'Que país é este?': a ditadura militar pelos olhos de Jorge Bodanzky - Revista Esquinas

‘Que país é este?’: a ditadura militar pelos olhos de Jorge Bodanzky

Por Lucas Miyake : abril 26, 2024

Jorge Bodanzky filmando o Mito do Divino com Hermano Penna. Foto: Acervo IMS/Divulgação

Instituto Moreira Salles (IMS) relembra os vinte anos da ditadura militar através de retratos do cineasta Jorge Bodanzky

Para o aniversário de 60 anos do golpe militar de 1964, o Instituto Moreira Salles, em parceria com o cineasta Jorge Bodanzky, apresenta “Que País é Este?”, um retrato dos desfavorecidos na luta contra a ditadura. A exposição traz fotos e filmes de Bodanzky com o intuito de relembrar e ensinar os mais jovens sobre o período.

Era 9 de abril de 1964, nove dias após o golpe, quando catorze ônibus do exército chegaram à recém-inaugurada Universidade de Brasília (UnB). Os militares invadiam salas e revistavam alunos à procura de armas ou matérias de propaganda subversiva, enquanto também buscavam por 12 professores que posteriormente seriam presos e interrogados.

Cenas como esta tornaram-se cada vez mais frequentes no cotidiano da universidade, desencadeando uma onda de greves por parte de alunos e professores. Dentre os envolvidos estava Jorge Bodanzky, que a partir deste momento se viu como um ativista contra o governo. “Eu era estudante, a gente lutava contra a situação. Essa luta, essa resistência foi o que abriu as coisas para mim, a partir daí me tornei um oponente do regime, um ativista”, conta o fotógrafo em entrevista para ESQUINAS.

Bodanzky

Calouros desfilam pela avenida W3 em trote organizado por veteranos da Universidade de Brasília em 1965.
Foto: Acervo IMS/Divulgação

Bodanzky reúne, sessenta anos após a primeira invasão à Universidade de Brasília, fotos e trechos de sete filmes gravados ao longo da ditadura na exposição. O propósito da colaboração entre Jorge e o IMS é expor o real peso da ditadura para os brasileiros. “Há uma dificuldade, um desconhecimento das novas gerações do que era o período militar, as escolas não ensinam”, explica o cineasta. “O objetivo é mostrar o que acontecia.”

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Os filmes de Bodanzky, também presentes na exposição, inventaram uma nova maneira de se fazer cinema no Brasil. Com roteiros enxutos, atuações improvisadas, equipamento portátil e gravação de som direto, não era raro utilizarem a ficção e a encenação para realçar as contradições reais da sociedade e despistar a perseguição do regime. Esta técnica é vista, por exemplo, em “Iracema: uma transa amazônica” (1974).

Iracema também representa outra vontade de Bodanzky: contar a história daqueles que levavam suas vidas afastadas das capitais. Jorge e seus colaboradores sempre buscavam histórias mais distantes do grande público e que precisavam ser ouvidas. A obra acompanha Edna de Cássia, uma jovem de quinze anos que vai para Belém assistir o Círio de Nazaré e entra no mundo da prostituição. Uma narrativa muito comum na época, já que várias jovens se tornavam prostitutas e se envolviam com militares na região das obras da Transamazônica.

“A gente foi na Transamazônica, que era o grande projeto dos militares. Eles tinham um especial apreço e faziam muita propaganda dizendo que era o progresso chegando, mas não levaram em consideração que lá moravam índios, caboclos, ribeirinhos, quilombolas. Eles [militares] diziam que era um deserto verde e que devia ser ocupado com fazendas e isso era visto como progresso, algo positivo. A gente já sabia que não era assim. Então, a ideia era mostrar o que de fato acontecia na estrada”, relata Jorge Bodanzky.

A exposição “Que País é Este?” representa não apenas uma retrospectiva dos eventos marcantes e das histórias desconhecidas da ditadura militar brasileira, mas também uma oportunidade de reflexão e aprendizado para os mais jovens que não viveram este período. A parceria entre o Instituto Moreira Salles e Jorge Bodanzky busca preencher lacunas de conhecimento e conscientizar o público sobre os perigos e desafios enfrentados pela sociedade brasileira sob o autoritarismo.  A exposição surge em um momento da história brasileira em que garantir que as vozes dos  silenciados jamais sejam esquecidas.

​​A exposição estará no IMS até o dia 28 de julho, com entrada gratuita.

Editado por Ludmila Borba

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