"É mais trabalhoso que influenciador": como vivem criadores de memes - Revista Esquinas

“É mais trabalhoso que influenciador”: como vivem criadores de memes

Por Victor de Godoy : outubro 28, 2021

Administradores de páginas de memes no Instagram e Twitter contam se sobrevivem da produção de conteúdo, quais as dificuldades e planos para o futuro

Quem nunca fez uma piada na escola ou no trabalho? O humor sempre fez parte da história da sociedade, mas, nos últimos anos, as páginas de memes têm se tornado muito populares. Cada vez mais, esse material tem se consolidado como uma forma de linguagem e se firmado dentro de assuntos mais nichados como música, política, futebol e história.

Mas você já se perguntou como é a vida de quem produz esse conteúdo? Para descobrir, ESQUINAS conversou com Leandro Marin, dono da página História no Paint, Mateus Santos, da Corinthians ao Contrário, e com Murilo Prestes e Marilia Aby, dois dos sete administradores da Melted Videos.

Como tudo começou

Apesar de estarem em redes sociais diferentes – Corinthians ao Contrário no Twitter e História no Paint e Melted Videos no Instagram – todos os criadores possuem algo em comum: começaram no Facebook.

“Na época, não tinha página de meme no Instagram, então quando você entrava era basicamente perfil pessoal, não tinha perfil de empresa, de restaurante. Por isso eu ficava só no Facebook”, lembra Leandro. Ele criou o História no Paint enquanto estava no cursinho pré-vestibular, em 2016, depois de conhecer um novo método de ensino, que se diferenciava do que ele teve na escola e nunca gostou. A descoberta o inspirou a criar a página para ensinar História de forma mais leve.

Mateus começou o Corinthians ao Contrário diretamente no Twitter, em 2019, mas conta que antes produzia memes em contas no Facebook.

Já Marília e Murilo, ambos com 28 anos, não faziam parte da Melted Videos no ano de sua criação, que ocorreu em 2014 também no Facebook. Quem fundou a página foi Felipe Misale, que começou a conta como um projeto pessoal. Em 2017, migrou-a para o Instagram e em 2018, com as eleições, a página começou a crescer. Foi aí que ambos entraram para auxiliar o amigo.

A migração para outras redes sociais aconteceu devido às mudanças no consumo de conteúdos do público em cada plataforma, algo que afeta diretamente no alcance e performance do que é postado nas páginas. Para continuarem seus trabalhos, tiveram que se adaptar e entender os algoritmos.

“Eu não saí do Facebook por opção, foi porque me obrigaram. Fui em um evento sobre memes em que conversaram com a gente e, nesse evento, deixaram bem claro que o Facebook não é para isso. No Instagram eles curtem, mas no Facebook, não”, explica Leandro.

Fazer memes dá dinheiro?

Os criadores de memes afirmam que possuem a vontade de viver integralmente da produção de conteúdo. Mateus, que tem apenas 19 anos, explica que, no caso dele, isso ainda não é possível, apesar de ter planos para isso no futuro.

Na equipe do Melted Videos, a situação é semelhante: por serem uma equipe de sete pessoas, é mais difícil garantir uma renda que mantenha todo mundo. Além disso, explicam que é muito mais complicado para uma página vender publicidades do que um perfil de influenciador digital, por exemplo. “Ainda é meio nebuloso para o mercado publicitário entender o papel das páginas de meme”, diz Murilo.

“Muitas vezes, chega uma ‘publi’ para nós fazermos com o mesmo briefing de influenciadores e o escopo do processo é aparecer nos stories mostrando o produto, mas nós não somos uma pessoa”, comenta. “Temos que abusar da criatividade, é muito mais trabalhoso que um influenciador que só tem que aparecer e falar ‘comprem esse produto’. Mas é um consenso entre nós que gostamos de trabalhar dessa forma, não gostamos de mostrar a cara, achamos que é mais saudável assim.”

