Rua Major Diogo, 353: casa da Dona Yayá é um dos maiores mistérios do bairro do Bixiga; venha reviver a lenda de Sebastiana Freire no coração paulistano
No estabelecimento número 353 da Rua Major Diogo fica a enigmática Casa da Dona Yayá. Quando foi construída, em 1851, era apenas um pequeno chalé de tijolos de quatro cômodos, porém, com a passagem dos três moradores seguintes, ele sofreu mudanças. Em 1920, a casa conheceu sua última e mais célebre dona: Sebastiana de Melo Freire, mais conhecida como Dona Yayá.
Filha de oligarcas do café de grande influência política, naturais de Mogi das Cruzes, Yayá teve uma infância dividida entre o interior e a capital do estado de São Paulo. Sua vida foi marcada por episódios trágicos, dentre esses, a morte prematura de suas irmãs, o falecimento de seus pais e o suicídio de seu irmão mais velho, com quem ela partilhava a herança. Segundo Carmen Ruiz, educadora no Centro de Preservação Cultural da Universidade de São Paulo (CPC-USP), após esses eventos, Freire somente interagia com suas amigas do Colégio Sion e a família de sua madrinha, os Grant, sendo considerada estranha por recusar vários pedidos de casamento e se isolar da alta sociedade, que a pressionava por não seguir a norma vigente.
Em 1918, sintomas de uma doença psiquiátrica começaram a aparecer, acarretando em sua primeira internação, no ano seguinte, após uma tentativa de suicídio. Sua doença mental evoluiu velozmente e, em 1920, foi compulsoriamente confinada na casa em questão. A então jovem mulher de 33 anos, Yayá, passou o restante de sua vida ali. Com a aura de mistério em volta de seu tempo presa e após sua morte em 1961, o local ganhou fama de assombrado, garantindo sua presença em tours macabros pela cidade. Até hoje ela atrai visitantes curiosos com a exploração de uma doença séria e a utilização de tratamentos ultrapassados.
A grande herança fez com que a cobiça de seus parentes e cuidadores ultrapassasse a consideração por ela enquanto humana. Sebastiana Freire, em algumas versões, só tinha acesso a um único cômodo escasso de móveis, vindo a ter uma geladeira apenas dez anos antes de sua morte. O solário era o único contato dela com o ar livre, porém sua família afirma que, em dias bons, ela caminhava também no jardim. As únicas que cuidavam dela com amor eram Eliza Grant e Rosinha, sua afilhada.
Ao visitarmos o Núcleo de Convivência para Idosos do Bixiga, tivemos contato com algumas senhoras contemporâneas de Yayá. Ouvimos relatos de que ela era vista “andando de lá pra cá” dentro da casa. Sendo assim, são uma personagem e um prédio fortemente ligados à história do bairro.
A aura de terror atrai os turistas, mas o CPC almeja eliminar essa visão acerca do local. “Acredito que lugares como esse, constantemente associados a sofrimento, de alguma forma tornam-se conhecidos por serem mal-assombrados”, afirma Ruiz. “A Dona Yayá era apenas uma senhora doente, não um caso especial, nada do que o imaginário popular cria e fantasia sobre. A história é aumentada”, completa. A Casa da Dona Yayá é inseparável da personagem – sua história certamente marcou o prédio, porém ela merece ser vista sob outra luz, e não como mais um dos fantasmas do Bixiga.