Competição no GymRats: o app que desafia a rotina de exercícios físicos - Revista Esquinas

Competição no GymRats: o app que desafia a rotina de exercícios físicos

Por Giovanna Toffanelli, Júlia Festagallo e Mariana Garcia : março 31, 2025

Uma pesquisa Datafolha apontou que mais da metade (53%) dos brasileiros acima dos 16 anos têm o hábito de praticar atividades físicas. Foto: Tima Miroshnichenko/Pexels.

Entre motivação e competição, os novos “ratos de academia” usam desafios como incentivo para manter a constância nos treinos com o GymRats

Atualmente, ter um estilo de vida voltado para o bem-estar mental e corporal se tornou uma das grandes preocupações da população global. Porém, será que todo hábito voltado para a vitalidade, como os incentivados pelo GymRats, é realmente saudável?

Diversos canais no YouTube, influenciadores digitais, vídeos no TikTok e aplicativos ajudam a propagar essa nova cultura do autocuidado. Um dos apps favoritos do público é o GymRats (que, em tradução livre, significa “ratos de academia”, ou seja, viciados em treinos).

Lançado nos Estados Unidos em março de 2019, o app ganhou fama no Brasil apenas quatro anos depois. Em entrevista à Revista Esquinas, o CEO e fundador da plataforma, Mack Hasz, 30, conta que, desde o início, seu objetivo era criar algo que “desafiasse as perspectivas convencionais e inspirasse novas maneiras de pensar”. Mas, assim como no uso de qualquer ferramenta, os resultados obtidos pelos “ratos de academia” podem variar, especialmente quando se trata do corpo humano.

Como funciona o GymRats?

O GymRats incentiva a prática de exercícios físicos por meio da competitividade em grupos. Ele possibilita a criação e participação em desafios, nos quais cada usuário deve registrar seus treinos para ganhar pontos e subir no ranking.

A plataforma oferece diversos conteúdos e ferramentas para aprimorar a experiência e facilitar o acompanhamento da evolução. Alguns desses recursos são:

• Planos de treino personalizados: Assim que o cadastro é feito, um questionário gera um treino específico para cada usuário, com base em suas respostas.

• Acompanhamento de progresso: O aplicativo permite monitorar os resultados por meio de relatórios e gráficos detalhados.

• Interação com profissionais e outros usuários: É possível trocar dicas com participantes e acessar artigos de especialistas, que abordam desde alimentação até técnicas de movimentação.

Gamificação é a chave

A aplicação de estratégias de jogos se tornou uma tendência em plataformas que incentivam exercícios físicos, influenciando diretamente a relação entre motivação e realização.

A motivação para realizar algo na vida é regida por fatores internos e externos que impulsionam as ações necessárias para atingir uma meta. Embora o app seja uma nova mania online, seu funcionamento se baseia em uma teoria dos anos 1970, conhecida como Teoria da Autodeterminação. De acordo com os pesquisadores Edward Deci e Richard Ryan, esses fatores podem ser divididos em dois grupos principais: motivação intrínseca e motivação extrínseca.

A motivação intrínseca surge internamente, sem necessidade de incentivos externos. Seus resultados são subjetivos, como o aumento da autoestima e da autoconfiança, que podem se desenvolver ao longo do tempo com a prática de atividades físicas. Já a motivação extrínseca envolve ações tomadas para obter recompensas palpáveis, como entrar em um desafio do GymRats para ganhar um prêmio.

Em um mundo cada vez mais acelerado, motivações externas são mais desejadas para estimular a permanência em um processo. O GymRats busca incentivar seus usuários por meio da visualização do progresso — algo que naturalmente não seria perceptível de imediato — e da inserção em um sistema de recompensas.

Por outro lado, como explora a pesquisadora comportamental Giulia Tessitore em seu podcast “Em Busca da Rotina Perfeita”, atrelar um estilo de vida saudável apenas à motivação externa pode ser arriscado. Quando o objetivo é atingido, há um impulso de motivação, mas, na ausência de recompensas ou diante da sensação de fracasso, pode surgir um ciclo de desânimo, dificultando resultados a longo prazo.

