Após Gabigol e MC Gui terem sido flagrados num cassino clandestino em São Paulo durante a pior fase da pandemia no País, os jogos de azar voltaram a ser discutidos
Instalações de alto nível, bebidas importadas, noites temáticas e muita ostentação são as principais características dos cassinos clandestinos localizados em bairros nobres de São Paulo. Da entrada à saída, tudo é pensado para deslumbrar os frequentadores, que, em sua maioria, têm alto poder aquisitivo e não poupam na hora de jogar.
Na madrugada do dia 14 de março, o atacante Gabigol, do Flamengo, e o cantor MC Gui foram flagrados num cassino de luxo na Vila Olímpia, na Zona Sul de São Paulo. Dentre as 150 pessoas que estavam no local, apenas os funcionários usavam máscaras. Além de ser um estabelecimento ilegal – como prevê o decreto-lei nº 9.215, de 1946 –, a aglomeração infringe as normas de segurança pública decorrentes da pandemia. Ambas as celebridades foram levadas à delegacia e responderão na Justiça por crime contra a saúde pública.
Cassino clandestino: uma máfia?
Segundo frequentador ouvido por Esquinas, haveria outras duas unidades da mesma associação que mantém o cassino interditado em 14 de março. De acordo com a fonte, os estabelecimentos ficam em estacionamentos ou prédios que aparentam ser abandonados, mas são luxuosos e frequentados por celebridades.
Apesar de nem tão escondidos (já que alguns possuem até letreiro), eles são exclusivos. Segundo Felipe*, 19, frequentador de uma das unidades, a entrada custa cerca de R$ 300 para os homens e R$ 100 para as mulheres, e só entra quem estiver com nome na lista. O jovem afirma que já presenciou jogadas iniciais de mais de R$ 50.000. Além disso, o estabelecimento nunca deixou de funcionar, mesmo com as restrições da pandemia, e vai até as seis da manhã todos os dias.
“Com certeza é uma coisa planejada. É muito óbvio que está ali, todo mundo sabe porque muita gente vai, eles ganham dinheiro como se faz no mundo todo, é como se fosse legalizado, passam maquininha, tem segurança e manobrista, não tem segredo”. O estabelecimento dispõe de roletas, ‘black jack’, e outros jogos, mas é o poker que levam no nome, pois, apesar de não faturarem com ele, usam para atrair clientes e como fachada — já que é o único jogo legalizado.
Leia mais em ESQUINAS
“O Brasil é usado como exemplo do que não fazer durante uma pandemia”, diz brasileira em Londres
“Estamos perdendo a guerra”, diz médico sobre colapso do sistema de saúde brasileiro
A psicologia da jogatina
O ambiente, as comidas e bebidas servidas e as noites temáticas — que vão de ‘cabaré’ até festas italianas — são minuciosamente pensados para atrair jogadores e envolvê-los.
“O jogo vai contra nossa psicologia, quando vejo alguém jogando pela primeira vez consigo descrever exatamente o que vai acontecer. Sempre acontece a mesma coisa. Tem comida de graça, bebida de graça, japonês de quarta-feira, você só precisa continuar jogando. O jogo por si só já está contra você, você chega lá e pode ou ganhar ou perder, no final é sempre isso. Não tem técnica. Só de jogar você já se compromete em perder dinheiro”. Ele complementa: “se você joga e ganha, você fica louco e quer ganhar cada vez mais. É muito difícil parar, as pessoas vão jogando até perder tudo, e mesmo quando estão no negativo, querem continuar para tentar recuperar”.
Legalização dos jogos de azar no Brasil
Projetos que visam legalizar os jogos de azar como jogo do bicho, apostas eletrônicas e cassinos tramitam no Congresso Nacional desde o governo de Dilma Roussef, mas vêm ganhando mais força recentemente devido às dificuldades financeiras enfrentadas pelo Estado. De acordo esses projetos, essa legalização arrecadaria mais de 29 bilhões de reais em tributos em um período de três anos. Entretanto, especialistas da Receita Federal alegam que a abertura de cassinos na lei facilitaria atividades como lavagem de dinheiro.
De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo, que já possui um ambulatório específico para jogadores compulsivos, 1% da população brasileira é viciada em jogos.
*Nome fictício para preservar a identidade do entrevistado.