Jair Bolsonaro (PL) dá início a sabatina do Jornal Nacional com presidenciáveis; com falas polêmicas, confira a checagem de ESQUINAS
O Jornal Nacional abriu espaço para os quatro candidatos mais bem colocados da corrida eleitoral. Decidido em sorteio, Jair Bolsonaro abriu a sabatina nesta segunda-feira no estilo Jair Bolsonaro de se comunicar: 1 mentira a cada 3 minutos, de acordo com a apuração do Estadão.
Em uma entrevista de 40 minutos, sem pausa, foram abordados os principais assuntos surgidos ao longo do seu primeiro mandato. Dos ataques à democracia, passando pela crise econômica e a gestão da pandemia, o nome do presidente ocupou os assuntos mais falados do Twitter por conta da sua atuação durante o programa.
Democracia e as urnas
Fora das telas, o som de panelas batendo esteve presente nas janelas de todo o Brasil desde o primeiro minuto. Na entrevista, William Bonner começa questionando Bolsonaro sobre seus recentes ataques ao regime democrático brasileiro e sobre xingamentos a ministros do STF. O presidente, em reação, acusou o jornalista de propagar fake news.
“Primeiro, você não está falando a verdade quando disse que eu xinguei ministros. Isso é fake news de sua parte”.
Porém, há vídeos de Bolsonaro ofendendo os ministros Alexandre de Moraes e Luiz Roberto Barroso durante manifestações e eventos públicos.
Em seguida, sobre as ameaças de “deslegitimar” as eleições, alegou que vai aceitar o resultado das urnas. No entanto, afirmou que elas devem ser “limpas e transparentes”, mas não argumentou sobre o porquê elas não seriam, enquanto Bonner afirmava que já houve a comprovação da segurança das urnas eletrônicas e do sistema eleitoral brasileiro.
O âncora do Jornal Nacional também questionou o candidato sobre como ele encara o posicionamento de seus apoiadores quanto ao regime democrático. O presidente argumentou dizendo enxergar como “liberdade de expressão”.
“Quando alguns falam em fechar o Congresso é liberdade de expressão deles, eu não levo para esse lado; e, para mim, isso daí faz parte da democracia. Não posso eu ameaçar fechar o Congresso ou o Supremo Tribunal Federal”, afirma.
O presidente flerta com o fechamento do congresso muito antes de assumir a presidência da república, desde 1999.
“Só não se vacinou quem não quis”: Bolsonaro analisa sua atuação na pandemia
“Pandemia. Nos momentos mais dramáticos, o senhor imitou pacientes de covid com falta de ar. Sobre as mortes, o senhor disse: ‘E daí, eu não sou coveiro”. O senhor estimulou o uso e usou dinheiro público para comprar medicamentos comprovadamente ineficazes contra a covid. O senhor desestimulou a vacinação. O senhor não teme ser responsabilizado, se não pelos eleitores, pela história?”
É assim que Renata Vasconcellos abre a discussão sobre a gestão da pandemia de covid-19 no Brasil. Ao começo de seu discurso, o candidato do PL defendeu que seu governo foi muito atuante, trazendo as vacinas o mais rápido possível, até mesmo antes de outros países “mais desenvolvidos”.
“Olha, nós compramos mais de 500 milhões de doses de vacinas, só não se vacinou quem não quis”, rebate. Bolsonaro, no auge da pandemia, incentivou o tratamento por cloroquina, comprovadamente ineficaz, e atrasou a chegada da vacina no Brasil.
“O grande erro disso tudo foi um trabalho forte da grande mídia, entre eles a Globo, desestimulando os médicos a fazerem o tratamento precoce”, defende.
Sobre a imitação, Bolsonaro nega. “Eu queria que você botasse no ar eu imitando a falta de ar”, disse para a jornalista. Porém, no dia 18 de março de 2021, durante sua live semanal, o presidente imitou uma pessoa sem ar para criticar as medidas de Luiz Henrique Mandetta, então Ministro da Saúde, para conter o avanço da doença no país. Tal ato voltou a se repetir em maio do mesmo ano.
