Dos barões aos bares: como a Rua Augusta se tornou sinônimo de vida noturna em SP - Revista Esquinas

Dos barões aos bares: como a Rua Augusta se tornou sinônimo de vida noturna em SP

Por Luiz Eduardo de Camargo Minervino : junho 2, 2022

Pessoas frequentando a balada Inferno, na Rua Augusta. Foto: Rodrigo Vieira

Vida noturna paulistana faz a reputação do Baixo Augusta há pelo menos 80 anos; confira um panorama histórico da via

Desde sua fundação, em 1891, muitos significados já foram atribuídos à região do Baixo Augusta. Localizada entre a Avenida Paulista e a Praça Roosevelt, essa porção da rua Augusta hoje em dia é local de busca dos jovens por bares e baladas, mas percorreu um longo caminho até se tornar o símbolo da vida noturna na capital.  

Um dos espaços mais cambiantes da cidade, os arredores da Augusta atraíram em toda sua existência uma grande variedade de grupos e classes sociais. Inicialmente, foi marcada pela presença dos barões de café que se assentaram na Avenida Paulista e seu entorno. Até que, na década de 1940, surgiu a divisão da rua entre a parte “Baixa”, caracterizada pela presença das classes mais populares, e a “Alta”, que abrange a direção sentido Jardins e onde se estabeleceram os moradores de classe média e alta.  

A partir desta distinção das regiões, no decorrer das décadas de 60 e 70, o local começou a se destacar como um polo do lazer noturno do centro da cidade, com a abertura de bares e boates. No entanto, a crise econômica que sucedeu o período acabou atraindo para a região atividades indesejados, como o tráfico de drogas e a prostituição, estigmatizando o local.  

Após isso, no início dos anos 2000, foram iniciados processos de revitalização, que resgataram o brilho do Baixo Augusta que voltou a atrair tanto moradores como consumidores.      

Dos casarões aos prostíbulos 

A Rua Augusta, concebida no final do século XIX, ligava os bairros nobres de São Paulo ao centro da cidade. Lar de proprietários de fazendas de café, a região era composta por diversas chácaras e casarões desses proprietários. Com a chegada de automóveis e bondes elétricos à área, no início do século XX, foram introduzidas novas melhorias para a região, como a instalação de iluminação e o asfaltamento das ruas. Assim, a rua se popularizou cada vez mais ao se tornar uma importante passagem para o transporte público na cidade. 

Contudo, o trânsito na região – proveniente da popularização dos carros, que conflitavam com as linhas de bonde – somado com problemas de saneamento básico e escoamento de água, resultaram no afastamento da elite do Baixo Augusta e na construção de moradias populares, substituindo os charmosos casarões. Assim, concretizava-se a diferenciação social entre o Baixo Augusta e o Alto Augusta. A concentração do tráfego e a predominância de cortiços na região afastaram os investimentos no local e iniciou o esvaziamento do centro da cidade. 

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Mapa do Baixo Augusta e região no final do século XIX.
Acervo

Entretenimento e transgressão no Baixo Augusta

Com o clima pós-guerra dos anos 40 e 50, a busca de entretenimento “transgressor” pelos jovens foi uma tendência que alcançou a Augusta. Primeiro, foram inaugurados cinemas que exibiam filmes do circuito independente e os chamados pornochanchada. Surgiram, ainda, clubes noturno e bares, voltados para o rock and roll e a Bossa Nova, criando um importante polo de lazer noturno na cidade.  

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O que parecia ser um reviver da rua Augusta não perdurou. Com a crise do comércio nos anos 70, o público jovem deixou de frequentar a região, levando ao fechamento da maior parte dos bares e boates. Com a lacuna deixada por essa debandada, foram inauguradas novas casas noturnas que, mais tarde, deram origem aos bordéis e prostíbulos da área, criando a reputação de uma rua “mal frequentada”.  

É a partir dessa época que a prostituição se torna um dos símbolos que marcaram a rua Augusta. Inicialmente disfarçados como casas de massagem, os prostíbulos passaram a ser cada vez mais explícitos. A presença dos estabelecimentos acabaram por impulsionar a saída de famílias e comércio em geral da área, além de para a região homens de alto poder aquisitivo que buscavam “entretenimento adulto”. 

Revitalização no novo milênio 

Nos anos 2000, o otimismo na economia motivou o início de um processo de revitalização do bairro. Durante o mandato da prefeita Marta Suplicy, houve o aumento do policiamento da área, diminuindo o fluxo dos prostíbulos. Agora, o bairro que era considerado, até então, “decadente”, passa a atrair novamente jovens de classe média que estavam em busca do êxtase noturno. 

Com o investimento na infraestrutura da região e a inauguração da estação Higienópolis do Metrô, a rua voltou a ser integrada com o resto da cidade, facilitando a circulação e valorizando o mercado imobiliário. A imagem na mídia também evolui: a imagem positiva da revitalização e o destaque para a diversidade substituem as pautas do crime e o submundo, atraindo mais empreendimentos residenciais. 

“A Rua Augusta foi escolhida por ser frequentada pelo nosso público desde meados de 1970”, afirma Henrique Chirichella,  o diretor da loja Logay, situada no Baixo Augusta e especializada em artigos LGBTQIA+. Embora já frequentassem a região mesmo antes da revitalização, os membros da comunidade ganharam notoriedade e se tornaram os grandes protagonistas da rua a partir do século XXI. “É um local com grande histórico de movimentos LGBTQIA+ e continua assim até os dias de hoje”, completa o diretor. 

Pós-revitalização 

Após todos os esforços de revitalização, o Baixo Augusta é apresentado como uma região viva e diversa. Por quase 80 anos, seu grande atrativo segue sendo a agitada vida noturna, atraindo diferentes tipos de pessoas de toda a cidade.  

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Hoje, a rua tem uma cena noturna vibrante e se tornou uma referência na cidade.
Divulgação

“A vida noturna aumenta a circulação de pessoas na região, proporcionando uma sensação de segurança”, afirma Larissa Galvão, moradora da região desde 2018. “Mas, por outro lado, atraem criminosos com a intenção de cometer roubos e furtos”, completa. 

Apesar de ser vista com bons olhos, Larissa afirma que a revitalização deixou para trás elementos fundamentais da construção histórica do Baixo Augusta. “Muitos elementos tradicionais da região, como a arquitetura, populações e estabelecimentos, foram retirados para abrir espaço para essa ‘nova vida”, declara. 

Editado por Juliano Galisi

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