A doação de sangue é uma ação voluntária que pode ser realizada por qualquer pessoa que esteja apta para este processo
De acordo com dados da Prefeitura de São Paulo, uma única bolsa de sangue pode ajudar até quatro indivíduos, totalizando cerca de 20 mil beneficiados por mês só na capital paulista.
Mesmo assim, muitas pessoas têm receio de doar, pois não conhecem o procedimento ou não se sentem confortáveis para realizá-lo. Contudo, só é notada a importância de tal ato quando uma pessoa muito próxima está precisando dessa doação. Ana Cristina Silveira, 55 anos, cirurgiã-dentista, é doadora desde os 23 anos, período no qual ainda estava na faculdade. Mesmo nessa época, os bancos de sangue já vinham precisando de colaboradores.
Ana conta que virou doadora com o pensamento de sempre ajudar o próximo:
“Eu não preciso desse sangue, mas amanhã eu posso precisar e vou muito querer saber se vai ter o suficiente para salvar a minha vida.’’
A dentista ainda relata que, certa vez, doou sangue a pedido de uma amiga, para ajudar a filha, que estava internada em estado grave.
“Foi um momento que me marcou muito, já que a menina estava entre a vida e a morte. Ela sobreviveu graças à minha doação, que era compatível com seu tipo sanguíneo.” Em outro momento de sua vida, Ana diz que também ajudou uma criança com Leucemia e ressalta a importância de lembrar que, naquele instante, a doação está realmente salvando uma vida.
Como a doação de sangue é realizada?
Em um dia de doação, Ana acorda, toma um café reforçado, pega o carro e vai até a estação Santa Cruz, localizada na Linha 5-Lilás. Às 12h, Ana já está a caminho do Hospital A. C. Camargo para realizar sua doação de sangue voluntária.
Quando chega lá, a dentista estaciona sem ter que pagar nada, já que o estacionamento é isento de pagamento para doadores. Em seguida, Ana logo é atendida por Jéssica Vasconcelos, recepcionista que realiza toda a coleta de dados. Após ser chamada, ela vai direto para a triagem clínica, onde recebe um lanche para, então, seguir para a doação.
O processo não é demorado, além de muito semelhante a uma simples coleta de sangue. A diferença é que, neste caso, é coletada uma pequena bolsa de 450 ml, mediante inserção de uma agulha em um dos braços, e o tempo estimado de todo o procedimento, desde a chegada até a saída, é de no máximo 50 minutos. Depois da doação, Ana é levada novamente para uma área de alimentação, para repor suas energias e se hidratar. Então, a cirurgiã-dentista já está liberada para ir embora.
Como funciona o processo da captação do sangue?
Segundo a Dra. Andreza Lamônica, médica hematologista da Unicamp, o processo de captação do sangue é muito seguro. “Hoje em dia, é feito um teste de sorologia, então a chance de falso negativo é muito baixa. Se uma pessoa tiver HIV ou Hepatite, por exemplo, os médicos conseguem detectar a tempo. Por esse motivo, é muito importante que a transfusão seja bem indicada, para não ter nenhum empecilho”, ressalta a médica.
Para aqueles que irão receber o sangue, é necessário, primeiramente, a indicação da transfusão pelo médico responsável. Depois, o pedido é feito ao banco de sangue e passa por avaliação de um médico hemoterapeuta.
Por último, é colhida uma amostra de sangue do paciente, que será analisada para testar a compatibilidade com o sangue do doador. Assim, se compatível, o paciente poderá receber o sangue de acordo com sua necessidade.
O que acontece com o sangue doado?
O material é testado por meio de marcadores sorológicos, certificando-se que o doador não apresenta doenças como Hepatite B e C, Sífilis e outros impeditivos. Caso o doador tenha alguma dessas doenças encontrada no exame coletado, o banco de sangue logo envia os resultados dos exames para o mesmo pelo endereço informado no dia da doação. Quando isso acontece é muito importante que o doador entre em contato com o hemocentro para relatar sobre a alteração laboratorial encontrada no sangue.
Além disso, todo o material doado é separado em diferentes componentes, fazendo com que uma única bolsa de sangue possa beneficiar mais de um paciente. Assim, os componentes são distribuídos para os hospitais e podem atender aos casos de emergência ou aos pacientes internados.
É possível doar componentes específicos do sangue?
Segundo a Dra. Lamônica, esse processo é viável e pode acontecer por meio de uma máquina, chamada Aférese, na qual ocorre a doação das plaquetas e hemácias, devido à separação dos hemocomponentes. Porém, para acontecer, o indivíduo precisa ser elegível. Isso ocorre, geralmente, com colaboradores frequentes, que possuem hemoglobina mais elevada.
