Paul McCartney: a trajetória de um ícone que revolucionou a música - Revista Esquinas

Paul McCartney: a trajetória de um ícone que revolucionou a música

Por Enzo Rocha Santos : julho 7, 2025

Dentre os quatro Beatles, Paul McCartney foi o mais bem-sucedido na carreira solo após o fim da banda, especialmente no âmbito comercial. Foto: pauldaley1977/Pixabay

Aos 83 anos, Paul McCartney segue como um dos maiores nomes da música, com uma trajetória de inovação e impacto geracional

Artista versátil e criativo, Paul McCartney transita entre rock, pop, música clássica e eletrônica, além de se aventurar em trilhas sonoras. Compositor, vocalista, baixista, guitarrista, pianista e tecladista, seu talento é multifacetado — como mostra o clipe da música Coming Up.

Co-fundador dos Beatles, banda que transformou a história da música, e dono de uma carreira solo influente, Paul se mantém relevante há décadas. Sua trajetória passa pelos anos 60 com os Beatles, os anos 70 com a banda Wings (formada com sua esposa Linda), os anos 80 em duetos com Michael Jackson (Say Say Say, The Girl is Mine), e os anos 90 com turnês mundiais.

Alcançando os anos 2000 em diante, Paul se destaca em colaborações com “rivais” (como os Rolling Stones), revisita seu passado e apresenta renovações surpreendentes. Sua presença vocal é imponente e arrebatadora, seja em shows históricos no Coliseu, em Roma, ou nas trilhas sonoras de filmes como Live and Let Die (James Bond) e Vanilla Sky (com Tom Cruise).

Experimentalismo

McCartney foi revolucionário ao apresentar o conceito mais explorado de álbum temático com Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967), que inclui faixas famosíssimas como Lucy in the Sky With Diamonds e A Day in the Life, além de ter sido o primeiro LP de rock a ganhar o Grammy de Álbum do Ano. Não era apenas uma música que seguia uma narrativa coesa, mas todo o disco, baseado em metáforas, metalinguagem, intertextualidade e psicodelismo. A própria capa, inspirada na pop art, fazia parte da narrativa musical, que começou com a ideia de apresentar uma banda fictícia que refletisse a imagem dos próprios Beatles em uma representação quase teatral. O genial compositor, junto com a inigualável banda, encontrou uma forma curiosa de unir negócios e lucratividade com arte genuína e vanguardista. Sgt. Pepper foi inspirado em Pet Sounds, dos Beach Boys, álbum que, por sua vez, foi inspirado em Rubber Soul, também dos Beatles.

Após a morte de Brian Epstein, empresário dos quatro e considerado o “quinto Beatle”, Paul McCartney assumiu indiretamente a função de “diretor” dos projetos musicais. Isso resultou, além de futuras intrigas entre os membros, na consolidação definitiva do experimentalismo e do psicodelismo musical. Magical Mystery Tour dá continuidade à “fantasiação” da banda — tanto na capa quanto no conceito. Sobre esse período, o músico e musicólogo Giovanni Felippi Sodré destaca:

“Principalmente entre 1966 e 1967, a obra dos Beatles se transformou profundamente, de algo a ser tocado ao vivo para uma música de estúdio. Junto com Brian Wilson (dos Beach Boys), Paul buscou ampliar os limites da música pop incorporando elementos impensáveis para a época. […] Acho que Paul McCartney influenciou a todos a pensar fora da caixa e daquilo previamente estabelecido.”

O lado inovador do Beatle revela uma face que não se estagna em apenas um caminho: “Ele provou que experimentar não significa se distanciar do público; pelo contrário, é uma forma de se manter vivo, atual e necessário. Ao romper com padrões, acabou criando novos. Paul claramente tem essa necessidade de se renovar, mas sem perder a essência”, lembra Caroline Santini, fã do artista.

Wings

Pouco depois de iniciar sua carreira solo, após lançar dois álbuns, o garoto de Liverpool — agora homem formado — formou uma nova banda de rock com sua esposa Linda McCartney: o Wings. Com uma formação instável, apenas o casal e Denny Laine permaneceram do início ao fim, entre 1971 e 1981.

O próprio nome da banda pós-Beatles tem forte relação com a vida pessoal da família McCartney: Linda enfrentava complicações no parto da filha Stella, e Paul, preocupado, recorria à fé. Em determinado momento, como uma epifania, decidiu o nome da nova banda:

“Por algum motivo, eu começava a pensar em asas de pomba, asas de anjos, asas de pássaros, asas de avião. Então disse à Linda: ‘Que tal Wings?’”

No início, o grupo buscava se distanciar ao máximo dos Fab Four, tentando fugir da pressão e das expectativas que o nome McCartney carregava. O Wings surgiu como umav estreante, com seus integrantes desprendidos do que havia sido construído por seu líder anteriormente, embora o nome já despertasse atenção e curiosidade.

Paul comentou sobre o primeiro álbum Wild Life:

“Bob Dylan tinha acabado de gravar um álbum em poucos dias (provavelmente New Morning, de 1970), algo assim. Então pensei: ‘É, seria bom. Daria um toque de frescor.’ Essa foi a abordagem para compor Wild Life.”

