Transmitido na TV ainda em preto e branco, o homem na Lua foi um avanço científico mundial, mas alguns ainda desacreditam da sua veracidade
“Este é um pequeno passo para um homem, mas um grande passo para a humanidade”. Você já deve ter escutado a célebre – e ensaiada – frase que o astronauta Neil Armstrong proferiu ao andar pela superfície da Lua em 20 de julho de 1969, fincar a bandeira dos Estados Unidos naquele solo arenoso escuro minutos depois e se tornar o primeiro a pisar no satélite terrestre. A missão Apollo 11, que levava no interior do módulo lunar Eagle os astronautas Armstrong, Edwin “Buzz” Aldrin e Michael Collins, se tornou um marco histórico. Significou um avanço na corrida espacial entre os Estados Unidos e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), revelou um ponto alto da conhecida Guerra Fria, a disputa pela superioridade mundial envolvendo economia, ideologia e diplomacia entre as duas nações, e tem grande importância para o mundo da tecnologia 50 anos depois da alunagem.
Televisão a cores era raridade. Máquinas de escrever funcionavam com teclados barulhentos e um rolo para a folha de papel. Telefonemas à distância davam emprego aos telefonistas. A informática estava apenas começando, sendo uma revolução no processamento de informações da época. Mensagens escritas eram transmitidas pelo telex. Ouvia-se música por LPs acoplados às caixas de madeira que ficaram conhecidas como vitrolas. Andar em solos que não fossem os terrestres parecia um sonho distante, digno dos encantamentos e devaneios de Galileu Galilei, Nicolau Copérnico e Johannes Kepler, matemáticos dos séculos XV e XVI que introduziram os estudos astronômicos entre a comunidade científica da época. Mas se tornou uma realidade e ainda foi transmitido para todo o planeta nas imagens fantasmagóricas da TV em preto e branco.
“O que mais gerou inovações tecnológicas no mundo foram as guerras e a corrida espacial”, afirma Ana Paula Rodrigues, engenheira aeroespacial formada pela Universidade Federal do ABC e cofundadora da Associação Cobruf. “Tem muita coisa que a gente usa hoje, mas foi desenvolvido com a intenção de usar no espaço”. Ela cita como exemplo os telefones celulares, que reconhecem quando ele está deitado ou de pé graças ao giroscópio em seu interior, pequenos instrumentos utilizados para controlar satélites espaciais.
O Programa Apollo foi composto por testes, experimentos e viagens orbitais com a finalidade de levar o homem ao solo lunar, tudo isso realizado pela Agência Espacial Americana (Nasa, na sigla em inglês). O projeto começou em 1961, oito anos antes do pouso no satélite. “Acredito que este país [os Estados Unidos] deveria dedicar-se a atingir, antes do fim da década, o objetivo de levar um homem à Lua e trazê-lo de volta à Terra são e salvo”, declarou o então presidente norte-americano John F. Kennedy.
Da Apollo 2 à Apollo 10, acidentes no percurso resultaram em tentativas sem sucesso e serviram de aprendizado para os engenheiros e cientistas envolvidos nas missões. Optaram, então, por dividir a nave da Apollo 11 em três módulos: o Módulo de Serviço, com propulsão, energia, oxigênio e água; o Módulo de Comando, uma cabine para os três tripulantes que voltaria à Terra; e o Módulo Lunar, que foi utilizado para pousar no satélite e apelidado de Eagle, apesar de pouco parecer com uma águia, e sim com uma enorme aranha de patas metálicas.
Durante a Apollo 11, não houve grandes incidentes. Uma equipe atenta de técnicos da Nasa acompanhava cada movimento de Armstrong, Aldrin e Collins em uma sala de controle em Houston, no Texas. Enquanto os dois primeiros caminhavam pela Lua, o terceiro permaneceu no módulo de comando dando orientações para o grupo.
Os enviados, todos com 39 anos já completos ou prestes a completar, passaram duas horas e 31 minutos na Lua e fincaram a bandeira dos Estados Unidos ali como forma de reconhecer a hegemonia norte-americana e do capitalismo, além de fazer um afronte à sua rival URSS, que disparou à frente da corrida espacial ao colocar em órbita o primeiro satélite artificial, o Sputnik, em 1957 e ao enviar o primeiro homem ao espaço a bordo da Vostok 1, o jovem e sorridente Yuri Gagarin, em 1962. Não faltavam motivos para o regime soviético vangloriar-se da sua superioridade tecnológica.
Seria tudo uma farsa?
Segundo a Nasa, as amostras lunares trazidas pelos três astronautas não são encontradas na Terra e têm cerca de 4,5 bilhões de anos, algo 200 milhões de anos mais antigo que as rochas terrestres. Mesmo com o feito histórico e a confirmação feita pela agência espacial norte-americana, inúmeras pessoas ainda acreditam que a chegada do homem à Lua não foi real.