Outra dúvida comum é sobre a diferença entre a doação de Medula Óssea e de Granulócitos. A médica explica que a doação da Medula pode ser feita de duas formas. Na primeira delas, o paciente é levado ao centro cirúrgico e faz uma punção óssea com anestesia geral.
Já na segunda, a doação é realizada por via periférica, por meio de Aférese, na qual o doador fica até quatro horas em uma máquina para realizá-la. Contudo, o que define o método a ser executado é a doença do paciente, motivo pelo qual é importante passar em consulta com um médico do centro transplantador assim que for convocado para a coleta.
Lamônica ainda ressalta alguns critérios que precisam ser seguidos antes da doação de Medula Óssea:
“A pessoa tem que ter até 35 anos, se cadastrar no banco de sangue e dizer que quer ser doador de Medula. Então, a gente faz um teste, chamado HLA, e só chama se tiver compatibilidade.”
Quanto aos Granulócitos, é realizada uma doação por Aférese e, assim como a Medula, essas células também precisam de um estímulo com Granulokine, medicamento que aumenta a proliferação de leucócitos. “Vale salientar que as indicações dos dois procedimentos, os critérios e o tipo de doação são bem diferentes uns dos outros”, pontua a hematologista.
Uma dúvida frequente que pode surgir é quanto ao tempo que o corpo leva para repor o sangue e se o doador sentirá falta dele. A hematologista explica que, depois que o doador realiza a coleta, sempre tem uma perda de hemoglobina, pigmento vermelho que compõe o sangue. Contudo, a hemoglobina é reposta em até quatro meses, motivo pelo qual existe um tempo estipulado entre uma doação e outra. Para uma pessoa saudável, o nível de hemoglobina sempre vai estar bom, por isso não haverá nenhuma consequência para o doador.
Quais são os critérios para doar sangue?
De acordo com médicos-especialistas e funcionários de bancos de sangue, existem algumas recomendações que devem ser seguidas, como estar alimentado, evitar alimentos gordurosos nas 3 horas que antecedem o procedimento, ter dormido pelo menos 6 horas nas últimas 24 horas e não ter ingerido bebida alcoólica nas 12 horas que antecedem a coleta.
Além disso, outros critérios básicos fundamentais para a doação são ter idade entre 16 e 69 anos, desde que a primeira doação tenha sido feita antes dos 60 anos (menores de 18 devem apresentar consentimento formal do responsável legal), pesar no mínimo 50 kg e apresentar documento de identificação oficial com foto. O intervalo mínimo para realizar outra coleta é de 60 dias para os homens e de 90 dias para as mulheres.
Quais são os impedimentos?
Alguns impedimentos temporários são procedimentos invasivos, como cirurgias, endoscopias, colonoscopias e tatuagens, realizados em um período de 4 semanas a 12 meses, dependendo do caso, além de gravidez, amamentação e resfriados. Caso esteja apta a doar, a pessoa é conduzida ao local da coleta.
Vale ressaltar que, também, há impedimentos definitivos, que inviabilizam totalmente a doação de sangue, como doença de Chagas e Parkinson, hepatite após os 11 anos, malária, infecções sexualmente transmissíveis ou uso de drogas ilícitas injetáveis. Nesses casos, a coleta não será permitida.
VEJA MAIS EM ESQUINAS
“Cinco minutos para salvar quatro vidas”: como funciona a doação de sangue
“Não tinha onde colocar paciente”, diz especialista sobre a situação de hospital pediátrico
“Tenho a sensação de que não vai fazer tão mal”, diz fumante de vape
Como doar?
Para fazer a doação, é necessário ir em pontos de coleta, que normalmente são bancos de sangue específicos ou diretamente em hospitais que oferecem o serviço. Em São Paulo, os lugares estão espalhados por todas as zonas da capital e atendem gratuitamente, além de funcionarem todos os dias da semana, inclusive aos domingos e feriados.
No Brasil, a parcela da população que doa ainda é pequena. De acordo com dados do Sistema Único de Saúde (SUS) de 2022, apenas 1,4% dos brasileiros doam sangue regularmente, o que soma aproximadamente 3,2 milhões de contribuições por ano. Isso é o equivalente a 14 doações a cada mil pessoas.
Assim, é muito importante o incentivo à doação de sangue, como diz a hematologista da Unicamp, Andreza Lamônica: “A doação é um ato muito altruísta, já que quem doa não recebe nada em troca. É tranquilo, rápido e seguro, mas não deve ser feito a todo custo. Então, sempre responda o questionário com sinceridade, para não oferecer risco ao outro. Se o indivíduo tiver consciência, ele estará ajudando muitas pessoas”.