Band on the Run, talvez o LP mais conhecido do Wings, foi concebido em meio a contratempos: pouco antes da viagem à Nigéria, onde o álbum seria gravado, o baterista Denny Seiwell saiu da banda; durante a gravação, as demos em fita cassete foram roubadas em um assalto ao casal McCartney. Demonstrando sua versatilidade, Paul assumiu também a bateria no disco — um desempenho elogiado pelo baterista Keith Moon, do The Who.

O fim do Wings foi marcado pela breve prisão de Paul em Tóquio por posse de maconha, o que gerou um escândalo público. A dissolução oficial ocorreu em 1981, com Paul já envolvido em outros projetos musicais. Os elementos mais marcantes da história da banda foram, sem dúvida, as turnês e a clara liderança assumida por Paul.

 Carreira solo

Dentre os quatro Beatles, Paul McCartney foi o mais bem-sucedido na carreira solo após o fim da banda, especialmente no âmbito comercial. Isso está ligado à forma diplomática com que Paul lida com a indústria musical, além de suas escolhas corporativas. João Guilherme Estrella, produtor musical e compositor, comenta:

“A boa diplomacia certamente colabora com a longevidade de sua carreira, mas tanto talento não passaria despercebido mesmo sem uma boa política mercadológica. Acho que ele gosta de pessoas e faz parte da sua essência se relacionar de forma espontânea e tranquila com a maioria dos humanos.”

“O primeiro disco mostra um Paul ‘pai de família’, com canções gravadas em sua maioria em um estúdio caseiro que Paul montou. É bem diferente das mega produções que ele gravou nos últimos discos dos Beatles”, comenta Sodré sobre a variabilidade artística do músico — que varia entre o tradicional, erudito, vanguardista, poético, nonsense e introspectivo, sempre explorando profundidade simbólica e emocional.

“Ao sair dos Beatles, o Paul provou que é um artista que não precisa de uma banda para criar algo grandioso. Ele misturou gêneros com naturalidade e inaugurou uma nova era de autonomia criativa, onde o artista pode ser tudo: compositor, instrumentista, produtor e arranjador. Paul está por trás de todos os passos dos álbuns dele”, comenta Santini.

Segundo Sodré, “muita gente destaca o disco Ram como um pioneiro do que entendemos hoje como indie — um disco mais lo-fi, gravado sem querer atender expectativas da indústria musical. Em 1980, Paul lançou seu disco mais diferente e experimental, McCartney II. Essas criações tiveram sucesso restrito entre fãs dos Beatles, mas mostraram que um artista pode inovar mesmo anos depois de seu auge.”

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Para além da arte

Paul McCartney frequentemente expressa, por meio de sua arte, seu interesse pela conscientização e crítica social. Blackbird é uma metáfora para a luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Ainda no Wings, Macca reagiu ao Domingo Sangrento de 1972, em Derry, com a música Give Ireland Back to the Irish.

Além da música, sua figura pública é usada em atividades beneficentes e para manifestar seu ativismo político, social, climático e ambientalista. Vegetariano, fundou em 2009, com suas filhas Mary e Stella, a campanha Meat Free Monday, que busca reduzir o consumo de carne. Também critica a indústria pecuária e suas emissões de gases-estufa.

Ao participar da marcha Gun For Our Lives, em Washington, D.C., em 2018, McCartney lembrou John Lennon: “Um dos meus melhores amigos foi morto pela violência armada”. Em incontáveis shows, o ex-Beatle tocou (e continua tocando) Give Peace a Chance, não apenas mantendo viva a memória do parceiro, mas também entoando um apelo atemporal pela paz no mundo.

“Come to Brazil, Paul!” — a relação com o Brasil

O primeiro show de Paul McCartney no Brasil foi em 1990, no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, com público recorde de 184 mil pessoas. O mais recente foi em 19 de outubro de 2024, na Ressacada, em Florianópolis. Ao todo, ele já fez 36 shows no país.

Santini conta:

“Assistir a um show do Paul é muito mais que ver um ídolo; é um encontro afetivo com minha própria história. Já vi 19 shows e, em todos, me emocionei como na primeira vez. É sempre mágico, como se o mundo lá fora parasse e só existisse aquela conexão entre ele, a música e nós.”

O rápido esgotamento dos ingressos e a remarcação frequente de datas no Brasil e no mundo refletem o fervor que lembra a Beatlemania dos anos 1960, que simbolicamente nunca acabou.

Sodré comenta:

“Um show de Paul é o mais próximo que as gerações novas têm de um show dos Beatles. Desde 1989, ele foca no repertório dos Beatles. Assisti a 16 shows entre 2010 e 2024, ouvindo várias músicas diferentes. Nos últimos anos o setlist está mais fixo, mas antes ele mudava bastante.”

Paul McCartney é um marco singular para o rock, pop, cultura, música, arte e para a humanidade.

Editado por Enzo Cipriano

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