Primeiro medicamento aprovado para tratar covid-19, não é mais indicado pela OMS - Revista Esquinas

Primeiro medicamento aprovado para tratar covid-19, não é mais indicado pela OMS

Por Laura Slobodeicov Ribeiro : novembro 27, 2020

HeungSoon via Pixabay

Fármaco promissor para o tratamento da covid-19, remdesivir não teve evidências suficientes de melhora segundo a OMS

Em 22 de outubro, a agência sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), autorizou o uso do antiviral remdesivir para o tratamento da covid-19. Até então, o antiviral da empresa norte-americana Gilead Sciences Inc. é o primeiro e único medicamento aprovado pelo regulador para tratar a doença. O comissário do FDA, Stephen M. Hahn, afirmou que “a agência continuará a ajudar a mover novos produtos médicos enquanto determina se eles são eficazes e se seus benefícios superam seus riscos”.

Histórico

O remdesivir, vendido pela marca Veklury nos Estados Unidos, surgiu, a princípio, como um possível tratamento para o Ebola. Porém, também demostrou eficácia contra SARS (síndromes respiratória aguda grave) e MERS (síndrome respiratória do Oriente Médio). Em maio, ele havia sido aprovado pela FDA apenas para uso emergencial em casos de coronavírus.  

A agência esclarece que o fármaco deve ser utilizado para uso em pacientes adultos e pediátricos com 12 anos de idade ou mais, que pesam pelo menos 40 Kg e necessitam de hospitalização. Deve ser administrado por meio de infusões intravenosas diárias e utilizado por cinco ou dez dias para aqueles em ventiladores ou suporte de vida. Ensaios clínicos testando a droga em pacientes mais novos ainda estão em andamento. 

É válido acentuar que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contraiu o coronavírus no início de outubro e foi tratado com remdesivir. O antiviral atuou em conjunto com um tratamento experimental com anticorpo, desenvolvido pela empresa de biotecnologia Regeneron Pharmaceuticals Inc.

Como funciona o medicamento Remdesivir

O medicamento retarda a infecção causada pelo vírus. Para isso, ele primeiro precisa entrar em uma célula saudável, se conectar com ela e depois iniciar um processo de cópia do seu RNA – que contém instruções genéticas para replicação. Essa reprodução se finaliza quando a célula fica preenchida pelas cópias fabricadas, deixando o material genético do vírus incompleto. Assim, ele fica incapaz de produzir partes vitais para o seu funcionamento e, como consequência, perde a habilidade de se multiplicar. 

Estudos relacionados

Stephen M. Hahn alegou que a decisão de aprovação foi “baseada na análise de dados de três ensaios clínicos” que incluíram pacientes hospitalizados com covid-19 em estados leve a grave. O principal deles foi realizado nos Estados Unidos com 1.062 pacientes e mostrou uma diminuição de cinco dias no tempo de recuperação dos infectados. 

Além disso, foi constatado um percentual menor de mortalidade e efeitos colaterais sérios em quem recebeu o placebo, sendo eles, respectivamente, 7,1% e 21% para os que tomaram o remdesivir e 11,9% e 27% para aqueles que tomaram placebo. Entretanto, a diferença não é expressiva para as estatísticas. Após a publicação do estudo, um editorial do New England Journal of Medicine classificou os frutos como “relativamente modestos”. O artigo do estudo conclui que, “considerando a alta mortalidade apesar do uso do remdesivir, é evidente que um tratamento apenas com um antiviral não é suficiente”, sugerindo associação com outros antivirais ou medicamentos distintos.

Mesmo com o clima positivo diante da aprovação, ainda há ressalvas na comunidade médica quanto à eficácia do remdesivir. A partir de pesquisas clínicas desenvolvidas pelo projeto Solidarity, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o medicamento teve pouco ou nenhum efeito na sobrevida dos pacientes. Esses ensaios envolveram 11.266 pacientes em 500 hospitais em mais de 30 países diferentes (entre eles, o Brasil), porém os resultados da organização não trazem conclusões definitivas, já que não contava com um grupo de placebo (dificultando comparações), nem foram avaliados por especialistas externos e publicados em um periódico científico. 

Custo do medicamento

Nos Estados Unidos, não existe um sistema de saúde universal gratuito, por isso, os custos são arcados por pacientes ou planos de saúde. Dessa forma, o tratamento terá custo de US$ 3.120 (cerca de R$ 17.000) por um tratamento de cinco dias ou US$ 2.340 (cerca de R$ 13.000) para compradores governamentais. Em relação às vendas globais, os analistas projetavam, em média, US% 2,3 bilhões em 2020 e US$ 2,1 bilhões em 2021, de acordo com o FactSet 

Vale ressaltar que ao país norte-americano já vinha investindo na droga. Em julho, um comunicado do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos afirmou que Trump efetuou uma compra equivalente a praticamente todo o estoque global de remdesivir.  Foram cerca de 500 mil ciclos de tratamentos, que representam 100% da produção farmacêutica em julho e 90% nos dois meses consecutivos. “Queremos garantir que qualquer paciente americano que precise de remdesivir possa obtê-lo”, afirmou Alex Azar, secretário de saúde. 

Insucesso

Em 19 de novembro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) se manifestou contrária ao uso do remdesivir no tratamento de pacientes infectados pelo coronavírus. De acordo com a organização, os testes não provaram resultados significantes o bastante para incluir a droga no tratamento. Para os especialistas, a falta de evidências curativas e o custo do remédio foram fatores que tornaram seu uso não recomendado. Entretanto, ainda é reconhecido que alguns pacientes possam se beneficiar do remdesivir, como potencialmente apontado nos estudos.