Conheça 4 videolocadoras de São Paulo sobreviventes na era do streaming - Revista Esquinas

Conheça 4 videolocadoras de São Paulo sobreviventes na era do streaming

Por Julia Corso, Luiza Festa, Mariana De Oliver e Victor Evaristo : maio 15, 2024

Prateleiras recheadas de DVD's Foto: Julia Corso/ESQUINAS

Enquanto o streaming domina, quatro videolocadoras de São Paulo resistem e oferecem aos cinéfilos uma experiência nostálgica

Em uma era de streamings como Netflix, Max e Prime Video, entre outras dezenas de plataformas, saber que um indivíduo frequenta videolocadoras pode passar a imagem de alguém estagnado no tempo. O costume de acessar filmes pela internet, porém, deixa os amantes de cinema órfãos de uma experiência muito querida: entrar em uma loja e poder ter em mãos clássicos como “E o Vento Levou…” ou passar pelas prateleiras e se deparar com uma coleção que marcou a sua infância.

As sextas-feiras perderam a graça, agora que não se reserva mais um horário do dia para alugar um dos diversos filmes espalhados por uma locadora. Receber uma indicação não é mais a mesma coisa quando deixamos de nos transportar àquele ambiente à espera de um atendente que, depois de uma boa conversa, já apontava de modo certeiro uma obra que correspondesse ao nosso gosto.

Venha conhecer quatro videolocadoras que permanecem firmes em São Paulo em meio a esse cenário e como estes acervos históricos sobrevivem.

Horus VideoLocadora

A Horus VideoLocadora é um espaço criado em 2008 por Valdirene Ramos e Roseli Carvalho. As donas e atendentes do estabelecimento recebem os clientes com um olhar sensível e crítico direcionado aos interesses deles. “Nosso propósito vai além do financeiro: queremos entregar e elevar a cultura e educação dos brasileiros.”

O nome “Horus”, muito amado por Val e Rose, é inspirado pela história egípcia. A decoração com esculturas e pôsteres relacionados ao assunto destaca a autenticidade do local. O ambiente oferece filmes e documentários de diferentes categorias, entre elas estão: artes, jornalismo, psicologia, medicina e os lançamentos do cinema atual. Elas preferem cinematografias educativas e que geram reflexão. “Nós queremos que os clientes venham para ganhar um aprendizado dos filmes“, diz Rose. Além de DVDs, há vendas de livros, CDs, incensos, entre outros produtos.

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Fachada da Horus VideoLocadora.
Foto: Julia Corso/ESQUINAS

As donas comentam os desafios para preservar o espaço na era dos streamings e ressaltam a importância deste ato: “nas locadoras há uma troca entre o vendedor e o cliente, opiniões e experiências dos filmes, que os streamings não oferecem”. Val acrescenta, “as pessoas estão colocando dinheiro em plataformas digitais que não oferecem a mesma qualidade de som e imagem dos DVDs”.

Rose e Val se esforçam para trazer filmes em formatos DVDs atrativos ao público, já que o encontro das distribuidoras diminuiu em quantidade, desde o começo dos streamings. “Um suor e uma lágrima”, diz Val. A troca recebida ao entregar cultura e cinema supera essas dificuldades e se torna a razão do negócio. A Horus permanece como exemplo de perseverança e amor à história, com destaque ao zelo pelos seus clientes há mais de 15 anos.

Serviço

Endereço: Av. Senador Casemiro Da Rocha, 960 – Vila Da Saúde, São Paulo.

Horários: Terça-feira a sexta-feira, das 12h às 18h; sábado, das 13h às 18h.

Confira em: Instagram – @horusvideolocadora

Charada Clube

No extremo leste da cidade, no bairro Vila Tolstói, Gilberto Petruche mantém viva a última locadora existente em uma periferia: a Vídeo Locadora Charada Clube. Criada em 1995, foi organizada pelo dono, que cansou de trabalhar na área corporativa e resolveu viver uma das suas verdadeiras paixões, o cinema. A curiosidade pela sétima arte começou logo cedo, quando lia resenhas de filmes e via as imagens das obras na Folha de São Paulo.

Com o chão enfeitado de LPs, uma bancada para vendas, e algumas dezenas de prateleiras dos mais diversos filmes, o local é nostálgico. Também estão espalhados pôsteres nas paredes e há diversos equipamentos antigos de gravação em cima dos estandes de filmes. A antiga sala escondida onde ficavam os pornográficos foi transformada num espaço para shows e stand-up.

Desde sua criação, a Charada nunca quis ser só uma videolocadora, mas sim um espaço no qual as pessoas poderiam discutir sobre cinema, música e cultura, numa espécie de mesa redonda.

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Objetos antigos em exposição na Charada Clube.
Foto: Luiza Festa/ESQUINAS

Para manter o espaço vivo, todo mês acontece o festival de música “Idade da Terra em Transe”. O evento, que começou com a ideia de comemorar o aniversário de 20 anos da locadora, agora movimenta o lugar e aumenta o fluxo de clientes que alugam filmes e compram bebidas vendidas ali. Gilberto conta que, como mantém o local por hobby, às vezes tem que tirar dinheiro do seu próprio bolso para pagar as contas.

