Estudantes e profissionais da rede pública de ensino comentam a defasagem acadêmica após a volta das aulas presenciais nas regiões periféricas de SP
Com as medidas de flexibilização entrando em vigor, diversas instituições retornaram com o modelo presencial, dentre elas as escolas. No entanto, os alunos, em específico crianças da rede pública, vêm enfrentando dificuldades em se readaptar ao ritmo da vida escolar.
“A gente se sente muito burro. A escola pública já é triste, online então piorou tudo. Teve muita gente com problema psicológico e muita gente que não conseguiu estudar por conta da defasagem do atendimento dos professores, é triste demais.” diz Maria Fernanda, 17 anos, estudante da rede Estadual. Em entrevista para ESQUINAS, a jovem também relata que grande parte dos colegas com quem convive na escola se sente da mesma maneira.
Muitos estudantes enfrentaram problemas em lidar com o EAD, e embora algumas escolas contassem com uma estrutura física para atender o regresso dos alunos, poucas foram aquelas aptas para lidar com a parte emocional, drasticamente afetada durante 2 anos de isolamento. Doenças como: ansiedade, depressão, estresse e déficit de atenção se tornaram ainda mais corriqueiras entre os jovens.
O que mais tem afligido os estudantes de Ensino Médio são o Enem e demais vestibulares que serão prestados ao final de 2022, uma vez que afirmam não ter ideia das matérias que os professores estão abordando em sala de aula. “Antes eu era ‘de boa’ na escola, mas depois da pandemia não consigo prestar atenção, fiquei mais hiperativa”, afirma Gabrielly Prado, 16 anos, estudante da E.E. Zenaide Lopes de Oliveira Godoy.
A perspectiva dos professores da rede pública
O primeiro contato após o retorno com as crianças foi um tema pautado pela maioria dos profissionais da educação. Neusa Maria de Jesus, 53 anos, diretora da E.E.Prof. João Ernesto de Souza Campos, descreve que “foi um contato complicado após eles retornarem ao ensino presencial, pois os alunos estavam assustados e muito acomodados”.
Tal “comodismo” pode ser compreendido pelo escasso acesso à Internet em zonas vulneráveis da grande metrópole. “A grande maioria não tinha acesso às aulas online. Em muitas casas só havia um celular no qual a família fazia uso e muitas vezes não havia Internet”, explica Elizabeth do Carmo, 36 anos, professora da E.M.I Santa Rita. Outro tema abordado por Elizabeth foi o declínio de qualidade nos materiais que são fornecidos pelo governo estadual às escolas de educação infantil em zonas periféricas. “Os materiais fornecidos aos profissionais eram de má qualidade, dando muita insegurança no seu uso”.
A saúde emocional das crianças e dos jovens também foi ponderada mediante a visão da professora Neusa: “Os maiores desafios estão na questão da aprendizagem, comportamento e no emocional dos alunos”. Era notável que algumas crianças apresentaram dificuldade em interagir com as demais, reflexo direto do tempo passado convivendo apenas com a família.
O que foi comum e preocupante, evidenciado por ambas as profissionais, foi o atraso no desenvolvimento acadêmico. “A defasagem é de praticamente dois anos de escolaridade. Algumas crianças de 4° ano estão com dificuldade grande, a maioria está a nível de 2° ano. Há um grande atraso nas habilidades e competências para cada turma”, pontua Neusa.