Intitulado “Ato em defesa da democracia e do Brasil”, o evento foi organizado pelo grupo Prerrogativas e pelo Movimento PUC pela Democracia
Na última segunda-feira, o Teatro da Pontifícia Universidade Católica, o Tuca, e as ruas ao seu redor foram tomadas por uma multidão em ato de apoio à campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Às vésperas do segundo turno, que ocorre no próximo domingo (30), a campanha busca ampliar a vantagem contra o adversário, Jair Bolsonaro (PL).
A escolha do local para o evento, por sua vez, repete um simbolismo. Em 2014, a então candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT) realizou um ato na PUC-SP que coincidiu com uma virada nas eleições. A ex-presidente enfrentava uma disputa acirrada com Aécio Neves (PSDB) e chegou a pontuar atrás do tucano nas pesquisas.
Marco Aurélio, advogado do grupo Prerrogativas, relembra do cenário do pleito em questão e reforça que mais uma vez os atos na PUC farão história: “A PUC será espaço para ampliar a vantagem e virar o jogo em São Paulo. Aqui sempre foi um lugar de resistência, e vamos mandar uma mensagem poderosa no dia de hoje”.
Do lado de fora do Tuca, enquanto o evento tinha início no teatro, o número de pessoas na Rua Monte Alegre e seus arredores crescia cada vez mais. De crianças a aposentados, o público era o mais variado possível, porém, o sentimento era o mesmo compartilhado pela Simone Rocha, artista plástica de 44 anos, e pela filha Nina:
“A gente está numa semana que vai definir muito mais do que quatro anos. É a hora da gente estar aqui… a gente artista, a gente mulher, a gente que usa SUS, a gente se importa com o outro. Não dá pra se omitir.”, conta a artista.
A menina de 11 anos ainda cantava “Bolsonaro, seu fascistinha! Os artistas vão botar você na linha!”, coro entoado por uma forte comunidade artística que esteve presente no ato.
Pluralidade, arte e política
Do começo ao fim do evento, música, poesia e dança não deixaram de fazer parte da mobilização em nenhum momento. Fosse na caixa de som e na boca do povo que cantava “Apesar de você”, de Chico Buarque; ou fosse na dança tradicional indígena da Toré, realizada por representantes de comunidades de todos os cantos do país; a arte se fez presente em todos os momentos como instrumento de protesto contra o atual governo.
“Na Toré, cantei pela união dos povos das entidades. Se a gente não pedir pela vida e pela união, os próximos anos serão condenados, que nem já fomos agora, com muitas mortes de indígenas. Temos que lutar pra isso”, afirma Pedro Pankararé, 22, do povo indígena Pankararé (BA). Faz parte do movimento indígena nordestino.
Para a professora Adriana Elias, 51, a livre expressão que a arte possibilita é um dos instrumentos que conduz a orquestra da democracia. Para o momento do ato em si, ela atribui à arte uma função aglutinadora: “O que a cultura traz é essa possibilidade da manifestação. Ela é aglutinadora, junta todo mundo pra festa, enche o coração do povo de alegria”.
E a alegria no Tuca ficou a cargo da Trupe Olho da Rua, coletivo de palhaços que foi um dos convidados para se apresentar. Para Lívia de Matos, 42, integrante do grupo, “a arte não é feita só pelos artistas consolidados nas televisões, existe uma arte raiz que está intrínseca e existe nas periferias da cidade. O Lula sempre olhou para essa classe marginalizada como classe artística”.
A professora Adriana Elias ainda reforça a importância das manifestações culturais: “É essencial essa mobilização de hoje porque a cultura nos anos Bolsonaro foi muito reprimida. Ter essas manifestações artísticas representa a possibilidade de retomar um país que fortalece e dá liberdade cultural a qualquer população”.
Veja mais em ESQUINAS
Confira um resumo da entrevista de Jair Bolsonaro ao pool de veículos no SBT
“Vai ter luta”: antes do segundo turno, estudantes ocupam as ruas contra precarização na educação
Simone Tebet declara voto em Lula: “Compromisso com a democracia e a Constituição”
O espaço era aberto a todos que quisessem entoar seus cantos de protesto. Como Eduardo Suplicy (PT), eleito o deputado estadual com mais votos por São Paulo, que atendeu o público que pedia que cantasse. Suplicy cantou “Blowin’ in the Wind”, de Bob Dylan, música de protesto na qual o artista pedia pela paz e o fim das guerras.
