Recife é a 16ª cidade mais vulnerável em termos socioambientais; secretária Inamara Mélo chama a atenção para políticas públicas conjuntas
A capital pernambucana Recife é uma metrópole consolidada e uma das maiores cidades brasileiras, com mais de 1,5 milhão de habitantes de acordo com a estimativa mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Importante centro histórico brasileiro e destino turístico altamente procurado, a cidade vem enfrentando grandes desafios socioambientais nos últimos anos. O que começou como uma colônia de pescadores agora precisa lidar com o risco da elevação do nível do mar na zona costeira e o aumento da precipitação pluviométrica. Inamara Mélo, secretária-executiva de meio ambiente e sustentabilidade de Pernambuco, apresentou o caso de Recife na Conferência Internacional Cidades Sustentáveis, que acontece nesta semana em São Paulo. Confira a seguir a entrevista sobre o assunto.
ESQUINAS Recife está passando por uma crise de problemas ambientais?
Sim, e isso não é um problema apenas de Recife. Várias cidades brasileiras têm riscos climáticos altíssimos e vão enfrentar grandes problemas. Hoje existe um entendimento do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) que designa um grau de vulnerabilidade socioambiental para os municípios, envolvendo fatores como a falta de planejamento, saneamento e moradia, podendo levar a grandes danos diante de eventos extremos. A capital de Pernambuco é uma delas: é a 16ª no ranking mundial de vulnerabilidade aos efeitos dessas mudanças.
ESQUINAS E quais são esses problemas?
Estamos falando de uma cidade que tem trechos abaixo do nível do mar, onde o solo é mole e está cedendo com o peso das construções, causando o efeito da subsidência. Além disso, um terço da sua população está vivendo em área de risco de alagação e de deslizamento.
ESQUINAS Quais medidas o governo local adotou para lidar com os problemas socioambientais?
A Prefeitura de Recife, em 2013, foi escolhida para participar do projeto global Urban LEDS. Ao fazer parte disso, nós conseguimos construir o nosso inventário de emissão de gases do efeito estufa, estabelecemos a nossa política municipal de sustentabilidade e de confronto com as mudanças climáticas e montamos o Conclima [esfera de governança que envolve todos os setores da sociedade que constroem a cidade]. A partir do inventário, nós pudemos estabelecer metas de redução e construímos um plano de baixo carbono. Outro estudo que foi desenvolvido foi o de vulnerabilidade para montarmos um plano de adaptação da cidade. Também foram incluídas na revisão do Plano Diretor da cidade propostas para que seja melhorada sua resiliência.
ESQUINAS Qual o papel da mídia na educação ambiental?
A mídia tem o dever de informar e formar as pessoas para aquilo que é o aspecto da cidadania, e nós não achamos que essa função tem sido bem cumprida. A cobertura que é feita sobre a agenda do clima é insuficiente para apresentar os riscos que toda a sociedade enfrenta. Os problemas são apresentados de maneira sensacionalista, um atrás do outro, e as pessoas não se dão conta de que os moradores deveriam se mobilizar para resolver esse quadro. Acredito que temos uma crise na mídia do ponto de vista daquilo que é o seu papel na formação da consciência cidadã.
ESQUINAS O governo, por sua vez, tem exercido o papel de conscientizar a população?
O papel dele também é insuficiente. Nesse nosso modelo de desenvolvimento, existe uma cultura do individualismo, as pessoas são bombardeadas com todos os tipos de informação que não as permite enxergar os problemas para enfrentá-los coletivamente. Hoje o poder público não consegue dar conta dessa formação, nosso trabalho de educação ambiental ainda não conseguiu mudar a mentalidade das pessoas.
Em Pernambuco, nós temos uma população de nove milhões de habitantes. Como chegar com a educação ambiental e alterar aquilo que é a relação dos moradores com a sua cidade, com o seu habitat? Ainda é muito comum que as pessoas descartarem seu lixo incorretamente, que tenham atitudes que ajudam a degradar o meio ambiente. Só vamos conseguir um grande nível de consciência ambiental com ações muito mais eficazes, e a sociedade precisa estar mais atenta a isso.
ESQUINAS O estado de Pernambuco se destaca quanto ao comprometimento com as causas climáticas em relação ao restante do País?
Temos empreendido um grande esforço nesse sentido. Nós assumimos um compromisso com essa temática e construímos nossa política mediante essa perspectiva. Vamos sediar a Conferência Brasileira de Clima, buscamos apoio para atualizar o nosso plano estadual de mudanças climáticas e queremos adotar essa meta de reduzir nossas emissões até 2020.
Existe uma política em construção, também temos articulado com outros estados para que andemos todos juntos. Não adianta apenas uma cidade ou um estado mudar a sua agenda, é necessário que todo o planeta se dê conta da necessidade de cumprir o Acordo de Paris, de reduzir o efeito estufa e de barrar o aquecimento global. O esforço precisa ser consistente, persistente e coletivo.