O mangá de cada um - Revista Esquinas

O mangá de cada um

Por Camila Motta, Felipe Luna e Gustavo Maganha : maio 3, 2018

Em uma cultura já consolidada no mundo todo, como a demografia influencia a vida do leitor de mangás?

Para os amantes da cultura japonesa, a classificação de mangás e animes pela demografia não é nenhuma novidade. Porém, são questionáveis a importância e a relevância desse tipo de especificação tantos nos países orientais quanto nos ocidentais.

Nesse meio literário, a demografia define e direciona o público-alvo de determinadas publicações de revistas e mangás, em especial no Japão, onde são originalmente publicadas. A demografia apresenta classificações de gênero e idade, definindo o público que se pretende atingir. Elas se dividem em:

Kodomo: voltada para o público infantil, no geral crianças bem jovens, com histórias simples e leves, chegando a ser educativas em certos casos. Alguns exemplos são Yo-Kai Watch e Doraemon.

Shonen: voltada para o público infanto-juvenil masculino, usa traços impactantes e tem a ação e a comédia como temáticas recorrentes. Pode-se citar Naruto, Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco.

Shojo: o oposto do Shonen, é voltada para o público infanto-juvenil feminino, de arte normalmente mais delicada e conta histórias românticas. Como exemplos temos Sakura Cardcaptors e Sailor Moon.

Seinen: publicação voltada para o público adulto masculino, cuja a arte costuma ser mais detalhada e a história mais complexa ao abordar temas filosóficos, políticos e de violência. Entre eles, temos Akira e Ghost in The Shell.

Josei: voltada para o público adulto feminino, em que a arte se mantém delicada e detalhada. Trata de dramas, dilemas e também romance. Podemos apontar Nana e Paradise Kiss.

Mas até que ponto a classificação dos mangás por demografia é importante e como ela afeta a publicação dessas obras?

Mara, pseudônimo de Fábio Garcia, o criador do blog Mais de Oito Mil, destaca o maior problema com essas demografias e aponta o motivo de acreditar que essas histórias deveriam ser classificadas por gênero apenas, e não por público-alvo. “Na época do Samurai X, o mangá queria atingir o público masculino, mas a maioria dos leitores era composta de mulheres, e o Kenshin [o protagonista] era muito querido por elas por conta da aparência mais próxima dos pop stars que o Japão apresenta e pela estética Shojo da obra”, relembra Garcia.

No Brasil, era mais comum ver o Shonen nas lojas de mangás. Por isso, as pessoas associavam esse estilo às publicações no geral e se surpreendiam quando viam que havia histórias fora daquele estilo. Hoje, existe uma desconstrução de preconceitos em uma indústria que possui uma produção de maior diversidade que o cinema.

Essas classificações por demografia não se mantêm apenas pela tradição, mas também por um aspecto conservador da cultura japonesa, mesmo em tempos em que as questões de igualdade de gênero e sexualidade vêm ganhando força. “O quanto eles estão perdendo em lançar como demografia e não como gênero é absurdo. Aqui o brasileiro se afasta por rótulos”, reforça Garcia.

Independente de não pertencer à cultura ocidental, a demografia de certa forma afeta não só a recepção das obras, mas a publicação delas dentro do país. “Para cada mangá diferente que a Editora Panini lança, ela publica seis Shonens genéricos”, conta o criador do Mais de Oito Mil.

Sendo esse o ponto de vista de um consumidor, a questão mercadológica é um pouco mais complicada. Cassius Medauar, gerente de conteúdo da Editora JBC, uma das principais publicadoras de mangá do Brasil, contrapõe essa questão.