Direito adquirido no papel, inclusão digital nas escolas parece distante de ser realidade
O direito de acesso à internet é reconhecido como direito fundamental pela PEC 47/2021, de autoria da senadora Simone Tebet (PMDB-MS). Porém, essa não é a realidade de milhões de alunos de escolas públicas do nosso país. Os estudantes sofrem com escassez tecnológica dentro e fora de sala de aula, criando um abismo cada vez maior entre os conectados e desconectados.
“A pandemia é o que nos escancara a necessidade de acesso à internet e também o quanto ele é precário”, afirma Thais Santos de Lima, coordenadora de tecnologia do Movimento Amplia. A coordenadora fala da necessidade de mais acesso às tecnologias, principalmente depois da pandemia, para que cheguem às mãos de alunos de escolas públicas do Brasil.
Ao se fecharem as escolas para conter o contágio da covid-19, o governo do Estado de São Paulo adaptou o Centro de Mídias da Educação para realização de aulas de maneira remota, pela televisão e internet. A professora de português, inglês e itinerário, Ingrid Tainá Vieira Nascimento, explica: “só pelas televisões já não dava para assistir todas as aulas, porque a maioria era pela internet, o que passava na televisão era o geralzão”. Além disso, o CMSP prometia que seu aplicativo poderia ser utilizado mesmo sem conexão online, o que não foi experienciado por diversos alunos que só conseguiam assistir às aulas com conexão própria.
Os alunos que não tinham acesso ao espaço virtual não podiam assistir às aulas. Isso pode contribuir para o aumento no índice de evasão escolar, que segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aumentou 171% em 2021, na comparação com 2019.
As escolas que ainda não têm acesso à Internet e recursos tecnológicos sofreram ainda mais com a criação e implementação do Novo Ensino Médio, criado para se adequar mais ao jovem brasileiro. O problema é que na realidade isso não acontece, ele se inicia quando o governo federal passou a disponibilizar uma cartilha para os professores dando sugestões de como realizar as aulas da nova disciplina chamada itinerário. Mas as recomendações se baseiam em quase todos casos na utilização de Internet para as atividades, assim impossibilitando a atuação efetiva dos professores e alunos dessas escolas na disciplina. Os educadores têm que, por conta própria e sem apoio governamental, adaptar esses materiais para serem utilizados de maneira impressa e desconectada. “Tudo folha de papel, os professores andavam com pastas cheias de papéis” afirma a professora sobre seu estágio na Escola Estadual Carlos Gomes em Campinas.
Ademais, as adaptações emergenciais para a continuidade das aulas de alunos sem Internet no momento de pandemia foram muito prejudiciais para a educação nacional. Alguns exemplos são os de escolas que fizeram aulas pelo rádio, e por falta dos elementos visuais são consideradas por Ingrid como precárias, além disso as lições pela televisão foram pouco adotadas por sua grande0 complexidade.
“Grande parte dos nossos estudantes dizem que estudam apenas pelo celular, o que assustou muito a gente”, Thais conta sobre sua experiência no Amplia, ONG que por meio de doações de dinheiro e equipamentos usados consegue ajudar centenas de estudantes a terem aparelhos para assistirem suas aulas online de maneira mais digna e com melhor compreensão.
Percebendo a falta de familiaridade digital dos professores e alunos, a Secretaria de Educação decidiu criar o cargo de PROATEC (Professor de Apoio a Tecnologia e Inovação) que consistia em professores que deveriam ajudar os colegas e alunos com a utilização de tecnologia, ou seja, caso os mesmos tivessem dúvidas na utilização das ferramentas deveriam contactar o PROATEC presente que os auxiliariam. A problemática se inicia na escolha desses profissionais que é feita apenas por manifestação de interesse e não por capacitação, mas também falta qualidade nessa formação como a educadora formada na PUC Campinas denuncia: “Eles [a Secretaria de Educação] acham que é só passar um vídeo mas falta a formação presencial, mostrar para o professor como seria a utilização na prática”.
Uma grande problemática do afastamento da Internet dos alunos são as inscrições do Enem que somente podem ser realizadas pelo site do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) com nenhum outro meio alternativo, como por telefone ou presencialmente. Além disso, o site do órgão tem sua utilização de maneira muito complexa conforme conta a coordenadora: “Fizemos uma campanha em um lugar remoto de Roraima e sentimos a dificuldade dos estudantes se inscreverem na plataforma do Enem e enviarem os boletos para nós pagarmos”. Também é notado por ela a falta de divulgação dos prazos da isenção e das justificativas do porque elas foram negadas.
Para atenuar a distância entre os estudantes sem Internet ou com Internet de baixa qualidade, alguns programas dos governos estaduais e federal para distribuição de chips de Internet móvel e tecnologia foram criados. Um deles programas é o do Governo de São Paulo que distribuiu 250 mil chips de 3gb para professores e 500 mil chips de 3gb para alunos, entretanto a burocracia para retirada desses equipamentos ainda é muito grande, com esperas que chegam a um ano para entrega do material, assim atrasando a educação de todo o estado.