Aumento de benefícios, da inflação e do desemprego
Quando o assunto é economia, Bolsonaro segue batendo nas mesmas teclas. O presidente volta a afirmar que o lockdown, medida instaurada em 2020 para conter o avanço da pandemia no país, serviu apenas para piorar a situação econômica.
Junto disso, ainda assumiu a autoria da criação do Auxílio Emergencial, explicando que fez o possível para ajudar a população durante o momento de crise. Bolsonaro foi, inicialmente, contra o pagamento das parcelas no valor de 600 reais, propondo o valor de até 200 reais.
Questionado sobre o aumento da inflação e a atual crise econômica, Bolsonaro explica que a crise causada pela covid-19 e a Guerra da Ucrânia impactaram muito seu governo. Mas que, apesar dos pesares, o país está bem se comparado com outros países.
“Se você pegar os dados de hoje, você vê o Brasil como talvez o único país do mundo com uma deflação. Você vê também que a taxa de desemprego tem caído no país. Os números da economia são fantásticos, levando-se em conta o resto do mundo”, explica o presidente.
Porém, vale destacar o porquê dessa deflação. Segundo Adalton Diniz, economista formado pela PUC-SP e doutor pela USP, o fato está ligado ao fato da taxa de juros estar muito alta no Brasil, fazendo com que ocorra uma queda na demanda. “Queda de preços não significa que a economia está bem, pois é uma queda de demanda. Dizer que a economia vai bem é contar apenas um lado da história”.
O presidente também aborda a questão da taxa de desemprego que, segundo o IBGE, atinge 9,3%, a menor do governo Bolsonaro. Neste ponto, Adalton questiona sobre o tipo de emprego que essas pessoas estão sendo contratadas, visto o aumento de ocupações precarizadas e piores remunerações, afetando a capacidade de consumo da população.
Somado a isso também. há a atuação da inflação. Desde o ano passado, o rendimento médio do trabalho se manteve no mesmo patamar (R$ 2082,oo), enquanto a inflação ultrapassou 10% ao ano, fazendo com que, na prática, esse salário valha cerca de R$ 200 a menos.
Outro ponto positivo, na visão de Bolsonaro, foram as reformas realizadas em seu governo, como a da previdência, auxiliando a economia do país. Na visão de Diniz, essas reformas poderiam indicar boas economias ao estado, mas, por conta dos benefícios concedidos, tanto para pessoas quanto para empresas, vai se formando um buraco no longo prazo.
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Em relação ao meio ambiente, Bolsonaro mais ataca do que se defende
Sobre a Amazônia, o presidente não muda o posicionamento desde que afirmou que a floresta amazônica não pegava fogo por ser “úmida”. A jornalista abriu o bloco de discussão com a fala de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente que, em 2020, em meio a crise sanitária, disse em reunião que era momento de “passar a boiada”, se referindo ao desmonte das leis ambientais.
Para responder aos questionamentos e se defender das acusações, o candidato manteve a política de “meu território”, ataca as políticas do Ibama e afirma que os incêndios que ocorrem na Amazônia não são exclusivos do Brasil.
“Por que não se fala também agora na França, que há mais de 30 dias está pegando fogo? A mesma coisa está pegando fogo na Espanha e Portugal. Califórnia pega fogo todo ano. No Brasil, infelizmente, não é diferente, acontece.”
Segundo o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), o desmatamento na floresta cresceu 56,6% durante o governo Bolsonaro. Ainda, segundo o Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, do MapBiomas, desde 2019, quando o presidente tomou posse, o país perdeu uma área correspondente a 42 mil km² de vegetação nativa.
Em relação a fiscalização, Jair Bolsonaro acusou o Ibama de cometer abusos. Segundo ele, a ONG se preocupa mais em colocar fogo em tratores do que realizar a retirada do local, o que seria contra a lei. Ele ainda se defendeu quanto à preservação justificando que a Amazônia possui um território geograficamente idêntico à Europa, o que dificulta a atuação dos fiscais.
