Como o encerramento das atividades do que já foi o maior hotel de São Paulo afeta as memórias e o dia a dia da região aos olhos de trabalhadores.
Na manhã do dia 7 de dezembro de 2021, 42 anos de história pareciam chegar ao fim. O fechamento do hotel de luxo Maksoud Plaza deixou cerca de 170 funcionários sem emprego e corredores, que um dia se encheram de famosos e suas histórias, vazios. Moradores e comerciantes da região olham para a fachada desbotada do que já foi o mais famoso hotel da região da Avenida Paulista com olhar de desalento, se perguntando qual será o destino do prédio que já foi um dos mais modernos do país.
Transeuntes trocam olhares com o prédio, contando pequenas histórias e lembranças das ruas cheias de fãs e jornalistas. Uma funcionária da floricultura Solo Verde, que fica logo abaixo do hotel, conta que ficou sabendo do encerramento das atividades do Maksoud menos de uma semana antes de ter que fechar a loja por tempo indeterminado. A floricultura reabriu nesta semana, mas os funcionários seguem sem saber qual será o destino do espaço, enroscados nas questões judiciais envolvendo compradores e a família Maksoud. A floriculturista, que preferiu não se identificar, disse também não poder se pronunciar sobre o passado ou futuro do hotel.
Fundado por Henry Maksoud, em 1979, o hotel deu palco aos quatro últimos shows de Frank Sinatra no Brasil, além de apresentações por artistas como Etta James e Tom Jobim. Em seus anos de funcionamento, o hotel recebeu grandes personalidades da cultura e política mundial, como a primeira-ministra da Grã-Bretanha, Margaret Thatcher, os Rolling Stones e Axl Rose, que em dezembro de 1992 atirou uma cadeira em direção a repórteres que o aguardavam no mezanino.
“O hotel chegou a ter 700 funcionários, cinco restaurantes e todos com cozinha industrial”, relembra Cibele Spadafora, que atuou na área de Marketing do hotel no começo dos anos 2000. O Maksoud foi o primeiro hotel cinco estrelas de São Paulo, e com a mudança de padrões no passar dos anos, “mesmo os cinco estrelas, em relação ao Maksoud, eram como três estrelas,” diz Cibele. Em 2015, foi aberto, em homenagem a Frank Sinatra, o Frank Bar, que se manteve na lista dos 100 melhores bares do mundo durante três anos consecutivos.
No entanto, com o passar dos anos, a crise do setor hoteleiro começou a atingir o gigante da Paulista. O Maksoud teve sua clientela dissolvida em meio à grande oferta de hotéis e lofts que surgiu a partir de meados da década de 1990. A partir daí, o hotel nunca recuperaria o prestígio de outrora.
Veja mais em ESQUINAS
A morte que ronda o vivo Edifício Martinelli
Pelas curvas do Copan: os embates de um dos mais emblemáticos edifícios do País
Cracolândia, evasão financeira e medidas públicas: como ressignificar o centro de São Paulo
Ainda assim, mesmo durante seus períodos mais conturbados, o Maksoud continuava sendo de grande importância para comerciantes e trabalhadores da região. “O espaço de eventos deles fica bem aqui em frente. Então tinha uma troca: congressistas ficavam hospedados aqui ou, se não ficavam, usavam o restaurante aqui do Flat. Nós éramos colaboradores em algumas situações. Foi um período muito bom”, conta Isaura dos Reis, síndica e gerente do Paulista Flat há 17 anos.
Com o abrupto encerramento das atividades do hotel, trabalhadores das proximidades foram pegos de surpresa. Paulo Pallermo, taxista na Alameda Campinas, fazia corridas especialmente para hóspedes de hotéis da região, passando eventualmente a se dedicar apenas ao Maksoud. Após seis anos de parceria, o taxista viu-se perdido, com 90% de sua renda afetada: “É triste [o fechamento], tanto pela tradição do hotel quanto pelo meu ganha-pão. Agora eu não sei para onde vou”, conta.
Outro exemplo disso é Genesia Castro, sócia-proprietária da padaria Pão de Ló, que fica em frente ao Maksoud. Segundo ela, 20% do movimento de seu estabelecimento caiu após o fechamento do hotel. “Foi um clima de tristeza, uma perda de movimento, uma indefinição. Foi muito triste, acho que tristeza é a palavra”, afirma ela.
Relembrando momentos em que atendeu hóspedes do hotel, a sócia diz: “Isso sempre foi uma coisa divertida. Muita gente já passou aqui: John Malkovich, que sentou em uma mesa coletiva e descia pra fumar na calçada, porque não era permitido dentro do estabelecimento; a banda Oasis, que abriu um café da manhã tocando e muitos outros”
Antes mesmo de trabalhar na padaria, a comerciante já construía memórias com o Maksoud: seu primeiro contato foi quando era adolescente e veio a São Paulo visitar algumas amigas, em 1988. Depois de um show de Caetano Veloso, elas decidiram seguir o cantor, e foram parar no hotel em que ele estava hospedado, o luxuoso Maksoud Plaza. “Foi um impacto. Eu achei lindíssimo aquele vão central, o móbile metálico”, relembra Genesia.
Depois de quase três meses do fechamento oficial do hotel, tanto o prédio quanto seu legado têm futuros nebulosos. A incerteza paira sobre os arredores do outrora luxuoso Maksoud Plaza, que há muito deixara passar os anos de glória. Em suas redes sociais, uma publicação de 30 de novembro convidava os seguidores a fazer uma reserva; na semana seguinte, veio a despedida. Em uma nota oficial, a HM Hotéis, administradora do hotel, divulga que continuará a usufruir da marca Maksoud Plaza no ramo de hotelaria e completa: “Em breve, a empresa anunciará novidades sobre esses projetos”.
“É triste ver o encerramento, o final de um ciclo. Algo novo vai começar? Vai. Mas a gente ainda não sabe em quanto tempo, e nem o quê,” diz Genesia. No site oficial do Plaza, apenas uma frase em inglês: “A place to feel” (um lugar para sentir). Depois de 42 anos de atividade, mais de 3 milhões de hóspedes e incontáveis histórias, o sentimento que predomina na imagem do Maksoud Plaza é a tristeza.