O boom dos streamings não foi o que atrapalhou os negócios inicialmente, e sim a pirataria, muito marcante na periferia segundo Gilberto. Para ele, a concorrência das plataformas digitais é leal, pois as empresas pagam impostos e fazem tudo legalmente. “Eu não posso ficar no passado”, afirma o dono. “O que eu tenho que fazer com a minha locadora é mantê-la, sabendo que tenho filmes que só eu tenho e que eu sou ser humano, nada contra, mas ali (streaming) é só algoritmo.”

Os 500 filmes locados por dia se transformaram em uma média de 90 alugados por mês. Petruche não culpa ninguém específico por isso: “O streaming é o culpado disso? Não. A juventude mudou e é a culpada? Não. É o consumidor que mudou? Não. O mundo muda e a gente tem que se adaptar para continuar vivo.”

Serviço

Endereço: R. José Antônio Fontes, 62 – Vila Tolstói

Horários: Segunda-feira a Sábado, das 10h às 19h

Confira em: Instagram – @centroculturalcharada

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Eject Video

Aberta em 1991 por Ricardo Luperi, a Eject Vídeo conta com acervo de filmes dos mais variados diretores e gêneros para aluguel ou venda. As obras são divididas de acordo com os nomes de renomados cineastas.

Ricardo administra a locadora sozinho desde 1995 e, para ele, manter seu negócio é prazeroso, não se trata de sofrimento e luta para garantir a “sobrevivência” da locadora. “O termo sobreviver faz parecer que sou um náufrago, que estou me agarrando em galhos, mas não, eu ganho bem aqui e vivo feliz. Sobreviver não é o termo certo”, afirma o propietário.

Sua paixão pelo cinema começou em 1983, quando lia revistas sobre o assunto. Ele pesquisava muito sobre filmes e gostava de avaliá-los. Foi a sua paixão pela arte que o motivou a abrir a locadora. Luperi frequenta diversos cinemas e, quando viaja, visita os lugares que são relacionados à cinematografia.

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Ricardo Luperi, dono da Eject Video, com alguns DVDs disponíveis na locadora.
Foto: Julia Corso/ESQUINAS

Ricardo ainda compartilhou sobre sua relação com as demais videolocadoras de São Paulo, já que, devido a alta demanda, antes havia concorrência entre elas. Como são poucos estabelecimentos desse gênero na cidade atualmente, ele fez amizade com os outros donos; eles trocam clientes entre si e até indicam filmes um para o outro.

Algumas pessoas frequentam desde a abertura, e Luperi acabou virando amigo delas. Maria Inês Forte, uma cliente assídua, compartilhou sua experiência no local: “gosto de cinema desde criança e a Eject Video é o espaço em que dou uma volta ao meu passado, aqui tenho contato com o antigo e o novo. É um cantinho para curtir o cinema. Além disso, o Ricardo é um ótimo curador que sabe meu gosto e me indica diversas obras”.

Serviço

Endereço: Rua Dr. Bacelar, 324 – Vila Clementino

Horários: Segunda-feira a Sábado, das 10h às 14h

Confira em: Instagram – @ejectvideo / Youtube – @EjectVideo

Video Connection

Paulo Sérgio Pereira, fundador da Video Connection, encara o empreendimento como um museu e mantém o local por “amor à pátria”, como ele mesmo diz. Localizada na República, a locadora tem uma grande variedade de títulos, com DVDs nacionais e importados, incluindo obras raras. A Video Connection se destaca como uma referência no ramo não só por seu nome e legado, afinal, ela é a última locadora que ainda trabalha com serviço de aluguel de VHS, mas também por oferecer a possibilidade de conversão da fita para outros formatos.

Quando chegamos para a entrevista, Paulo estava dando início a um processo de digitalização para DVD do filme “Tristana, Uma Paixão Mórbida” (1970), do qual o seu acervo só dispunha o VHS, para um cliente que não tinha como reproduzir o produto. Com a diminuição drástica da produção de mídia física para o mercado brasileiro, a videolocadora também oferece filmes recentes que foram lançados apenas em streaming por aqui, procurando atender a todas as necessidades do público ao se adaptar às demandas atuais.

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Prateleiras cheias de DVDs, na Video Connection.
Foto: Julia Corso/ESQUINAS

Com animação e expectativa, Paulo relata o aumento de cadastros em sua loja, vindo principalmente de jovens, que procuram filmes de diretores como Roman Polanski, Lars Von Trier, Clint Eastwood e Bernardo Bertolucci, já que os filmes mais “comerciais” são encontrados com facilidade nos meios digitais. A retomada da mídia física no Brasil através de novos fãs tem interessado antigos colegas de Paulo a reabrirem suas videolocadoras, porém, como ele diz, o investimento ainda não compensa, “a minha vantagem foi essa de eu ter adquirido a loja em 97, então não pago aluguel”.

De pé desde 1985, a Video Connection guarda anos de histórias em suas prateleiras e se mostra preparada para que venham muitas mais!

Serviço

Endereço: Edifício Copan, Loja 30 / Av. Ipiranga, 200 – República

Horários: Segunda-feira a Sábado, das 11:30h às 20h

Confira em: Instagram – @connection05 / Facebook – @videoconnectionsp

Editado por Ludmila Borba

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