A competição é a alma do app

Em 2023, a estudante de nutrição e influenciadora Letícia Aguiar, 19, conheceu o GymRats pelo Instagram. Para ela, que já tinha hábitos saudáveis antes de usar a plataforma, participar e criar desafios foi algo natural.

Porém, em um dos desafios feitos com amigas, Aguiar percebeu uma grande inconstância por parte das demais participantes, que pareciam motivadas apenas pela competição: “Nos primeiros dias, vi que todo mundo estava muito animado, mas, no final, algumas pessoas foram desistindo.”

Para Mack Hasz, a competição é um motivador poderoso e, por isso, ele a tornou a essência do aplicativo. “É o que faz você se movimentar e se manter ativo. É a razão pela qual o aplicativo funciona tão bem.”

Ele defende que “o aspecto social e o espírito competitivo amigável criam um ritmo natural e uma conexão que ajudam a manter um estilo de vida saudável”. No entanto, para o psicólogo do esporte Matheus Valle, da rede Nauru, essa competitividade só é saudável quando equilibrada, o que nem sempre acontece.

Valle explica que o aumento do rendimento e a “competição inconsciente” podem ser analisados à luz da psicologia do esporte.

No primeiro experimento realizado na área, um indivíduo foi submetido a um exercício e obteve um determinado tempo para concluí-lo. Porém, ao repetir a atividade ao lado de outra pessoa, o tempo do primeiro participante foi reduzido, indicando o impacto da presença de um competidor.

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Isso te motiva ou te pressiona?

Para iniciantes no mundo fitness, praticar exercícios em grupo ou ter um objetivo comum pode ser um bom incentivo para manter a disciplina. Porém, a competitividade pode se tornar um vício e mudar o rumo das coisas.

Conforme um desafio avança, a necessidade de fazer check-ins diários pode levar algumas pessoas a perderem o controle e até o objetivo inicial. Para Valle, é fundamental diferenciar o que motiva do que pressiona.

Embora muitos usem o app de maneira equilibrada, há quem desrespeite os próprios limites para manter a regularidade nos desafios e acumular pontos.

O ideal é que a prática esportiva seja progressiva: primeiro, acostumar o corpo ao exercício, à carga e à frequência. Só depois aumentar a intensidade. Do contrário, há o risco de ‘overtraining’, um estado de fadiga extrema causado pelo excesso de treinamento sem descanso adequado

Alguns ex-usuários criticam a plataforma após se sentirem pressionados pela competição. A influenciadora Jo Azevedo afirma que os desafios começam como algo “legal e positivo”, mas depois se tornam uma “competição louca”, que afeta o bem-estar mental.

@joctazevedo ta mas eu to viciada kkkkk competitiva com gym rats ✨ #fy #humor #academia ♬ som original – Jo Azevedo

Antes de tudo, cure sua relação com a atividade física

Em um país onde os afastamentos por ansiedade e depressão atingiram um nível recorde no ano passado, a prática de exercícios físicos, mesmo que impulsionada por motivações variadas, pode ser um bom começo.

“Atividade física é talvez o top 1 de coisas que você pode fazer para se manter bem mentalmente. Se você não faz nada, qualquer coisa que fizer já será um grande avanço”, afirma Valle.

O psicólogo destaca que autoconhecimento e propósito são essenciais para manter uma boa relação com o exercício. O ideal é criar metas realistas, de forma que o próprio progresso já funcione como recompensa, sem depender de vencer uma competição.

Novas propostas

Segundo Hasz, o GymRats poderá passar por mudanças em breve. O excesso cometido por alguns participantes poderá ser controlado com limites de pontuação, um sistema de honra aprimorado e grupos baseados em metas. “Isso fará com que seja menos sobre competição e mais sobre atingir suas metas pessoais de condicionamento físico”, afirma.

Além disso, serão adicionadas novas opções de sincronização de dispositivos, estatísticas avançadas, rastreamento de progresso e compartilhamento com amigos fora de um grupo.

Em alguns casos, uma avaliação individual com um psicólogo pode ser recomendada, ajudando a compreender questões pessoais antes de assumir desafios intensos e evitar possíveis impactos negativos.

Editado por Enzo Cipriano

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