A malária é a principal causa de morte na aldeia Silva Macua Salawe, localizada na província moçambicana de Cabo Delgado
O novo coronavírus vem avançando em Moçambique, país no sudeste do Continente Africano com 29,5 milhões de habitantes. Até então, houve 2.559 casos e 19 mortes confirmadas. Mas outra enfermidade preocupa ainda mais os moradores da aldeia Silva Macua Salawe, na província de Cabo Delgado: a malária. Segundo locais, há mortes frequentes pela doença na região. Sem hospital ou qualquer meio de transporte por perto, os óbitos se dão pela falta de prevenção e de atendimento médico.
A malária em Moçambique
Uma das muitas pessoas afetadas pela malária foi Simone Pereira, brasileira de 46 anos que está em missão religiosa na aldeia. “É uma experiência horrível. Especialmente porque as consequências da malária perduram por muitos dias após a recuperação, e a fraqueza é muito grande”, conta. Ela teve a doença por duas semanas e diz que o tratamento é específico com os medicamentos que existem no país: Coartem e Paracetamol.
Por ser missionária, Simone teve condições de ir para um hospital em Pemba, capital de Cabo Delgado, privilégio que os moradores locais não têm. “Quem tem condições de ir para Pemba somos nós, missionários. Os moradores vão a um posto que nem fica tão perto daqui. Eles não conseguem ir para a capital, pois é necessário um carro ou pagar a passagem, mas eles não têm dinheiro, vivem da colheita que fazem”, afirma.
A província, onde vivem aproximadamente dois milhões de pessoas, está localizada no nordeste de Moçambique. Segundo a brasileira, o hospital mais próximo da aldeia fica a 14 quilômetros, o que explica sua fala: “Todos os dias morrem crianças e adultos por essa doença, isso para nós é normal”.
Além da falta de um hospital, também há escassez de equipamentos médicos. “Não há termômetros. E o único meio utilizado pelos moradores para auxiliar na locomoção dos doentes é uma maca feita de cipó, já que no local não há carros”, descreve.
“Aqui nós realmente estamos esquecidos”, afirma o morador e agricultor Andurabe Armando Manuni, 42 anos. Ele explica que o governo não toma nenhuma atitude em relação à situação vivida pelos habitantes. “Se eu pudesse pedir alguma coisa, com certeza pediria um hospital aqui na nossa aldeia, pois a dificuldade é grande para se dirigir a qualquer atendimento médico. A malária está matando muito”, relata.
Contudo, no último dia 11, o Banco Mundial anunciou apoio para ajudar Cabo Delgado. A província, afetada pela violência armada do Estado Islâmico desde 2017, que vitimou mais de 1.000 pessoas e ocasionou a fuga de 250.000 habitantes, agora receberá apoio da instituição financeira internacional. Um comunicado de imprensa da Presidência moçambicana diz que a iniciativa terá como objetivos gerar emprego para jovens, reconstruir infraestruturas e promover atividades de desenvolvimento econômico.
O que é a malária?
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença, uma infecção parasitária que afeta os glóbulos vermelhos do sangue, é evitável, detectável e tratável. Porém, a alta taxa de mortalidade em regiões predominantemente pobres se deve pela falta de infraestrutura médica, o que pode ser confirmado nos casos da aldeia moçambicana.
De acordo com o relatório anual da OMS, Moçambique é o país com a terceira maior percentagem de casos de malária no mundo. Os dados mais recentes apontam que, em 2018, foram registrados sete milhões de infectados e 900 mortes por malária em Moçambique. O país fica atrás apenas da Nigéria, com 25% do total de casos da doença no globo, e da República Democrática do Congo.
“É muita dor”, diz Andurabe ao contar que já teve a doença e também já perdeu familiares para ela. Por viver mais de 40 anos na aldeia, ele afirma que adultos e crianças morrem na mesma proporção: “Morre tudo igual. Crianças e adultos morrem todos os dias”. No entanto, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), “bebês, crianças menores de cinco anos, gestantes e pessoas com HIV correm um risco consideravelmente maior de contrair malária e desenvolver formas graves”.
Covid-19 na aldeia
Além dessa dura realidade, a covid-19 também preocupa os moradores da aldeia, principalmente pela falta de acesso a informações. “Eu não sei nada sobre o coronavírus. Não tenho nenhum aparelho móvel nem televisão e muito menos internet. Caso chegue aqui, o coronavírus matará muita gente”, diz o moçambicano. “Aqui, quem tem dinheiro usa máscara; quem não tem, não usa. Simples assim”, diz Andurabe.
Os últimos dados oficiais, divulgados em 6 de julho, informam que 153 pessoas testaram positivo para o novo coronavírus em Cabo Delgado. A província é a segunda maior em relação a casos da doença em Moçambique, e isso também aflige os habitantes do povoado. “O coronavírus ainda não nos atingiu, porém não sabemos o dia que vai chegar. A rotina continua normal”, diz o agricultor.
Segundo a missionária Simone Pereira, ao menos uma pessoa morre por dia na aldeia. Ela explica, no entanto, que a natalidade do local é maior que a mortalidade. Simone diz, ainda, que os moradores não temem um possível fim da Silva Macua Salawe. ”Se a aldeia desaparecesse seria muito triste, mas acredito que isso não vai acontecer. Em meio às dificuldades eles têm muita vontade de viver”, finaliza.