Conheça a W Series, a categoria feminina do automobilismo - Revista Esquinas

Conheça a W Series, a categoria feminina do automobilismo

Por Karina Almeida : fevereiro 9, 2022

A brasileira Bruna Tomaselli encerrou sua primeira temporada em 2021 na 15º posição.

Após 40 anos sem representantes femininas nas principais categorias de automobilismo, a W Series surge como uma oportunidade para novas pilotas

Em 1958, Maria Teresa de Filippis foi a primeira mulher a disputar um Grande Prêmio. No GP da Espanha de 1975, com apenas meio ponto, Lella Lombardi tornou-se a primeira mulher na história a pontuar em uma corrida. Divina Galica, Desiré Wilson e Giovanna Amati também foram mulheres importantes para o automobilismo.

Há mais de 40 anos não há mulheres competindo em provas da Fórmula 1, a maior categoria do automobilismo mundial. Apesar da participação feminina dentro das pistas ainda ser pequena, iniciativas vêm surgindo a fim de trazer essas atletas para as altas competições. Um grande exemplo é a W Series: uma categoria de fórmula exclusiva para mulheres.

Ressignificando a corrida

Catherine Bond-Muir, fundadora e CEO da W Series, conta que a competição nasceu durante uma conversa sobre a presença feminina nos esportes. Grande fã de automobilismo, percebeu que algo precisava ser feito.

Em entrevista à Forbes, a executiva relata que passou anos investindo na ideia. O lançamento oficial, em outubro de 2018, dividiu opiniões. Algumas críticas afirmam que a categoria iria segregar ainda mais o esporte. Contudo, a W Series atua como uma resposta à falta de pilotas progredindo nas categorias ao longo dos anos.

Para a jornalista Nathalia De Vivo, 29 anos, além da visibilidade, esse é o primeiro passo para a profissionalização das mulheres no esporte. Nathalia conheceu a W Series produzindo conteúdo para seu canal no YouTube, o @elasnapista, exclusivamente sobre mulheres no esporte a motor.

Por dentro da W Series

O formato do evento completo é simples. O treino livre e a classificação ocorrem na sexta-feira com sessões de 30 minutos cada. A corrida acontece no sábado com duração de 30 minutos e uma volta adicional. O sistema de pontuação assemelha-se ao da Fórmula 1, mas sem o ponto para a volta mais rápida. Além disso, a categoria distribui pontos para a superlicença, um documento que possibilita pilotar um carro de F1.

A primeira temporada aconteceu em 2019 como categoria-suporte do Alemão de Turismo (DTM). Foram disputadas seis corridas em circuitos europeus. Em 2020 o campeonato foi cancelado por conta da pandemia da covid-19. A segunda temporada ocorreu apenas em 2021 e trouxe mudanças importantes para a competição: divisão por equipes, circuitos diferentes e duas etapas a mais, dividindo oito fins de semana com a Fórmula 1.

Graças ao maior interesse de times e empresas, a segunda temporada da W Series contou com o planejado formato de equipes. A estrutura, ainda em testes, continuou fornecendo equipamentos iguais para todas. O modelo do carro segue as especificações da Federação Internacional de Automobilismo (FIA) para a Fórmula 3.

Número 97: O Brasil no Grid

O principal propósito da W Series é oferecer oportunidades e preparar essas mulheres. Como uma das formas de incentivo, a categoria elimina as barreiras financeiras e atende ao sistema “free-to-enter”, ou seja, sem custos para ingressar.

Desde a temporada inaugural, um processo seletivo escolhe as competidoras. Ao todo a competição possui 18 pilotas regulares e cinco reservas. Em 2021, nove equipes com duas pilotas em cada compunham o grid.

Competindo pela Veloce ao lado da bi-campeã da categoria, estava a catarinense Bruna Tomaselli, 24 anos. “Foi um orgulho para mim poder representar o Brasil e as mulheres na W Series sendo a única pilota do Brasil e da América do Sul competindo na categoria”, comenta.

W Series

A brasileira Bruna Tomaselli encerrou sua primeira temporada em 2021 na 15º posição.
Divulgação

“No começo era mais uma brincadeira mesmo, mas com o passar do tempo comecei a treinar mais e participar de campeonatos e competições maiores”, conta sobre sua trajetória no automobilismo que começou aos sete anos. Depois de passar por muitas categorias de Kart e Fórmula, disputou em 2019 a USF 2000, na qual recebeu o prêmio de piloto com mais ultrapassagens. No mesmo ano foi selecionada para a segunda temporada da WSeries.

Bruna acompanhou a competição desde o início e entende como uma grande oportunidade. “Acredito que não só eu, mas outras meninas também, várias delas não teriam a oportunidade ou chance de competir em um campeonato desse nível, junto com a Fórmula 1 e tudo o que teve”, explica. Para ela, outro diferencial é ter uma equipe de profissionais a disposição e todo o apoio necessário após a classificação. “A gente ainda ganha um prêmio em dinheiro no fim da temporada para ajudar, então é uma grande oportunidade e um prazer”, lembra.

O sucesso da W Series

Para Tomaselli, 2021 foi um ano de muitos aprendizados. Como não conhecia as pistas da competição, sua preparação para as corridas envolveu treinos físicos e simuladores. “Quando vamos para uma corrida da W Series por exemplo, a gente tinha um treino só esse ano, então era pouco tempo. Chegar lá já sabendo o máximo possível é bem importante”, observa.

