Com startups voltadas para inovação no setor agro, região de Piracicaba vem consolidando um “Vale do Silício” caipira
Mudanças na forma de fazer negócios já são normais. O boom das startups trouxe a diversos setores soluções mais simples e eficientes, o que reduziu seus custos e aumentou sua produtividade. Essa revolução, que atingiu até serviços de entrega e transportes na cidade, aponta para uma reformulação dentro do agronegócio também. Na cidade de Piracicaba, a 150 quilômetros da capital paulista, foi criada uma espécie de “Vale do Silício” para concentrar empresas que trabalham com tecnologia e inovação voltadas no setor agro.
Com importantes hubs que abrigam as startups do setor, o Vale do Piracicaba é considerado pelos empreendedores locais uma revolução tecnológica nos meios de produção do setor agrícola. Marcelo Pereira de Carvalho, um dos sócios fundadores da AgTech Garage, um dos hubs dali, vê o Brasil em uma posição de liderança no meio. “Certamente vai estar na linha de frente, principalmente em agricultura tropical”, fala. “O país é líder em várias culturas, por que não ser também na tecnologia de precisão? É um caminho natural, por isso está tendo uma atratividade muito grande”.
A AgTech Garage funciona como uma multi-stakeholder, empresa com vários agentes e parceiros, conecta novos empreendimentos e possui quatro inovation partners de diferentes setores – Sicredi (financeiro), Bayern (agroquímicos e sementes), Ouro Fino (saúde animal) e OCP (fertilizantes). Segundo Carvalho, essa interação e troca entre as empresas é importante. “Uma vez que cada uma constrói seu próprio hub, perde-se o contato com startups que podem futuramente mudar seu negócio. Elas irão selecionar com atenção apenas novos negócios que já se relacionam com sua área de atuação”. No fim, perdem do radar potenciais empresas.
Hoje, a empresa tem em sua base virtual mais de 350 startups relacionadas ao agronegócio espalhadas pelo país. Para Carvalho, o setor do agronegócio chegou atrasado nessa nova era de modelos de negócios. Ele o compara com os aplicativos Uber e Rappi, que tiveram um crescimento latente logo de cara. O próximo passo da AgTech Garage, então, é realizar um programa de aceleração: chamada de “Intensive Connection”, a ideia é levar oito startups ligadas ao agro para um período de mentoria e desenvolvimento. A seleção será realizada em conjunto com as quatro âncoras do hub, o que abre o leque de modelos procurados, como fintechs e outros relacionados ao agronegócio. O hub atualmente possui 12 startups com escritórios locais. São elas: 3DGeo, Agrodata, AirScout, Forlidar, Gênica, HummingBird, IDGeo, IDMaq, OnFarm, Sintecsys, SmartBreeder e Terra Magna.
Afinal, o que fazem?
Ligadas ao agronegócio, as startups utilizam novas tecnologias do setor para facilitar a vida dos clientes e tornar a produção mais eficiente. A IDGeo, por exemplo, trabalha com agricultura de precisão e possui um escritório dentro da AgTech Garage. Mapeando os terrenos, ela determina onde estão os problemas do campo analisado – entre as observações, estão falhas de plantio, falta de insumo, concorrência de mato, grama e seda, pragas, estresse hídrico e muito mais. Além disso, com o “pisoteio”, identifica e diminui as áreas pisoteadas na lavoura, aumentando a produção e a colheita.
A IDGeo nasceu em 2013, incubada dentro da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), unidade da Universidade de São Paulo em Piracicaba, e focada na usina canavieira, que hoje é o principal tipo de cliente. Possui três pilares de sustentação: treinamento e transferência de tecnologia, consultoria e assessoria em geoprocessamento e inovação e pesquisa focado no monitoramento de safra. Luiz Henrique Pereira, um dos sócios fundadores da empresa, acredita que as startups por si só irão revolucionar o agronegócio. “A grande contribuição da startup está no tamanho dela. Quanto menor a empresa, mais flexível é para se adequar às necessidades dos clientes”, explica. Para os planos futuros, a IDGeo adotou as tecnologias para cana e quer adaptá-las para floretas e para grãos.
Outra empresa ligada à AgTech Garage, a OnFarm trabalha com o controle da mastite – infecção nas tetas das vacas –, contribuindo para a qualidade do leite bovino. Essa identificação ajuda em um uso racional dos antibióticos e um menor descarte de leite na mastite clínica. Além disso, há uma maior assertividade nos tratamentos e rapidez nas ações de prevenção, gerando assim uma maior qualidade final do leite.
A empresa atende mais de 200 produtores de leite em seis estados brasileiros. Para o mentor da OnFarm, Laerte Dagher Cassoli, o desafio atual é levar a tecnologia para o maior número de produtores possível para que haja um impacto na cadeia produtiva do leite. “Uma das tendências será a geração de informação para tomada de decisão mais próximo de onde a operação acontece, com baixo custo de aquisição e processamento dessa informação”, diz.
Além dos hubs, a Esalqtec – iniciativa de inovação da Esalq – mantém contato e troca com o Vale de Piracicaba. Com uma estrutura de incubadora, é um centro de investimento em novos negócios. “O objetivo da Esalqtec é apoiar as iniciativas empreendedoras no Vale e colaborar para que o conhecimento se transforme em inovação”, explica Sérgio Marques Ventura, gerente executivo do projeto. No futuro a instituição pretende dobrar para 20 a atual capacidade de incubação de empresas.