Roosevelt e Anhangabaú: os segredos dos principais picos de skate street em SP - Revista Esquinas

Roosevelt e Anhangabaú: os segredos dos principais picos de skate street em SP

Por Bianca Prazeres, Mariana Cury, Munir França : maio 7, 2022

Área destinada aos skatistas no Vale do Anhangabaú. Foto: Bianca Prazeres / Revista Esquinas

Centro da cidade reúne os principais pontos de encontros de skatistas; conheça as histórias de alguns dos frequentadores 

Ocupados desde a década de 1990 por amantes do skate, o Vale do Anhangabaú e a Praça Roosevelt  se consolidaram como os mais tradicionais picos do esporte em São Paulo. Situados no coração da cidade e de fácil acesso por ônibus e metrô, os dois lugares atraem pela presença da arquitetura que favorece as manobras – o grande destaque são as bordas e, no caso da Roosevelt, a escadaria com corrimão. ESQUINAS visitou os dois picos e conversou com alguns frequentadores dos locais.  

Vale do Anhangabaú

Localizado entre os Viadutos do Chá e Santa Efigênia, no centro de São Paulo, o Vale do Anhangabaú é um lugar bastante popular por ser palco de grandes manifestações culturais, shows e diversas atividades de lazer. Conhecido por ter o prédio da Prefeitura de São Paulo, o Theatro Municipal, a Escola de Dança de São Paulo, o Conservatório Dramático e Musical de São Paulo e um campus universitário em seus arredores, o espaço desperta o interesse de um grande público dentro e fora da grande São Paulo. 

 

vale do Anhangabaú

Vale do Anhangabaú – São Paulo. Foto: Munir França / Revista Esquinas
Munir França

 

O skate e o Vale do Anhangabaú sempre andaram de mãos dadas. Os skatistas costumavam praticar suas manobras nos bancos da região, mas foi só após um projeto de requalificação, finalizada no início de 2021 pelo SPUrbanismo, SPObras, e pela persistência dos próprios skatistas que buscavam preservar um dos maiores e mais clássicos picos da cidade, que foi entregue uma área totalmente dedicada ao esporte. O espaço conta com uma pista de concreto de 981,3 m² em formato de arquibancada e toda revestida com granito rosa, o mesmo material dos antigos bancos da região. A área funciona todos os dias de forma gratuita.  

”O skate foi meio que uma porta para que eu não me envolvesse em outras coisas erradas. No bairro onde eu moro a criminalidade é alta, acho que foi isso, uma porta pra eu fugir de coisas que eu sei que não iam fazer bem”, comenta Robert Lisboa, de 22 anos. Frequentador do Vale do Anhangabaú, o skatista pratica o esporte há 7 anos e fala sobre o papel fundamental que ele desempenha na sua vida. “Sem o skate eu não sei nem o que eu estaria fazendo. A raiz do skate é rua, você tem que viver a ‘parada’, não é sobre querer ser melhor que o outro.”  

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Skatista Robert Lisboa. Foto: Munir França / Revista Esquinas
Munir França

Estava presente no Vale, também, Rodrigo Panajotti, skatista carioca de 20 anos e um dos donos do canal 3SSkaters. Sua história no skate teve início por volta dos 6 anos e, aos 11, criou o canal no Youtube e começou a praticar todos os dias. ”Somos a maior mídia de skate do mundo, temos o canal com 3 milhões de inscritos. Hoje, temos essa cena em que queremos levar as crianças que ficam assistindo vídeos na internet a terem uma motivação para sair de casa e andar de skate. Essa sempre foi nossa missão.” 

Rodrigo também fala sobre suas inspirações quando iniciou no esporte: ”Eu comecei a andar de skate vendo vídeo no YouTube do Berrics, era fanático pelo Chris Cole. Nem me ligava que já tinham os grandes skatistas brasileiros até entrar o Luan Oliveira, que me inspirou muito. É legal ter um ídolo e torcer pro Brasil em campeonatos tão grandes”, finaliza. 

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Rodrigo Pajanotti, dono do canal 3Sskaters. Foto: Mariana Cury / Revista Esquinas
Mariana Cury

O skate e a Praça Roosevelt

A praça Franklin Roosevelt fica situada no bairro da República e foi inaugurada em 25 de janeiro de 1970. O espaço apresenta uma área de 50 mil m² e passou por uma reforma em 2012, na qual a praça Pentagonal foi demolida para que a Roosevelt ficasse totalmente plana. 

O local é constantemente frequentado pelos skatistas, e começou a ser ocupado em meados dos anos 80. Ao não cumprir as expectativas de se tornar um marco da cidade, 3 anos após sua inauguração o logradouro já apresentava problemas de infiltrações nas paredes, o piso remendado, entre outros problemas de infraestrutura.  

Assim, os skatistas descobriram o local como um ponto de encontro para a prática do esporte. Atualmente, o espaço é propício por possuir um chão liso, bordas veladas pelos próprios skatistas e corrimãos nas escadas, fatores que contribuem para a prática das manobras. O espaço também conta com viaturas da polícia militar e diversos bares ao redor da praça.  

