O projeto de repaginação do Palácio dos Correios nunca foi finalizado. O jornalista e urbanista apresenta os motivos e as consequências da situação
Criado em 1918 com o objetivo de abrigar a Agência Central dos Correios e Telégrafos, o Palácio dos Correios é um dos pontos de referência do centro de São Paulo, principalmente dos arredores do Vale do Anhangabaú.
Realizado pelo Escritório Ramos de Azevedo, o projeto fez parte da conjuntura da urbanização do Vale. O prédio se tornou um local marcante naquela região, fazendo até com que a Praça Pedro Lessa ficasse conhecida como “Praça do Correio”.
Durante os anos 70, a Agência reunia e gerenciava as atividades administrativas dos Correios, porém, na década de 90, esses serviços foram transferidos para a Vila Leopoldina, deixando o Palácio responsável por serviços gerais de postagem. Com isso, em 1997, a empresa dos Correios promoveu um concurso nacional de arquitetura em busca de propostas de adaptações e reformas no espaço, com o intuito de transformá-lo em um centro cultural e a vencedora foi a Una Arquitetos.
A ideia inicial contava com cafés, cinemas, restaurantes, espaços de convivência, salas de exposição e um centro de convenções e, atualmente, apesar de ainda oferecer uma programação voltada para as artes visuais, músicas e arquitetura (por ser um prédio histórico), o projeto não foi finalizado, deixando de lado os planos feitos inicialmente e três pavimentos vazios.
O urbanista e jornalista Raul Juste Lores indica que o tempo da construção é uma das principais causas da mudança de rumo do projeto.”Quem teve a ideia do centro cultural dos correios nos anos 90, certamente não está mais lá. É muito difícil qualquer projeto, quinze anos depois, ter algum tipo de contato com a ideia original. Em quinze anos, tudo muda. Nós mudamos, a sociedade muda, as empresas mudam.”
É um projeto “órfão”
A falta de incentivo ao projeto também chama a atenção de Lores: “É claramente um projeto que nasceu meio órfão”. Além disso, sobre o espaço que poderia ter sido melhor aproveitado pela população, o colunista da CBN declara: “É numa área central, está perto de duas estações de metrô, é um prédio público, tem que ter algum uso”.
A grande área do edifício não é aproveitada pela população, a estrutura conta com uma pequena galeria de arte e uma agência dos Correios, porém, de acordo com Lores, são espaços que “não ocupam nem 10% do prédio”. Outro fato que chama a atenção do especialista é que nos Correios do Rio de Janeiro, diferentemente dos de São Paulo, há um centro cultural “é como se a empresa estatal achasse o Rio importante, mas São Paulo não é, o que também é um tanto maluco”.
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Palácio dos Correios e o povo
Sendo uma cidade repleta de cultura, é bem comum que vários espaços que, apesar de não terem foco em cultura, sejam voltados para esse fim, como por exemplo, o espaço Itaú Cultural.
Porém, para o urbanista, seria mais interessante no aspecto social que a proposta de revitalização do Palácio dos Correios visasse outras questões. “Seria muito melhor ter pensado em algo que gerasse emprego ou moradia ali do que mais um centro cultural no centro de São Paulo”, afirma. “Poderia ser voltado para um polo de startups, hubs, uma incubadora, talvez teria saído mais rápido”, acrescenta Raul.
A região central, onde está localizado o Vale do Anhangabaú, também sofre com os impactos da subutilização do Palácio. “Ter todo aquele espaço térreo fechado é muito ruim para o Vale”, reforça o especialista. Tirar uma ideia tão grandiosa do papel é, certamente, uma iniciativa complexa, o jornalista acredita que ter em mente tantos objetivos de uma vez atrapalhou a execução do projeto “se os Correios tivessem uma ideia de, por exemplo, fazer um café no térreo, o café estaria cheio de gente. Ou fazer um restaurante, um teatro, um cinema, talvez tivesse saído. O problema é querer fazer tudo de uma tacada.”
A área em que está localizado entre inúmeros outros fatores citados pelo especialista evidencia a falta de produtividade em detrimento do potencial do Palácio dos Correios. Ainda de acordo com Lores, mesmo após tantos anos em obras, com histórico de abandonos e retomadas, o Palácio ainda é um local que deve ser aproveitado e valorizado pela população e os futuros comandantes do seu projeto.