Com as últimas medidas instauradas pelo Governo Federal e a adoção do Novo Ensino Médio, docentes relatam inseguranças em relação ao futuro da educação no país
“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
O direito à educação gratuita e universal é assegurado para todos os brasileiros pelo artigo 205 da Constituição Federal de 1988. Na esfera pública, os desfalques educacionais são bastantes para limitar consideravelmente as oportunidades dos estudantes.
Dados do IBGE mostram que apenas 35,9% dos alunos formados em rede pública ingressam para o ensino superior, enquanto para alunos de rede privada o percentual dobra para 79,2%. Já imaginou como será o cenário com a privatização desse serviço essencial?
Quando questionado sobre o assunto, o vice-diretor da Faculdade Cásper Líbero, professor Adalton Diniz, diz que o preocupa o ressurgimento dessas bandeiras e que outros aspectos também se conectam com o assunto, “como a aprovação da proposta da legalização da educação doméstica ou da eventual possibilidade da privatização do Ensino Público básico brasileiro”. Ele continua e afirma “Pensando não somente do ponto de vista econômico, isso seria um horror para o país como um país.”
As discussões sobre uma reformulação no Ensino Médio iniciaram no segundo mandato de Dilma Roussef (PT). Entretanto, foi somente durante o curto governo do presidente Michel Temer (MDB) que o Novo Ensino Médio obteve aprovação, no ano de 2017. O projeto se iniciou como uma medida provisória de n.749/2016, e foi colocado em prática apenas em 2021.
Também relacionado ao Novo Ensino Médio, houve a tentativa do governo Temer (MDB) de permitir que até 40% do Ensino Médio fosse realizado à distância (EAD) em 2018, mesmo que estudos do IBGE apontam que apenas 64,8% de estudantes da rede pública possuam um telefone celular.
O atual governo de Jair Bolsonaro (PL) também apresenta simpatia com as iniciativas privadas. Paulo Guedes, ministro da Economia e mentor dos projetos privatistas do governo de Bolsonaro, já sugeriu a criação de vouchers para a educação e saúde em maio de 2021, que serviriam para pagar serviços no setor privado. Os principais estudos realizados sobre o assunto foram feitos pela Universidade de Londres e a Universidade do Colorado, que concluíram que onde tal medida foi adotada os resultados não foram benéficos, reforçando ainda mais a desigualdade social.
Patrícia Bianco, professora de geografia na rede estadual de São Paulo, destaca as más condições vividas nas escolas públicas atualmente. “Esse é o primeiro ano que temos uma lista de chamada até o número 80”, conta.
A situação dos professores
Ao mesmo tempo que ocorrem cortes de verba por parte do Governo Federal, prejudicando as condições do sistema público, a desvalorização da figura do professor no Brasil é outro agravante para o cenário da educação brasileira. Estudos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) de 2021 apontam que o salário médio dos professores brasileiros é o menor entre outros 40 países analisados.
2022 é o nono ano consecutivo que o Estado não realiza novos concursos de professores. Este seria um processo de seleção para vagas de cargos públicos, e a não realização implica na terceirização dos profissionais e nos relatos de falta de educadores para lecionar em escolas pelo país. “Já está havendo sim um começo da privatização do setor público que está começando pelos funcionários, não só professores, mas outros funcionários da escola também”, afirma Patrícia.
Expectativas para o futuro da educação
Quando questionada sobre uma possível privatização do ensino, a professora diz que não vê isso se concretizando agora. Mas, ao decorrer de alguns anos, isso pode ocorrer. “Os governantes não estão mais querendo arcar com os custos da educação, pagamento de professores, compra de material didático”, afirma.
A professora ressalta também que o ensino público não é 100% gratuito, uma vez que qualquer cidadão que tem um filho matriculado na escola paga impostos. O professor Adalton Diniz completa dizendo “eu vejo com muita preocupação a privatização de serviços essenciais, que não devem ser movidos em hipótese alguma pelo lucro”.
“Poderiam acontecer melhoras em alguns setores, como talvez as salas de aula, os materiais, o salário dos professores”, mesmo em um cenário pessimista, Patrícia avalia qua privatização poderia levar a uma melhora tecnológica dentro das escolas. “Mas não sei se as condições de trabalho dos profissionais seriam melhores”, complementa.