Representante do metal nacional, o cantor e compositor André Matos olha para a passagem do tempo em cima dos palcos
Cabelos longos, roupas pretas, jaqueta de couro, correntes de prata, pulseiras e um microfone na mão. É com este visual que André Matos fez história nos palcos nacionais, uma das grandes figuras que continua a carregar o legado dos antigos deuses do rock com o espírito metal e a poderosa voz. Mas estamos em outra época. “Meus últimos anos na música tem sido de altos e baixos literalmente falando. A gente vai envelhecendo, a idade vai chegando, e você começa a se perguntar se quer continuar fazendo isso”, indaga o cantor.
O músico se mantém na estrada há 33 anos. Porém, se contar os anos a partir do momento em que a música começou a fazer parte de sua vida, o resultado vai mais longe: 47 anos. Afinal de contas, Matos nasceu em 1971, e esta relação que move sua trajetória de vida é de berço. “Quando eu era criança, tinha muitas referências musicais de coisas que às vezes eu nem tinha noção do que era”, explica. “Eram, por exemplo, coleções de discos que meus pais e avós tinham e eu acabava ouvindo por tabela. Tinha muita MPB, rock dos anos 1960 e 1970. Já escutava alguns como Pink Floyd, Santana e Jimi Hendrix”.
A influência do avô foi fundamental para a consolidação de suas veias artísticas. “Foi o cara que me apoiou de verdade para seguir sendo músico”. Primeiro, estudou música clássica a partir do piano. O avô pensava que, se ele pudesse vir a ser músico, o piano daria a base necessária para que isso acontecesse. O rock só entraria nesta história em 1985, quando o vocalista abraçou de vez o mundo das baquetas, das guitarras, das caixas de som e das multidões. “Convenci minha mãe a me levar na edição de 1985 do Rock in Rio e assisti o primeiro dia. Tive o privilégio de ver bandas lendárias como Whitesnake, Iron Maiden, Queen”.
Certo da decisão de seguir nesse mundo, Matos passou a mergulhar nos estudos. Ingressou na faculdade de Música, onde construiu uma base teórica e prática que seria fundamental para o nascimento da banda Angra e, posteriormente, da Shaman.
Entre mudanças e dificuldades
Ao longo dos anos de carreira, além de participar ativamente da construção da identidade do rock nacional, foi testemunha das mudanças que o gênero sofreu nos últimos anos. Segundo o ex-vocalista do Angra, grande parte dessas transformações de mercado foram negativas. “O rock nacional hoje praticamente inexiste. Nos anos 1980 era um cenário muito interessante, que evoluiu um pouco mais nos anos 1990”, comenta. Ele cita bandas “muito boas” como Legião Urbana e Titãs. “Acho que as bandas de hoje não trazem nada de novo. Elas existem para fazer sucesso só. Para fazer dinheiro”, reclama. A culpa disso, para ele, seriam do sertanejo, do axé, do forró, da música de consumo – “bem produzida, porém pobre de espírito”.
Ainda que veja uma perda de forças no impacto causado nos ouvintes, ele continua a acreditar no potencial das composições como ferramentas políticas e filosóficas. Como o vocalista diz, pode ser nas entrelinhas da música mesmo. Ele ainda menciona as dificuldades presentes na carreira de um músico. É a senha para voltar a falar de seu momento atual. “A vida artística pode ser extremamente ingrata. Você passa por momentos ansiosos, depressivos, solitários, estressantes e cansativos”, desabafa desanimado e não para por aí. “Mesmo que você tenha trabalho, demandas e dinheiro, muitas vezes eu me perguntei se deveria continuar com essa vida”.
Mais de três décadas de carreira, milhões de discos vendidos, shows realizados em diversas partes do mundo, fãs de todos os perfis e nacionalidades possíveis. Fica difícil separar André Matos da música. Ainda assim, é no mínimo curioso tentar imaginar o que ele faria se em suas veias não circulasse o sangue roqueiro. “Gosto muito de arquitetura [risos]. Apesar de não ter o menor talento para Exatas, hoje em dia eu sou pirado em matemática, física, química. Apesar disso, o músico tem claro que sua trajetória e a do metal permanecerão lado a lado até quando der. “É rock que eu pretendo seguir fazendo até o fim, seja em cima do palco ou não”.