Em 2018, Dmitry Rogozin disse que iria investigar se a Nasa de fato levou homens à Lua nas décadas de 1960 e 1970. Rogozin é o diretor da Agência Espacial Federal Russa (Roscosmos), fundada pouco menos de 25 anos depois do pouso no satélite. Outro que duvida do feito americano é o armador do time de basquete Golden State Warriors Stephen Curry. O craque da National Basketball Association (NBA) também se mostrou cético em relação ao assunto ao questionar a veracidade de homens pisarem em nosso satélite natural em um podcast Winging It em dezembro do ano passado. Em resposta, a Nasa convidou o jogador para conhecer seu laboratório lunar em Houston.
A engenheira aeroespacial Ana Paula Rodrigues acredita que o homem pisou na Lua. “Independentemente das teorias da conspiração, a missão Apollo 11 teve uma influência muito positiva na ciência, no desenvolvimento tecnológico e em utilizações do nosso dia a dia”, ressalta. Essa teoria da conspiração negacionista que Rodrigues cita é clássica e uma das mais confrontadoras por refutar todo o estudo científico dos Estados Unidos. Sob a influência da internet, o movimento conspiratório teve a chance de aumentar a troca de informações imediatas – além da curiosidade aguçada.
Mesmo com a comemoração de 50 anos da alunagem em julho, os conspiradores acreditam piamente que foi tudo uma farsa promovida pela Nasa e o governo norte-americano. De acordo com Roger Launius, que serviu como chefe de história da companhia, 5% da população acreditavam na teoria entre 1992 e 2002. Em abril deste ano, Launius participou de uma apresentação para o grupo de futuras expedições espaciais e divulgou que a sua preocupação atual é o esquecimento, e consequentemente, a criação de teorias ainda maiores. “As expedições da Apollo estão cada vez mais no passado e poucas pessoas se lembram. Assim fica mais fácil para abraçarem novas ideias”, desabafou durante o evento.
Os argumentos da conspiração
As justificativas para os teóricos de plantão são inúmeras e possuem até mesmo supostas provas em vídeos e imagens. Para muitos, tudo teria sido encenado como em um filme de Hollywood e, depois, pontualmente transmitido para a camada poderosa da sociedade, o que inclui o presidente americano da época, Richard Nixon.
Na época, a tecnologia ainda estava em desenvolvimento, e a alunagem foi um marco. Mas por que o governo norte-americano desistiu de enviar novas expedições que todo o poder tecnocientífico existente hoje? Esse é um dos questionamentos do universo da conspiração. Segundo a própria Nasa, a ausência de missões similares à Apollo 11 é devido ao grande custo das viagens, que aconteceram outras oito vezes entre 1969 e 1975 dentro do Programa Apollo. Mandar um novo astronauta seria perda de dinheiro, uma vez que os Estados Unidos não está mais em guerra com a União Soviética, a atual Rússia, e não precisam demonstrar hegemonia tecnológica, justifica.
Sobre novas viagens espaciais, o atual presidente americano Donald Trump divulgou em 2017 o interesse de estipular novas expedições. No ano passado, também demonstrou interesse com assuntos espaciais quando ordenou a criação de um novo grupo militar chamado de “Comando Militar Espacial”, encarregado das operações espaciais e parte do Pentágono. “Nosso destino além da Terra não é apenas uma questão de identidade nacional, mas uma questão de segurança nacional”, revelou o republicano, dando a entender uma nova necessidade de hegemonia por parte dos país.
Bill Kaysing, autor de We Never Went to the Moon: America’s Thirty Billion Dollar Swindle! (Nós Nunca Fomos à Lua: a Fraude de 30 Bilhões de Dólares da América, em tradução livre, ainda sem publicação no Brasil), ficou conhecido como o fundador da teoria que aponta para gravações em Hollywood do feito. Ele garante que o Estados Unidos não tinham tecnologia suficiente para tal pouso, montando a farsa como um grande filme a fim de ultrapassar a URSS. Características da filmagem e das imagens transmitidas pela televisão não são verossímeis o suficiente, acreditam, e são superficiais demais para demonstrar qualquer uma aterrissagem verdadeira.
Onze anos depois das cenas da caminhada no solo lunar, a Sociedade da Terra Plana argumentou que o cineasta Walt Disney teria patrocinado a trama e que Stanley Kubrick, responsável por 2001: Uma Odisseia no Espaço, dirigiu as filmagens. Para esses ela, a sombra das fotos também demonstra uma possível farsa, já que o astronauta, a Lua e as pedras têm sombras em diferentes direções, o que seria fruto dos refletores hollywoodianos.