A catarinense acredita que a categoria está atingindo o objetivo de desenvolver as pilotas. Além disso, fala sobre a segunda temporada da competição: “A gente estava no mesmo fim de semana que a maior categoria, então todo mundo está vendo e acompanhando. Em várias corridas, por exemplo, o Hamilton postou coisas da categoria e até a própria Fórmula 1 postou, então isso traz muita visibilidade. A categoria cresceu. Já foi grande no primeiro ano e esse ano foi maior ainda”.

 

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Uma publicação compartilhada por FORMULA 1® (@f1)

Com o aumento de público, além das transmissões pelo Facebook da categoria, a W Series ganhou transmissão do SporTV no Brasil. Para Bruna, isso fez com que muitas pessoas começassem a assistir, acompanhar e torcer. “Saber que tem um pessoal acompanhando e torcendo é muito bom”, comenta.

Isabela Katopodis, 19 anos, é fã de automobilismo e conheceu a competição por meio das redes sociais em 2019, mas foi em julho de 2021 que decidiu criar uma página dedicada ao campeonato. “Uma semana antes da W Series começar eu estava superanimada. Postei no Twitter ‘cadê o portal da WSeries que ninguém criou ainda?’ esperando que alguém me respondesse. As pessoas começaram a falar que não tinha e eu criei”, relata.

Junto com ela, outras três fãs fazem parte da administração da página. Isabela lembra que não esperavam a repercussão que a iniciativa tomou pois o público no Brasil ainda é pequeno. Ao longo da temporada, realizaram a cobertura das corridas de uma forma descontraída: “A gente cobre as corridas pelo Twitter e de 5 em 5 minutos a gente posta o resultado das 3 primeiras e de onde a Bruna estiver”.

W Series

As administradoras do portal. Da esquerda para a direita, Clarice, Isabela, Amanda e Larissa.
Acervo Pessoal

Além disso, começaram a fazer discussões e entrevistas com pilotas e membros das equipes. “Eu fico nervosa, mas eu acho que todas as entrevistas são únicas e é uma forma que a gente chega mais perto delas”, comenta a paranaense Larissa Rudnik, 20 anos.

“A gente passa todas as informações sobre a W Series e agora começamos a postar sobre outras meninas já que a temporada acabou”, explica Isabela. Hoje, a Women in Msport é uma página sobre a importância da presença feminina no automobilismo. “A iniciativa do portal foi exatamente para trazer mais visibilidade para essas mulheres que ficam apagadas no meio de tantos homens que tem no automobilismo”, diz a carioca Clarisse Juliano, 15 anos, também da equipe.

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As administradoras da página entendem que a W Series é uma forma de gerar mudanças. Como lembra Isabela, a presença feminina no automobilismo ainda gera críticas: “Se você entrar no Instagram da F1 quando postam algo da Jamie, tem comentários falando que ela não deveria estar lá. Se algo incomoda quer dizer que está dando certo”.

Segundo a Pesquisa Global de Fãs de F1 de 2021, realizada pela Nielsen Sports, a participação feminina no público de automobilismo cresceu nos últimos anos. O levantamento foi feito com mais de 160 mil fãs de 187 países e indicou 18,3% de mulheres, sendo apenas que em 2017, esse número não passava de 10%. Para Isabela, além da presença nas pistas, ter mulheres atuando com o automobilismo e falando sobre isso também foi importante para esse crescimento. “Elas param de ter vergonha de torcer”, observa.

Na área desde 2012, a jornalista Nathalia De Vivo ressalta que a mídia passou a dar mais destaque para as mulheres que atuam nesse esporte. “Eu sempre falo que a representatividade é muito importante. Se eu me enxergo naquela pessoa, eu penso que tem alguém igual a mim. Então por que eu não vou acompanhar e assistir”, argumenta.

Para ela, o novo formato e as mudanças da categoria contribuíram para o aumento de público. “Quem está lá no autódromo esperando a corrida da Fórmula 1 e, do nada, vê um grid de 18 mulheres, fala ‘o que é isso? Vou pesquisar!’”, explica. Nathalia também afirma que as principais categorias do automobilismo estão percebendo o interesse das pessoas pelo esporte e investindo em formas de trazer mais mulheres para as pistas. “Acho que está na hora de parar com essa ideia de que o automobilismo é um esporte para homens”, opina.

Assim como Nathalia e Isabela, a pilota brasileira acredita que iniciativas como a W Series ou o Girls On Track, da FIA, são formas de incentivo. “Para quem está começando agora ver que tem uma categoria assim e pensar que um dia pode chegar lá é algo que incentiva”, analisa Bruna.

Apesar de ser um esporte com predominância de homens, Bruna Tomaselli enfatiza que nas pistas, não deve haver diferenças: “Desde quando eu comecei a competir, eu sempre digo que quando se está vestido, todo mundo está lá para vencer independente se é homem ou mulher. Acho que todo mundo é piloto e todo mundo está lá em cena independente do sexo”, completa.

A 3ª temporada do campeonato começa dia 06 de maio de 2022, em Miami nos EUA.

Editado por Nathalia Jesus

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