Durante o mês de julho, ESQUINAS publica reportagens especiais sobre o impacto da covid-19 no comércio e serviços. Este é o 5º texto da série
Para colocar uma nova banca de jornal em São Paulo é preciso passar por uma licitação pública. Além disso, a Lei municipal 10.072 de 1986 determina que “a comercialização de revistas e jornais deve ser a principal atividade das bancas, sendo destinados 75% do espaço interno útil da banca a estes produtos”. Há uma década, o número de estabelecimentos cadastrados como “banca de jornal” na Prefeitura de São Paulo era de 3.178. Hoje são 2.638 bancas, quase 17% a menos que em 2009. Isso tudo antes da pandemia de coronavírus. Para ver como o vírus afetou este mercado era necessário ir para a rua.
O objetivo era parar em todas as bancas em um raio de pouco mais que um quilômetro, até chegar ao Hospital das Clínicas subindo pela Rua Teodoro Sampaio. A primeira banca á da Praça Benedito Calixto, de José Moreira, 63 anos. De máscara, o proprietário diz que é obvio que as vendas caíram, “caiu tudo, não tem como escapar.” A banca não fechou durante a pandemia, motivo que fez José comprar briga com a família. “Querem que eu fique em casa. Dizem que eu sou do grupo de risco. Eu digo que eu sou do grupo dos que abrem”, fala o dono da banca, que está no local há quinze anos.
Seguimos, e a próxima banca é a de Vera Lucia Barros na Cristiano Vianna, já que não há nenhuma na Rua João Moura. A proprietária trabalha junto com o marido a cinco anos no local e não fechou um dia. “A única coisa que alterou foi o horário de funcionamento. Mas a minha vida segue a mesma, com contas para pagar. O resto à gente da um jeito. Já vendo de tudo aqui mesmo”, diz ela se referindo ao fato de usar e vender máscaras e álcool gel no local.
Na banca da Alves Guimarães, trabalha Arliete Iramina, 58 anos. A proprietária trabalha sozinha e sem máscara. Produto não vendido nesta banca. Lá somente se vende jornal e revista. Há dez anos no local, ela também afirma que o movimento caiu. “Tem sido fraco até no final de semana, nada na Teodoro tá aberto.” Mesmo assim a banca não fechou nenhum dia. Para Arliete, o malefício da pandemia é não poder visitar sua irmã com esclerose no hospital. “Para mim isso é o pior de tudo. Mas a gente tem esperança que vai melhorar tudo, já da pra ver que tem mais gente na rua”, afirma.
Mauro Faleiro, 23 anos, é o responsável na parte da tarde pela banca da rua Capote Valente. Lá ele trabalha com a mãe e o irmão mais velho. “A gente sempre teve banca, no centro, na consolação. Aqui é desde 2015 que a gente tá”, diz Mauro. Ele se preocupa com o coronavírus, diz que hoje as pessoas só param na banca para comprar máscaras ou álcool gel. “Máscara tá vendendo, o resto pouco.” Subimos uma rua, e vemos que a banca da Oscar Freire está fechada. Vamos para a última banca.
Entre todas as visitadas essa última é a de melhor localização. Fica quase enfrente ao metrô e ao hospital de Clinicas. Lá, se vende água, refrigerante e guarda chuvas. Mas não vende máscaras, embora o proprietário, Moacir Almeida, 60 anos, fique com uma pendurada na orelha esquerda. “Isso é uma das maiores mentiras que eu já vi. Eu não uso isso.”
Moacir é dono de bancas faz mais de 40 anos e está no local há 18. Ficou 20 dias fechado e diz que este é o pior momento que já enfrentou. “To quase morrendo de desgosto, não consigo pagar ninguém. Nem funcionário eu consigo ter mais”, afirma. Ele possuía um funcionário no turno da manhã e outro no turno da tarde. Agora ele trabalha sozinho, abre às nove da manhã e fecha às duas da tarde. “Eles conseguiram quebrar a economia, conseguiram fazer um estrago com essa mentira. To esperando um chinês vir dar a minha aposentadoria e completar o estrago que já fez.”
Para Moacir o vírus existe, mas não é o que estão dizendo nos noticiários. “Isso é tudo manipulação da Rede Bobo. Bota lá no YouTube, Luciano Ceza, você vai ver. Mas vai com a mente aberta”, diz o dono do estabelecimento. Ele ainda garante que quem trabalha em banca não lê jornal. “Quem disser isso para você está mentindo. Depois de um tempo não lê nem mais as manchetes. Casa de ferreiro, espeto de pau.”