Em menor escala, Livraria Cultura tenta reacender interesse por leitura - Revista Esquinas

Em menor escala, Livraria Cultura tenta reacender interesse por leitura

Por Pedro Vendramini e Thaís Morello. : dezembro 9, 2024

Estudo revela que Brasil perdeu mais de 7 milhões de leitores desde 2020. Foto: ESQUINAS/Pedro Vendramini

Na tentativa de recuperar leitores perdidos nos últimos quatro anos, livraria descarta tudo que não é importante para focar na leitura

Em um casarão histórico no coração do bairro de Higienópolis, a nova unidade da Livraria Cultura é quase um termómetro dos hábitos de leitura do Brasil, que continuam vivos, mas encolheram e buscam se adaptar à atualidade. Situada em um espaço menor, a loja adota uma abordagem mais intimista, que se livra das distrações tecnológicas de livrarias maiores para trazer ao público o que importa: livros.

O casarão em estilo Neocolonial abriga desde outubro o acervo da livraria. Ele foi construído na década de 1920, e fica no quarteirão do Shopping Pátio Higienópolis. A construção foi tombada como patrimônio histórico paulistano em 2013. A antiga Livraria Cultura do Conjunto Nacional era um ponto turístico e uma parada obrigatória da Avenida Paulista em diversos roteiros turísticos de São Paulo, mas a dívida de mais de 15 milhões de reais obrigou a livraria a fechar as portas em abril de 2024.

A empresa, que está em processo de falência há mais de um ano, anunciou a abertura de uma nova unidade no casarão histórico localizado na esquina entre as avenidas Angélica e Higienópolis, que inaugurou em de outubro de 2024. O charme do local não se limita à sua extravagante fachada, contendo quatro salões principais repletos de livros organizados por gêneros, um piano de calda aberto ao público, e um café para agregar ao passeio. Apesar da diferença de tamanho entre a antiga loja e a nova unidade de 505 metros quadrados significar uma oferta menor de produtos, a livraria extinguiu a venda de produtos de papelaria, aparelhos eletrônicos e outros gadgets que encontrávamos anteriormente, dando destaque merecido aos livros.

A arqueóloga Lucia Giuliani foi conhecer a nova unidade da cultura e relatou que enxerga as livrarias como uma experiencia fundamental para o incentivo à leitura no Brasil, uma vez que os funcionários da loja auxiliam o consumidor nas compras. Essa orientação feita por pessoas treinadas, para ela, é um diferencial que justifica a preferência pelas lojas físicas no lugar de apenas encomendar livros online. Já para Soraya Aggege, uma jornalista que também estava em sua primeira visita, “as pessoas têm que ter o contato tátil com os livros, o meio é a mensagem”. Quando a pedimos uma recomendação de leitura de que pudéssemos encontrar na livraria, ela não conseguiu escolher apenas uma, mas todas as obras do autor colombiano Gabriel Garcia Márquez como leitura de sua preferência.

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A leitura no Brasil

O levantamento “Retratos da Leitura no Brasil”, realizada pelo Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (IPEC), divulgou em novembro o resultado da sexta edição da pesquisa, e aponta que em quatro anos o Brasil perdeu mais de 7 milhões de leitores. Esta perda não afeta somente as livrarias, que sofrem com a escassez de investimento e clientela, mas afeta diretamente o país, que enfrenta uma crise de escolarização e alfabetização pós pandemia.

Em comparação com levantamentos anteriores, o estudo aponta uma diminuição drástica da sala de aula como local de leitura. Apenas 19% da população citou o espaço como lugar onde costuma ler livros. É o menor índice registrado desde a primeira edição da pesquisa, em 2007.

A professora do curso de letras da Universidade de Sorocaba e doutora em linguística aplicada Maria Angélica Lauretti Carneiro, destaca que o baixo investimento e a falta de planejamento na aplicação de recursos na educação básica têm impactos diretos na possibilidade de criação dos hábitos de leitura dos estudantes.

“Como vivemos em um país marcado por grandes desigualdades no acesso das famílias às variadas formas de escrita, além de uma diversidade cultural que caracteriza nosso contexto, isso amplia significativamente a responsabilidade da escola e do professor na formação dos hábitos de leitura”, explica.

Ela completa dizendo que apesar dos avanços tecnológicos proporcionarem um acesso a vasta quantidade de livros e conteúdos multimodais, deve-se utilizar o meio digital com equilíbrio e senso crítico, já que, frequentemente, a leitura digital pode ser associada a um hábito de leitura superficial e fragmentada. Por outro lado, a leitura de livros físicos pode proporcionar, em tese, uma leitura mais profunda e reflexiva.

A reabertura da Livraria Cultura em São Paulo simboliza uma esperança em desenvolver novos hábitos de leitura no Brasil. Afinal, livrarias físicas são espaços culturais que representam a presença dos livros no cotidiano. A curadoria de obras destes estabelecimentos, com a assistência dos funcionários treinados, proporciona uma vantagem sobre a experiencia de compras de livros pela internet e continua tendo um valor importante para os leitores.

Editado por Luca Uras

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