Fãs do evento relatam as sensações de acompanhar as Olimpíadas de Tóquio durante a pandemia
As Olimpíadas acabaram, mas além de um número recorde de medalhas para o Brasil, deixaram saudades nos fãs de esporte. Durante os 20 dias do evento, que aconteceu em Tóquio, no Japão, eles trocaram o dia pela noite e a noite pelo dia para acompanhar as provas olímpicas e torcer pelos atletas brasileiros.
Essa edição dos Jogos Olímpicos foi simbólica. Apesar de acontecer com um ano de atraso por conta da pandemia e sob rígidos protocolos de segurança, sem aglomerações e estádios lotados, ela trouxe esperança para tempos difíceis e um acalento para o público de casa. Segundo a psicóloga e psicopedagoga Paula Mariani, 41 anos, as Olimpíadas foram exatamente “o que a gente precisava para dar um quentinho no coração”.
Apesar do avanço da vacinação no Brasil, os noticiários ainda são marcados por altos índices de casos e mortes pela covid-19, além de questões políticas e violência. Paula ressalta que com o evento a mídia não deixou de lado esses temas, mas incluiu em sua programação a leveza dos Jogos e as trajetórias inspiradoras dos atletas. “A gente se conforta com a história do outro”, explica a psicóloga.
Representatividade e superação nas Olimpíadas
A representatividade também foi um elemento-chave para conectar os telespectadores aos esportistas e tornar as competições ainda mais interessantes. Nesta edição, com forte presença feminina, negra, nordestina e LGBT+, a psicóloga enfatiza que os caminhos de cada competidor trouxeram identificação e mobilização entre o público, que muitas vezes não se sente representado. “Ao invés de a gente ver um número, uma camisa do Brasil, a gente começou a ir atrás, a trocar o que se sabe sobre a história de cada um. Por isso que emocionou mais”, explica. Além disso, “os atletas, independente da modalidade, ficam num patamar como se fossem heróis”, e é bom se identificar com heróis.
Para a professora de língua portuguesa e literatura Simone Judice Pires, 53 anos, um tema que representa e até transcende os esportes olímpicos é a superação. Simone estabeleceu uma relação com as Olimpíadas ainda na infância, quando fazia natação.
A professora, que estava reticente sobre a realização das Olimpíadas até a cerimônia de abertura, considera que as competições dessa edição foram “muito mais valiosas”, levando em conta os desafios enfrentados pelos atletas para treinar no período pandêmico. Ela relembra momentos emocionantes dos Jogos de Tóquio, como a divisão da medalha de ouro no salto em altura por Mutaz Essa Barshim, do Catar, e Gianmarco Tamberi, da Itália.
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Quem viveu, sabe
“Só quem vive sabe”. É assim que a estudante de jornalismo Helena Barbosa Geraldes, 19 anos, define a energia das Olimpíadas. Ela esteve presente nos Jogos do Rio, em 2016, mas a paixão começou em 2008, aos seis anos, com os Jogos de Pequim. “Enquanto o meu coração bater, eu vou continuar tendo relação com as Olimpíadas.”
Para a jovem, os Jogos de Tóquio trouxeram uma maior “vontade de viver”. Apesar das noites de sono mais curtas e da tensão diante dos resultados, Helena encontrou nas Olimpíadas uma válvula de escape e ainda levou o espírito do evento para a rotina de seu estágio na área do jornalismo esportivo. “Eu fiquei ainda mais intensa e comecei a aplicar isso no meu trabalho”, conta.
Assim como Helena, o gerente editorial Fernando Almeida, 56 anos, percebeu que os eventos esportivos recentes, como a Eurocopa e as Olimpíadas, “jogaram a gente para cima”. Foi aos 11 anos que Fernando guardou a sua primeira memória olímpica: os Jogos de Montreal, em 1976, com a inédita nota dez na ginástica artística, conquistada pela romena Nadia Comaneci. Desde então, acompanhar as competições pela TV a cada quatro anos se tornou um compromisso, que dessa vez exigiu até mesmo se adaptar ao fuso horário japonês. “Conforme eu fui ficando mais velho, eu fui ficando mais fanático pelas Olimpíadas”, diz.
Os jogos, segundo ele, marcam o “ápice da realização individual e coletiva” dos atletas. Porém, por trás da alegria, as Olimpíadas também têm um “significado mais doloroso”: a desigualdade entre os países a partir do desempenho. “A gente só vai ser realmente uma potência olímpica quando o esporte de base for valorizado e estiver vinculado à educação. E a educação, para isso, precisa ser desenvolvida”, pontua.
Saúde mental nas Olimpíadas
Enquanto as Olimpíadas resgatavam o ânimo e a endorfina de quem acompanhou de casa, a saúde mental foi justamente um dos temas mais pautados durante os Jogos. Após a ginasta estadunidense favorita Simone Biles decidir não disputar algumas provas por questões psicológicas, a ligação entre os sentimentos e o desempenho dos atletas ganhou mais atenção. “O corpo são precisa da mente sã, porque se não ele não funciona”, aponta a psicóloga Paula. “Para você dar um passo para trás, você precisa de muita coragem. Renunciar é corajoso”, completa.
Além disso, ela destaca a importância de se falar abertamente sobre saúde mental dentro do esporte, pois o posicionamento dos atletas incentiva a população a pedir ajuda. “Quando alguém conta uma história, a gente começa a querer contar a nossa história também”, diz, indicando que os jogos em meio à pandemia incentivaram a autorreflexão.
A resistência presente nas quadras, nas piscinas e nos tatames ultrapassaram as fronteiras do Japão. “A gente está resistindo o tempo todo”, diz Paula. E após um ano e meio de pandemia, a psicóloga acredita que os Jogos de Tóquio vieram para “simbolizar a luz no fim do túnel”, que vai continuar acalentando as pessoas com as Paralimpíadas, realizadas entre 24 de agosto e cinco de setembro.
Para a professora, as Olimpíadas resgataram o “sentimento de acreditar que através da ciência, das vacinas, do esporte e do movimento – que é a essência do ser humano –, a gente vai conseguir reestruturar um novo normal e um futuro”. A esperança também permeia as expectativas de Fernando, mas ele ressalta que a consciência coletiva é fundamental para deixarmos “esse momento difícil que a gente viveu”. A pandemia claramente não chegou ao fim, mas Os Jogos de Tóquio, segundo Helena, deram “um incentivo a mais para a gente aguentar um pouco mais firme esses momentos finais”.