Além disso, o presidente defende que o Brasil preserva 66% de sua área verdes, número superior a países como Alemanha e Reino Unido. Segundo levantamento da Global Forest Watch, 40% das perdas de florestas primárias do mundo em 2021 ocorreram no Brasil.
Bolsonaro, afinal, é fã ou hater do Centrão?
Mudando a conversa para o palco político, Bonner comenta sobre as duras críticas ao Centrão – conjunto de partidos que formam a maioria no Congresso – no começo de seu mandato, e as suas recentes tentativas de aproximação com o grupo com a chegada do período eleitoral. Após a comparação entre os discursos, o âncora questionada sobre o porquê os eleitores devem confiar em suas promessas.
“Você está me estimulando a ser ditador”, rebate Bolsonaro.
O apresentador do Jornal Nacional se assustou e perguntou o motivo disso ao presidente. Ele respondeu afirmando que se não fosse o Centrão, nenhum auxílio do governo teria sido aprovado no parlamento.
“O Centrão são mais ou menos 300 parlamentares, se eu deixar de lado, eu vou governar com quem?”
A aproximação de Bolsonaro com o “Centrão” tem sido alvo de críticas nas redes sociais, tanto de apoiadores quanto da oposição. Recentemente, o presidente se envolveu em uma polêmica ao ser chamado de “tchutchuca do Centrão” por um youtuber, conhecido por ser uma personalidade da direita, no “cercadinho” do Palácio do Planalto. Como retaliação, Bolsonaro tentou agredir o influencer enquanto ele filmava a cena.
Seguindo, o presidente se orgulha em dizer que “nós estamos num governo sem corrupção”, mesmo com a prisão, em junho deste ano, do ex-ministro da educação, Milton Ribeiro, por suspeita de corrupção no MEC. Ainda, afirma que a indicação de seus ministros é baseada apenas por “critérios técnicos”. No entanto, segundo estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a presença de integrantes das Forças Armadas em cargos de confiança cresceu 193% sob seu governo.
Suas considerações finais
Em seu minuto final, Bolsonaro aproveita para retomar os “grandes feitos” dos seus quatro anos de governo. Seu discurso começa falando sobre a “situação crítica na questão ética, moral e econômica” que o país se encontrava quando foi eleito, em 2018. Depois, segue afirmando que fez todo o possível para que “a população brasileira sofresse o menos possível.”
De medidas tomadas pelo seu governo, o presidente cita a queda do preço dos combustíveis, retoma a criação do Auxílio Brasil e diz que realizou a transposição do Rio São Francisco – obra que foi iniciada durante o governo Lula (PT) e que, quando Bolsonaro assumiu, já estava 92,5% concluída, segundo checagem do Comprova.
Ainda, afirmou ter “pacificado o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)”, discurso que promove desde maio deste ano, durante evento no Sergipe, no qual defende que a intensa entrega de títulos de terra feito pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) levou ao fim do movimento.
Sobre o Pix, modalidade de transferências do Banco Central que entrou em vigor em novembro de 2020, Bolsonaro assumiu para si a autoria da solução de pagamentos. “Criamos o Pix, tirando dinheiro de banqueiros”, afirma. Porém, o projeto, na realidade, foi construído durante a gestão de Michel Temer (PMDB), antes das eleições. Em maio de 2020, em conversa com apoiadores na frente ao Alvorada, Bolsonaro chega a confundir o pix com assunto de aviação civil e afirma não ter tomado conhecimento sobre a medida.
Sua fala no programa não passou despercebida e, um dia após a entrevista, o Sindicato Nacional dos Servidores do Banco Central (Sinal) lançou uma nota em repúdio à fala do presidente. A organização se colocou contra o uso político da ferramenta e destaca a possibilidade de greve.