Tarsila do Amaral para todos - Revista Esquinas

Tarsila do Amaral para todos

Por Susana Terao : abril 10, 2019

(Foto: Henrique Artuni)

A maior artista modernista do país ganha exposição de retrospectiva no Masp com 92 obras

Em 2008, a obra mais famosa da pintora Tarsila do Amaral (1886-1973), Abaporu, de 1928, fez parte da exposição Tarsila Viajante, da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Desde então, ela permaneceu no Museu de Arte Latino-Americano de Buenos Aires (Malba), saindo apenas para exposições em Brasília e Rio de Janeiro. Onze anos depois, o quadro retorna a São Paulo para compor a mais ampla retrospectiva já feita sobre a artista.

Das 92 obras expostas, dentre elas pinturas e desenhos, Abaporu é, sem dúvidas, o centro das atenções de todo o espaço expositivo. O quadro atrai o público que se aglomera, em parte, para admirar a obra que inspirou o Movimento Antropofágico, mas também para garantir suas selfies de recordação.

Tarsila Popular dá sequência ao ciclo temático Histórias das mulheres, histórias feministas no Museu de Arte de São Paulo (Masp), iniciado em março com a exposição individual de Djanira da Motta e Silva. A retrospectiva de Tarsila do Amaral se divide em seis núcleos que não seguem, necessariamente, uma ordem cronológica das fases da artista e que, embora numerados, são independentes e podem ser explorados sem uma sequência pré-estabelecida.

O primeiro núcleo da exposição é composto, principalmente, por retratos. O grande destaque deste agrupamento é a presença do famoso quadro A Negra, que se localiza de forma contrastante entre dois autorretratos da pintora. No segundo conjunto de quadros, manifestam-se as representações de corpos nus de forma acadêmica e, também, experimental, com geometrização e abstração que se assemelham às inovações da vanguarda artística cubista.

No terceiro agrupamento, são expostas obras da fase Pau-Brasil, com paisagens rurais e urbanas. Nesse período, quando figuras humanas aparecem, não têm rostos definidos e estão imersas nos cenários retratados, como meros figurantes. Essa fase exalta a modernização e o progresso retratado por elementos como ferrovias, maquinarias e edifícios.

Em contraste com tal otimismo e deslumbramento, o quinto núcleo tem como foco a realidade social do país. Tarsila traz temas como o fluxo migratório nacional em Segunda Classe e a diversidade étnica do Brasil em Operários, evidenciando as desigualdades sociais e as condições precárias da classe trabalhadora.

O quarto núcleo é diversificado em seus temas. Eles vão desde a religiosidade, que inspira Religião brasileira I, elementos domésticos e decorativos presentes em Romance até a utilização ousada de cores intituladas na academia como “caipiras” (azul e rosa) para compor o lendário Manacá. É dentro dele também que se encontra a obra mais intimista de toda a exposição. Em 1930, diante da crise financeira da família e do fim de seu casamento com Oswald de Andrade, Tarsila pintou apenas um quadro, que completa o núcleo, Composição (Figura Só).

No sexto e último espaço da exposição destacam-se as lendas populares brasileiras e mitos indígenas, como A Cuca e Batizado de Macunaíma. Também estão presentes os quadro Antropofagia e Abaporu, suas maiores representações da fase Antropofágica.

Com a curadoria de Fernando Oliva, Tarsila Popular  busca propor novos diálogos com as obras da artista. Cerca de 40 textos espalhados ao longo da exposição acompanham algumas das pinturas com análises de pesquisadores.

Uma das maiores representantes do movimento modernista brasileiro, Tarsila do Amaral teve sua formação acadêmica em Paris, com mestres como André Lhote e Fernand Legér, onde recebeu a influência das vanguardas europeias. O retorno de Tarsila ao Brasil, no entanto, não foi marcado pela mera reprodução de seus aprendizados na Europa, mas sim por uma reconexão com os aspectos nacionais e regionais de sua terra natal, enraizando sua brasilidade em cada quadro.

Tarsila Popular, portanto, não dá ênfase apenas ao legado da obra rica e grandiosa de Tarsila do Amaral, mas evidencia principalmente as questões sociais, raciais, religiosas e folclóricas, abordadas ao longo de sua carreira. A partir dessa aproximação com temas e figuras tipicamente brasileiras, a curadoria buscou, novamente, ressignificar a noção de “popular” e promover o debate do termo, enquanto elemento essencial para a identidade cultural do país.

Tarsila vem ganhando, nos últimos anos, grande reconhecimento no cenário mundial. O Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York, não apenas realizou a exposição individual Tarsila do Amaral: Inventing Modern Art in Brazil, em 2018, como, também, adquiriu em fevereiro de 2019, a pintura A Lua, de 1928. Sem um anúncio oficial do valor da transação, estima-se que a obra tenha sido vendida por cerca de US$ 20 milhões, aproximadamente R$ 74 milhões.

 Tarsila Popular permanece no Masp até 28 de julho, com entrada gratuita às terças-feiras. De quarta a domingo, a meia entrada custa R$ 20 e a inteira R$ 40.