Roosevelt

Vista da Praça Roosevelt. Foto: Bianca Prazeres / Revista Esquinas
Bianca Prazeres

”Minha história no skate começou em 2003, aos 7 anos de idade, por influência do meu irmão mais velho. Juntamos várias peças e montamos um skate pra mim”, conta Rodrigo, mais conhecido como “Digo Roque”, frequentador da praça.  

Falando mais sobre o local, o skatista indica para quem deseja iniciar no esporte, mas relembra que nem sempre foi assim: “Os skatistas se apropriaram e tomaram o lugar. Antes era muito sinistro, muita droga e morador de rua, não era qualquer um que vinha andar na antiga Roosevelt. Não é igual hoje que se tornou um lugar de fácil acesso.”

‘’Preto, periférico, a gente sabe como é”, afirma Digo Roque sobre as dificuldades e marginalização que envolvem o cenário do esporte. “Eu ando de skate na madrugada, toda vez que eu chego em casa eu agradeço de estar são e salvo.” 

“É cura, terapia, ensinamento de vida”, conta sobre a importância do skate na sua vida. “A visão que eu tenho sobre o mundo foi o skate que me deu e isso pra mim é algo que nenhuma outra coisa vai dar”, finaliza. 

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Perfil do skatista Digo Roque. Foto: Bianca Prazeres / Revista Esquinas
Bianca Prazeres

Rodrigo Pinsard, de 34 anos, é morador da Bela Vista e skatista há 26 anos. Com uma grande bagagem e experiência dentro do esporte, ele enxerga uma grande diferença entre a antiga e nova geração do skate. “A geração de hoje em dia é muito desunida, antigamente a gente era muito mais unido! Quando eu era menor e estava começando, os profissionais doavam as peças de skate que ganhavam dos patrocinadores para quem precisava. Hoje em dia, eles ganham 30, 40 peças de skate e vendem ao invés de ajudar o próximo”, afirma. 

Apesar das pistas de skate ainda não terem a atenção e infraestrutura que merecem, Pinsard conta que hoje em dia é muito mais fácil praticar o esporte do que era a alguns anos atrás. “Quando comecei a andar de verdade, no auge dos anos 90, o chão era horrível. Ou seja, para mim qualquer lugar é lugar. Tendo um palquinho, um corrimão no meio do nada, uma escada ou lugar alto, dá pra andar.” 

Rodrigo utilizou o skate como um fator decisivo em sua vida pessoal. Ex-usuário de crack, o skatista afirma que o skate foi o principal motivador para que ele abandonasse a droga e investisse em uma mudança de vida. Ele chegou a participar de campeonatos municipais, em pistas da região onde morava, mas perdeu todos os seus patrocinadores devido ao vício. “Eu cheguei a morar 5 anos na rua, mas mesmo assim eu tinha meu skate debaixo do braço e foi meio que o que me fez parar de usar. Eu falei que iria parar e conquistar tudo de novo, e eu consegui”, conta.

Hoje, com a carreira recuperada, o skatista possui patrocínio vitalício e voltou para as competições. 

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Rodrigo Pinsard em seu skate. Foto: Bianca Prazeres / Revista Esquinas
Bianca Prazeres

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Skate nas Olimpíadas: o que eles pensam?

Para Panajotti, a chegada do skate às Olimpíadas foi muito positiva, mostrando para um público geral que o skate é um esporte saudável como qualquer outro.  ”Com certeza, muita gente que falava mal do skate antigamente, hoje em dia vê o skate com outros olhos, graças às Olimpíadas. Hoje enxergam como um esporte normal, como se fosse alguém jogando futebol na praça, por exemplo.”  

“Divide os skatistas, mas por um lado, eu apoio”, comenta Robert Lisboa sobre o tópico. “Tem muitas pessoas que não gostam porque está se tornando algo mais para competição mesmo, perdendo a vivência. Começa a ficar igual a futebol, daqui a pouco os moleques vão virar “maquininha de manobra”.  

Digo Roque ressalta que as Olimpíadas viabilizaram algo muito importante para o cenário do skate feminino. ”A ’Fadinha’ (Rayssa Leal) influenciou muitas meninas. Outro dia eu estava lá no Jabaquara e vi uma menina,  22h, de vestidinho rosa, mandando várias manobras”, relata. 

Já Pinsard argumenta que o único ponto negativo das olimpíadas foi o aumento significativo do preço das peças de skate, o que torna o esporte menos acessível para os skatistas que não possuem patrocínio, parcela que representa a maioria nas ruas. Mas afirma a importância da representatividade e visibilidade que a prática ganhou se tornando um esporte oficial de um campeonato mundial e de grande porte, como as Olimpíadas. 

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Manobra de skate de Rodrigo Pajanotti. Foto: Mariana Cury / Revista Esquinas
Mariana Cury

Editado por Anna Casiraghi e Nathalia Jesus

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