e no contexto escolar, Maria Feliciana Amaral, afirma que “muitos alunos tiveram perdas cognitivas e emocionais, e o espaço escolar é primordial para reverter esse quadro alarmante causado pela pandemia”. A aluna Daniela Haddad, sofreu muito com os abalos emocionais durante o período. “Sinto falta dos contatos diretos com os professores. Me sentia sozinha, sem poder contar com a ajuda dos meus colegas. É extremamente difícil conciliar estudos com a ansiedade”, conta.
Com o fechamento das escolas, as aulas remotas surgiram como uma saída para dar continuidade ao processo de aprendizagem. Entretanto, houve grande prejuízo na formação educacional de crianças e adolescentes, principalmente para os alunos de escola pública. Sem estrutura adequada, encontraram dificuldade no acesso à internet e equipamentos eletrônicos, impossibilitando uma aprendizagem eficaz.
“O ensino público teve um decaimento na estrutura para a continuidade das aulas, com a utilização da plataforma WhatsApp, por exemplo, que não é uma ferramenta ideal para dar prosseguimento ao curso escolar”, diz Ratier. O aluno Gabriel Sousa utilizou este mesmo recurso: “O sinal era péssimo. Meu WhatsApp não carregava e as tarefas acabavam acumulando. Meu rendimento caiu muito e sinto falta de aprender de verdade”, conta.
Porém, alunos da rede privada também sentiram dificuldades com o ensino remoto e no desempenho escolar. Segundo pesquisa do Insper e do Instituto Unibanco, é estimado que, no ensino remoto, os estudantes aprenderam menos que a metade do conteúdo de português e matemática em comparação ao ensino presencial.
A recente volta às aulas presenciais apresentou desafios como a busca pela recuperação do tempo perdido na aprendizagem. Por isso, a prática de intervenções dirigidas para a recuperação e otimização do aprendizado para os alunos que apresentaram baixo rendimento na pandemia é fundamental. “Uma avaliação em larga escala que nos dê um retrato do que efetivamente foi aprendido e do que não foi seria um primeiro passo”, diz Ratier. A partir deste diagnóstico, seria possível focalizar nos alunos que apresentaram menor desempenho.
Quanto à questão da saúde emocional dos alunos, Maria Feliciana Amaral afirma que a interação em rodas de conversa, trabalho em equipe e atividades fazem com que eles se sintam ouvidos e respeitados. Isso leva a uma melhora no aprendizado e gera uma educação socioemocional de qualidade. Ela explica que a mesma abordagem nem sempre funciona para todos os alunos. “Tanto os professores como os profissionais da saúde buscam estratégias para cada caso e a melhor forma para fazer isso é por um viés lúdico, que possa ser proveitoso para a vivência escolar”, conclui a pesquisadora.