Apesar de ser uma página um pouco mais antiga, foi apenas em 2018 que a Melted Videos conseguiu, de fato, certa notoriedade. Atualmente, eles estão transitando para uma maior profissionalização, como conta Marília: “Estamos em um novo momento, comercialmente falando. Nós fazemos todo um trabalho criativo, um processo de criação das peças, de elaboração de conceito, tem tudo isso. Hoje em dia, a gente está trabalhando para virar uma plataforma 360 que possa atender às marcas de várias formas.”

Por outro lado, a História no Paint já sobrevive pela internet faz muito tempo. Desde 2018, Leandro, que hoje tem 25 anos, vive completamente da produção para as redes sociais, seja por meio de parcerias, trabalhos como freelancer ou publicidades. Além disso, hoje em dia, o dono da página faz lives na Twitch, sorteios e está lançando uma loja de roupas. Ele estuda muito as redes sociais, por isso percebe diversas coisas que potencializam seus ganhos.

“Conheço gente que tem páginas dez vezes maior do que a minha e não ganha nem 10% do que eu ganho porque não sabe explorar e estudar [a plataforma]”, diz Leandro. “O que rola com a minha página é que ela é antiga, sempre fui muito transparente e respeitoso com o público, nunca joguei uma publicidade que não acreditasse, sempre deixei claro com a galera. Acho que tem um respeito mútuo com eles, essa transparência com o pessoal, isso motiva muito”.

Planos para o futuro

Mateus acredita estar no caminho certo com a Corinthians ao Contrário, mas se mantém incerto sobre o futuro: “Não sei se a longo prazo é realmente viável. Mas é um grande desejo meu conseguir viver do que produzo aqui. Única coisa que basta para a página ser rentável é alguém ver o retorno que ela dá e se interessar. Acredito que, pelo tamanho dela, está tendo o retorno ideal e, se continuar crescendo, assim como esse meio como um todo está, não será muito difícil”.

Marília e Murilo explicam que, na nova fase do Melted Videos, projetam que todos os administradores possam viver totalmente dos memes no próximo ano. Segundo eles, esse mercado está começando a ser explorado pelas grandes empresas, mas, apesar disso, ainda há certo medo pelo fato da internet não ser a fonte de renda mais segura mesmo nos tempos atuais.

“Do começo do ano para cá, nós trabalhamos muito a organização dentro da casa para podermos viver só da página, mas não é uma coisa tão simples. Até porque esse mercado de memes é muito novo, a gente não sabe até quando isso pode render porque muita gente diz ‘meme é o futuro’, mas você não sabe do futuro”, explica Marília.

Veja mais em ESQUINAS

Inovação na educação: Professor de história traduz conteúdos com rap no TikTok

Eleição ou meme? João do Biscoito, o “candidato da Frozen”, promete vídeo novo

“Left TikTok”: conheça o lado esquerdista da rede social que bombou em 2020

No História do Paint, Leandro está aumentando a equipe. Patricia, sua namorada e assessora, vai começar a trabalhar completamente focada na página. Somado a isso e ao lançamento da loja está o projeto de lançar, em 2023, uma HQ, em parceria com três amigos que o ajudam com a página, com narrativas ficcionais em cima da história do Brasil.

Apesar dos amigos de Leandro não ganharem nada com a página, ele os considera como parte da equipe, uma vez que todos ajudam quando é preciso: “Eu tenho o mérito, mas, se não fosse eles, o projeto não teria chegado onde chegou”.

A relevância dos memes

Muito do futuro dessas e de outras páginas de meme é fruto da maneira como o público vê essa linguagem. Leandro comenta a notoriedade desse mercado e da relevância que esse conteúdo tem ganhado na sociedade: “Hoje em dia, o meme está, cada vez mais, tendo sua importância reconhecida, já existem vários livros e trabalhos acadêmicos sobre memes, não só de história”.

“Se você abrir uma rede social, 90% das coisas que vão estar ali são memes. Hoje em dia, as pessoas aprendem, se comunicam e se informam com memes. Cada vez mais, eles vêm sendo reconhecidos como devem ser e acho que são fundamentais esses trabalhos acadêmicos porque fica difícil de contestar”, diz.

Editado por Julia Queiroz.

Encontrou um erro? Avise-nos.