Líder de audiência por anos, produção carro-chefe da HBO tem oitava temporada com um dos mais altos índices de rejeição de fãs
Desde seu lançamento em 2011 pelo canal norte-americano HBO, Game of Thrones foi um sucesso estrondoso. Ganhou cada vez mais fãs temporada a temporada. Baseada na série de livros de George R. R. Martin, As Crônicas de Gelo e Fogo, a trama foca na luta de famílias nobres pelo Trono de Ferro e pelo domínio total dos Sete Reinos de Westeros. Com direito a dragões, um exército de mortos-vivos e muitas intrigas e mistérios pelo poder, a saga chegou ao seu último episódio neste domingo (19).
Game of Thrones é dono do recorde de seriado mais premiado da televisão: são 38 prêmios Emmy, o Oscar da TV – sendo que ocupa o topo do ranking de indicações a prêmios, abocanhando 110 no total. Somente Peter Dinklage, responsável por interpretar o anão Tyrion Lannister, foi nomeado sete vezes para o prêmio como ator coadjuvante e ganhou em 2011, 2015 e 2018. A série também entrou para o Guinness Book, em 2015, por causa do segundo episódio da quinta temporada (The House of Black and White) ter tido a maior transmissão simultânea da história: 173 países acompanharam o programa. Apenas uma amostra do alcance mundial da série.
Com um investimento estimado em ao menos 650 milhões de dólares pela produção total da série, só a oitava e última temporada – a menor de todas – desembolsou aproximadamente 14% desse valor, sendo a mais cara já realizada. São 15 milhões de dólares para cada um dos seis episódios.
Criada por David Benioff e Daniel B. Weiss, o roteiro e a trajetória de todos os personagens foram pautados na história dos livros e no jogo de poder da trama. Mas a última temporada – que não teve uma base nos escritos de George R. R. Martin, assim como as duas anteriores – não agradou os fãs: foram quase cem mil comentários negativos no Twitter para o episódio de domingo, por exemplo.
Intrigas de poder
Logo na primeira temporada, o telespectador é apresentado ao continente de Westeros em seu momento mais pacífico. É final do longo verão que atinge os Sete Reinos, e os personagens das casas nobres negociam o poder cotidianamente. Entre eles, estão Targaryen, Stark, Lannister, Baratheon, Tully, Greyjoy, Martell e Tyrell. No entanto, talvez o ponto-chave do sucesso da série logo nos primeiros episódios tenha sido justamente um enredo baseado no inesperado, com mortes de protagonistas e uma narrativa entrelaçada em genealogia e intrigas. Traições, prisões, incestos e prostíbulos são alguns dos principais temas destacados pela série no geral.
Não houve censura alguma em mostrar cenas de nu e sexo explícito ou de mortes e assassinatos. Um levantamento do site Mr. Skin aponta 82 cenas de nudez, sendo de 51 celebridades (36 mulheres e 15 homens), nas sete primeiras temporadas. Já o fansite Game of Canada aponta 174.373 mortes até o lançamento da oitava. A produção ainda adquiriu pontos no quesito audiovisual por seus efeitos especiais e por ter seus cenários gravados em várias regiões do mundo, como Croácia, Irlanda do Norte, Malta, Espanha e Islândia.
A segunda temporada tem como foco as habilidades políticas e o desenvolvimento de cada personagem, destacando-se a Batalha de Água Negra e o avanço do exército de mortos-vivos, os Caminhantes Brancos. Um dos momentos que chocou fãs na temporada seguinte foi o Casamento Vermelho. Por outro lado, é a partir da quarta que as intrigas ficam mais espinhosas em relação ao destino de Westeros.
A gradativa construção dos personagens acompanha a longa linha narrativa, costurada a partir de feitos e pela identidade psicológica deles. Martin e os produtores da série criaram um universo rico em detalhes e repleto de línguas fictícias.
Recordista de Emmy, com um total de 12 estatuetas, a quinta temporada marca um período de clímax decisivo no seriado – mesmo que quase todos os episódios aparentam ser assim. É nela que um dos vilões aparece de maneira mais ativa, o Rei da Noite (Vladimir Furdik), líder dos Caminhantes Brancos. Crise econômica, revoltas populares e uma ordem de fanáticos religiosos ainda protagonizam o início do caos em Westeros nos seus episódios. A sexta e a sétima temporadas ganham destaque pela Batalha dos Bastardos pelo controle de Winterfell, o Reino do Norte, além de prepararem terreno para o desfecho da série.
Desempenho em xeque
A tão aguardada última temporada, antes mesmo de ser exibida pela HBO, já rendia discussões entre os fãs. Quem merecia o Trono de Ferro? Ou melhor, quem se sentaria nele ao final? Qual seria o destino de cada personagem? No entanto, no decorrer de sua exibição, os seis episódios restantes resultaram em diversas polêmicas, dentre elas o enorme descontentamento dos fãs em relação ao roteiro.
Por ter ultrapassado os livros, a série teve seu enredo imaginado pelos showrunners David Benioff e Daniel B. Weiss. A insatisfação geral do público pode ser entendida a partir da teoria de Daniel Silverman, filósofo que analisa sagas de fantasia. De acordo com Silverman, o diferencial entre as temporadas se deve ao fato de como a história foi direcionada pelos roteiristas, isto é, eles seguiram uma lógica narrativa conhecida como plotter. Esse método é utilizado quando já se tem um final em mente. Assim, o único objetivo é construir a narrativa em uma lógica inversa, reconstruindo as ações. Por outro lado, o tratamento narrativo de George R. R. Martin é outro: ele utiliza o pantser, quando a história é elaborada a partir da construção e desenvolvimento dos personagens.
A sacada é justamente o momento em que as temporadas misturam esses dois jeitos de roteirizar, causando estranhamento nos fãs que se acostumaram por cinco temporadas com um roteiro pantser. Além disso, parece que a produção focou muito em como contar a trajetória de seus personagens em vez de dar espaço para o desenvolvimento sem pressa deles.
O desfecho derradeiro de Game of Thrones no domingo mostra uma nova política em relação a quem deve comandar os Sete Reinos de Westeros e como cada personagem que sobreviveu tomou seu próprio rumo independente. O que restou foram cachês altíssimos, números recordes de produção e incontáveis críticas – boas ou não – para uma série que marcou a televisão internacional.