Uma terceira teoria aponta que as cenas e as fotos oficiais, na verdade, seriam montagens. Como a gravidade do satélite lunar é diferente da Terra, acredita-se que as imagens foram alteradas. O primeiro exemplo é o da bandeira fincada. Os conspiradores defendem a tese de que não deveria haver vento no vácuo do espaço, o que contesta seu balançar. A Nasa, por sua vez, manteve a credibilidade da foto, explicando que o isso aconteceu devido à força aplicada por Neil Armstrong e que, para ser vista, foi esticada com um arame.
Outra foto que causa controvérsia no universo conspirador é a da pegada de Buzz Aldrin. Os conspiradores acreditam que, pela gravidade, deveria ter um aspecto menos marcado, como na areia. Já a resposta oficial foi em relação à umidade da Lua, que tem partículas irregulares e deixam uma marca de areia molhada.
As teorias não param
Muitas outras suposições foram erguidas para contestar o pouso da Apollo 11. Nas fotos divulgadas pela agência espacial, tem-se a visão apenas de um fundo escuro, semelhante a um fundo preto fantasioso de cenário de filme. A falta de estrelas deu combustível para as conspirações, o que a Nasa respondeu que as câmeras da época não conseguiriam captar as estrelas com precisão. Além disso, teóricos argumentam que a única marca deixada para trás foi a da pegada de Aldrin, sendo que a alunagem também deveria deixar vestígios do módulo lunar Eagle.
De acordo com os conspiradores, para os astronautas ultrapassem o chamado Cinturão de Radiação de Van Allen, dois anéis de radiação que circundam a Terra, seria um passo extremamente perigoso. Um dos teóricos que defendem essa ideia é Marcus Allen, editor da revista alternativa Nexus. Para ele, o cinturão mataria qualquer um que tentasse passar por ele. Mais uma vez veio a resposta da agência espacial: o tempo de exposição não foi suficiente para provocar mortes ou danos extremos.
Entretanto, essa mesma radiação é um dos pontos utilizados para confirmar o pouso na Lua, já que, de volta à Terra, os astronautas sofrem com as consequências dela mesmo em quantidades pequenas. Segundo a revista Scientific Reports, 43% dos astronautas falecidos morreram devido a problemas cardiovasculares causados pela radiação. Novas pesquisas estão sendo realizadas pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial e Biomédica (Inpe) para analisar a possibilidade de mandar homens para Marte em 2030 levando em conta essa radiação.
Por fim, os teóricos da conspiração ainda relembram uma foto divulgada que teria uma rocha lunar gravada com a letra C, parecendo um marcador. A rocha seria mais um elemento do cenário do filme.
Entre tramas e ciência
Em diversos sites e grupos de conspiração, o “mito do pouso na Lua” ainda é discutido e considerado controverso fervorosamente. Grupos e fóruns online para compreender as teorias fervilham na internet. Embora existam registros oficiais e governamentais, a desconfiança com a credibilidade norte-americana parece ganhar aumento a cada ano. Uma das que dizem não acreditar na veracidade da ida à Lua é a estudante de Artes Visuais de 25 anos Valeska Catherine Azevedo. “Essa história foi inventada para que os Estados Unidos superassem a União Soviética, que lançou sua primeira missão tripulada em 1961. A partir do lançamento feito por parte da URSS, eles precisavam demonstrar sua ‘grandiosidade’”, garante a jovem, enfaticamente.
Azevedo se junto a essa turba barulhenta que nega os feitos de 1969. A Guerra Fria é quase sempre citada entre os conspiradores como grande motivo para a farsa. “O gasto bélico era imenso, a União Soviética até tentou mas a missão não foi bem-sucedida, não passou da atmosfera terrestre. O alcance e conquista da lua, demonstraria o quão preparados os Estados Unidos estavam naquela época”, continua a estudante.
Sobre o uso da tecnologia atual, a jovem não economiza suas críticas. Acredita que o orçamento exorbitante ou o “não tem nada de novo lá” não são justificativa para outras missões. “Recentemente, com essa nova proposta de colonização de Marte com a ajuda do empresário Elon Musk, a pauta de uma nova expedição foi reaberta”. Para Azevedo, a ideia de Trump incentivar as operações espaciais da Nasa mostra-se como uma irônica coincidência. “A China e a Rússia divulgaram informações sobre um projeto que também envolvem naves na lua novamente”.
Entre hipóteses e embasamentos científicos, verossímil ou não, os 50 anos da Apollo 11 ainda se destacam pelo caráter controverso e político. As teorias da conspiração, comumente vistas como uma bobagem sem freio, servem de combustível para manter o legado espacial vivo, independente de como isso será feito. Resta saber se daqui 50 anos o que será contestado serão viagens a outros sistemas planetários ou ainda o pouso sonhador na Lua de 1969.