“A política define a nossa vida, não dá pra ser isento. Estamos debatendo a sociedade que queremos daqui pra frente… é civilização ou barbárie. Todo mundo tem que participar”, conta Monica Iozzi em entrevista para ESQUINAS. Monica foi apresentadora do ato.
Apesar do clima de festa, os apoiadores de Lula não se esquecem do porquê estão ali. O dia 30 de outubro está cada vez mais próximo, e com o resultado do primeiro turno e as últimas pesquisas, sabe-se que a diferença entre o candidato do PT e o atual presidente é apertada.
Quem subia ao palanque para discursar sempre repetia a ideia de “trabalhar” nos próximos dias para virar votos. Mesmo nesse cenário, o otimismo de Adriana não se abala: “Agora, a expectativa é de uma vitória apertada, mas uma vitória de um povo que não desistiu de ser feliz”.
Frente ampla na PUC
Dentro do Tuca, figuras que nunca haviam dividido um palanque e que passaram os últimos anos em campos opostos da política estavam ali, juntos, no palco do teatro. As personalidades iam de João Paulo Rodrigues, do MST, à Neca Setúbal, herdeira do Itaú. Também estavam presentes o economista Pérsio Arida, o ex-ministro José Gregori, Marta Suplicy e Henrique Meirelles (União Brasil).
“Essa noite estamos esperando que no dia 30 de outubro o Brasil ingresse em uma nova fase”, conta Pietro Alarcón, professor de Direito da PUC. “Será uma fase democrática, de respeito aos direitos humanos e à vida. É o início do fim de um pesadelo”.
A então eleita deputada federal Marina Silva (Rede-SP) disse “acreditar que a democracia está em risco” e que a constatação desse risco levou com que ex-adversários históricos de Lula declarassem apoio à chapa petista. “Eu sei que a democracia está em risco, porque nós temos aqui na figura de Alckmin o encontro entre PT e PSDB. Quem disse isso em contrário está fazendo um discurso que eu não compreendo”, afirma.
O ex-prefeito e candidato a governador de São Paulo Fernando Haddad também reafirmou a importância de uma frente ampla democrática.
Em entrevista à ESQUINAS, Haddad disse que o cenário é muito diferente das eleições 2018: “Nós não estávamos minimamente preparados para o bolsonarismo em 2018. A gente não tinha uma coligação tão ampla e diversa. Agora, o cenário é muito diferente”.
A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL) concorda; para ela, os últimos acontecimentos como a prisão do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) e o anúncio de que não vão garantir o reajuste do salário mínimo “jogam a nosso favor”. “O Lula tem as melhores propostas, tem um movimento amplo. Tem o popular do lado dele, e por isso as expectativas são as melhores para no domingo ganharmos as eleições”.
Terceira colocada no primeiro turno, a senadora Simone Tebet (MDB) foi recebida de pé no auditório. Ela chegava de viagem do Rio, “pronta para continuar a campanha, para dizer ao Brasil que não há dois candidatos. Há apenas um, porque só há um democrata nesse segundo turno”. Simone afirmou que “quem votou em Simone Tebet tem que votar no 13 nessas eleições” e que o que a une a Lula é “o amor pelo nosso país, nosso povo e nossa democracia”.
Vestido inteiro de branco, o ex-presidente Lula (PT) estava “muito confiante”. Para ele, “estamos vivendo a semana mais importante da nossa história”. “Quem em algum momento teve dúvida da importância da gente reconquistar e praticar a democracia, não pode mais ter mais”, comenta o candidato.
Lula disse que, depois de 8 anos de mandato, jamais imaginou que “o país poderia viver esse retrocesso”.
“Nosso governo não será um governo do PT”, declara o ex-presidente. Nós precisamos fazer um governo além do PT. Tem muita gente que nunca foi do PT e participou do meu governo – e vai ser assim. Não será um governo do PT, será um governo do povo brasileiro”, afirma Lula.
Lula, Alckmin e Haddad então discursaram na sacada do auditório para o público que não conseguiu entrar no teatro. Ao final do evento, a festa seguiu como havia começado, com música sendo tocada por uma orquestra de metais e bateria, que alternava entre melodias de “Olê Olê Olá, Lula! Lula!” e “Vai dar PT”. Lula se despediu do público anunciando que “nos vemos no dia 30”.