Adalton Diniz, doutor em História Econômica pela USP, analisa como a pandemia pode afetar o futuro econômico do Brasil
O mundo foi pego de surpresa. A pandemia do novo coronavírus afetou de maneira direta o setor econômico. Segundo um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), a paralisação das atividades econômicas gerou para a economia um tombo de 9,7% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no segundo trimestre de 2020. Esse número é maior do que o acumulado em todas as recessões econômicas da história do país.
“O comércio desenvolveu medidas paliativas, mas evidentemente houve uma queda. Essas estratégias de sobrevivência não conseguiram suprir toda a demanda da atividade produtiva que existia antes da pandemia”, comenta Adalton Diniz, doutor em História Econômica pela USP. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção industrial desabou 18,8% em abril deste ano e atingiu o nível mais baixo já registrado no país.
Um dos setores mais afetados foi o de veículos automotores, reboques e carrocerias. Entretanto, o especialista ressalta o abalo que a educação sofreu. “A indústria automobilística, sem dúvida, sofreu muito, assim como turismo e o entretenimento, mas o impacto na educação vai gerar consequências a longo prazo. O processo de alfabetização vai ficar atrasado. Quanto menor a faixa etária do estudante, maior a perda”, explica. O profissional também refletiu que “escolas com um público de maior poder aquisitivo conseguiram manter as suas atividades, o mesmo não pode ser dito das escolas voltadas para um público de menor poder aquisitivo. Esse fato vai agravar a desigualdade social no Brasil”.
A desigualdade também se acentua em relação aos pequenos negócios. Em uma pesquisa realizada pelo Sebrae, foi constatado que 3% dos pequenos negócios decidiram fechar definitivamente, sendo que a maior incidência (5% do total) foi observada nos segmentos de Indústria Alimentícia, Serviços de Alimentação e Indústria-Outros. “Os trabalhadores com mais qualificações conseguiram se manter pelo home office. O trabalhador menos qualificado perdeu o emprego, a empresa dele foi obrigada a cortar vagas e o mesmo acontece com os pequenos negócios”, relata o especialista.
Adalton Diniz afirma que o país sairá da crise ainda mais desigual. “O governo teria um papel fundamental na minimização desse impacto, e no Brasil estivemos muito longe disso. Era necessário reduzir o tempo da crise, se o governo tivesse sido mais responsável e consciente, menos danos o país teria sofrido”, desenvolve.
Na gestão de Jair Bolsonaro, o segundo trimestre de 2020 fechou com taxa de desemprego de 13,3%, recorde de desempregados e o menor número de pessoas com carteira assinada da história, de acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE. Diniz completa que “o mau desempenho da economia em 2020 vai ser atribuído à pandemia, quando na verdade ela já estava sendo mal gerenciada, os números já estavam encolhendo no primeiro semestre quando não havia o vírus.”
Diante da crise, os especialistas enxergam o futuro de maneira pessimista. “Eu não acredito que com o Bolsonaro e o Guedes a economia vai ter um desempenho melhor. É possível que, neste ano, a economia encolha 6% e, no ano que vem, cresça 4%, mas ainda não vai recuperar o que perdeu, é apenas aquele crescimento inevitável. Eu estou muito pessimista, esse governo não tem projeto, não tem rumo, então supondo que não haja o impeachment pelo caminho, até 2022, eu não tenho nenhuma esperança de a economia entrar nos eixos. Isso tudo é consequência da mediocridade levada ao extremo e uma economia muito mal gerida desde o início”
O valor da cesta básica brasileira foi outro alvo da crise econômica. Segundo a Associação Paulista de Supermercados, o grupo de produtos formado por arroz, farinha de trigo, açúcar refinado, açúcar cristal, frango em pedaços, carne bovina, carne suína e óleo de soja acumula alta de 28,98% no atacado até agosto. Para Diniz, essa alta súbita ainda vai se prolongar. “A forma como Paulo Guedes está administrando o dólar, é desastrosa, chegar a quase R$6. Essa desvalorização do real faz com que os produtos brasileiros fiquem mais baratos no exterior. Além disso, o auxílio emergencial fez com que as pessoas fossem ao mercado consumir, mas essa é uma consequência que o governo deveria ter previsto. Pessoas com déficit na renda vão comprar alimentos, elas não vão para a Disney como afirmou Paulo Guedes, elas compram comida”, desabafa Adalton.