O estímulo à solidariedade no momento pandêmico - Revista Esquinas

O estímulo à solidariedade no momento pandêmico

Por Arthur Santos Eustachio e Yasmin Altaras (texto) e Bárbara Caldeira, Gabriel Balog e Matheus Silva (reportagem) : maio 16, 2020

A quarentena vem estimulando a solidariedade e a empatia no ambiente doméstico e no comercial; espírito de época veio para ficar?

Com o isolamento social e a atual situação de pandemia, o novo cenário mundial não trouxe apenas a covid-19, mas também uma solidariedade crescente entre vizinhos e comerciantes. A necessidade de evitar o contágio dos mais velhos está provocando em moradores de condomínios o aumento de ações de auxílio, tanto para fazer compras para as pessoas dos grupos de risco quanto na confecção e distribuição de máscaras de proteção.

É o caso de Carlos Augusto Bezerra, 61, dono de uma tecelaria em Americana, no interior de São Paulo. Ele decidiu confeccionar máscaras e distribuir entre as famílias das costureiras de sua loja e para a instituição de caridade Benaiah, que cuida de idosos na cidade. “Ainda planejo produzir mais mil máscaras e distribuir aos pedestres que passarem em frente à loja”, conta.

Ao ser questionado sobre a mudança de hábitos das pessoas, Carlos diz que houve uma mudança geral em relação à higienização, principalmente nos estabelecimentos comerciais de Americana. Agora, as lojas disponibilizam álcool em gel para os clientes, além de as pessoas estarem respeitando a distância adequada dos outros consumidores, mesmo com muita gente nas ruas.

Outra ação que ganha destaque em meio a essa situação é a confecção de brinquedos para crianças do Graacc (Grupo de Apoio ao Adolescente e Criança com Câncer). Maria Aparecida Tonin, de 60 anos, trabalha no Ministério Público de São Paulo e está fazendo bonecos de pano para distribuir entre os pequenos da instituição com doações de tecidos que recebe. “Faço isso para dar um carinho para as crianças, para que elas tenham um aconchego”, relata.

Contudo, Maria acredita que apenas uma parcela das pessoas está, de fato, mudando de comportamento em relação ao próximo. “Alguns realmente pararam para repensar suas atitudes e se doar um pouco, mas continuo acreditando que a grande maioria, não”, completa a funcionária pública.

A iniciativa de confeccionar máscaras, como fez Carlos, vem se popularizando em muitos condomínios por conta da fácil produção e dos materiais acessíveis. Isso já se tornou uma espécie de “tendência” na proteção contra a covid-19. “O que me motivou foi que sou apaixonada pela minha família”, revela a professora Débora Veneziani, de 53 anos. “Assisti a uns 15 vídeos na internet, testei e fiz meu modelo. Foi questão de necessidade”.

De acordo com ela, o projeto, a princípio, era apenas doméstico, mas como o retorno foi surpreendente, decidiu estender a prática. “Pensei: ‘Quer saber? Vou tentar vender’. Meu filho me ajudou bastante, tirou fotos e fez propaganda. Dispensado do trabalho, ele participou e foi um ponto muito positivo”, afirma.

Débora conta que no condomínio onde mora, na Lapa, Zona Oeste de São Paulo, existem cartazes informativos e álcool em gel nas recepções. Além disso, os moradores se mostraram dispostos. “Houve pessoas se mobilizando para fazer compras para os mais idosos, que não podem sair. Eu mesma tenho usado etiquetas nas sacolas para não confundir as compras”, ri.

Enquanto professora, ela pontua que alguns pais estão aflitos em relação ao ensino remoto, principalmente das crianças menores. “Com as lições na internet, os pais têm sentido muito. Em geral, pensam que dá para ensinar de qualquer jeito e não é bem assim”. Mas ela acredita que alguns profissionais de trabalhos essenciais nesta época estão recebendo certa valorização: “Muita gente vai se colocar no lugar desses trabalhadores, seja dos médicos ou dos garis”.

Se as atitudes de solidariedade continuarão depois da pandemia, Débora não tem certeza, mas é otimista: “Nem todas, mas penso que algumas vão permanecer. Na correria do dia a dia, todo mundo acaba olhando mais para o próprio umbigo. Quero acreditar que as pessoas irão mudar no comportamento com os outros e que serão mais humanas. Creio que existe um porquê por trás de tudo que estamos passando”, conclui a professora.