Originalmente brasileira, a peça ganha versão pela Escola de Teatro Musical TeenBroadway
“Ditadura, golpe militar, um amor proibido e uma batalha entre USP e Mackenzie. Ou você está de um lado ou do outro”. É assim que a Escola TeenBrodway traz para o teatro o musical “Se Essa Rua Fosse Minha – O Amor nos Anos de Chumbo”. A história retrata a batalha verídica da Rua Maria Antônia, conflito histórico entre as universidades USP e Mackenzie que ocorreu em 1968, durante o período da Ditadura Militar no Brasil.
“A ideia de escrever ‘Se Essa Rua Fosse Minha’ veio de um desejo meu de falar sobre um período da história do Brasil que estava ficando esquecido”, conta o escritor da peça, Marcos Ferraz. “Eu escrevi o texto em 2008. Hoje, a peça está atualíssima. É mais necessário do que nunca gritar que, apesar de você, amanhã há de ser outro dia”.
Marcos também relata que, para ele, é uma imensa satisfação ver que os jovens se interessam pela peça e a acham relevante de alguma forma. “Talvez as pessoas ainda queiram ouvir, por mais um tempo, o que eu tenho para dizer”, explica. “Pelo lado artístico, e até filosófico, o texto ter tido várias montagens com elencos diversos me confirma o verso do Belchior, que o novo sempre vem. E quando o novo vem sabedor do passado ele tem mais força vital para acontecer”.
Ainda, como pano de fundo da narrativa, o musical revela o romance entre Carolina, uma jovem rica que estuda no Mackenzie e é integrante de uma família conservadora de extrema direita, e Pedro, um revolucionário estudante da USP. Em favor de seu amor, os dois universitários de faculdades opostas lutam para enfrentar todas as barreiras políticas e sociais que os separam.
Os “Pedros”
Dividindo o papel de Pedro, Lucas Lira e Lucas Marques. Enquanto um é parte do elenco Chico, o outro interpreta o protagonista no elenco Gal. Lira cursava Produção Multimídia quando teve seu primeiro contato com o universo do teatro e trancou a faculdade para realizar o curso profissionalizante do TeenBroadway em teatro musical. Marques fez teatro desde pequeno, mas foi só no 3o ano do Ensino Médio, em 2020, que começou a pensar se não queria estudar aquilo de verdade e transformar em profissão.
“Em julho de 2020, tivemos as audições. Eu audicionei para Gilberto, amigo de Pedro, e foi uma experiência muito diferente, ainda não tinha tido nada parecido com uma audição de musical”, conta Lucas Lira. “Fizemos a segunda etapa das audições e, quando saiu a lista oficial, eu fiquei sem acreditar. Passei para protagonista! Fiquei muito feliz e ao mesmo tempo desesperado, confesso, pois é muita responsabilidade”.
“No ano passado, começou a pandemia, por isso vamos apresentar só esse ano. Esse é o primeiro musical brasileiro que eu faço, com o estilo MPB, o que me deixa muito feliz e é também o meu maior desafio”, relata Lucas Marques.
Lira ainda conta se identificar com o personagem. Assim como Pedro, também fez parte do Grêmio Estudantil na faculdade e fez iniciação política na Câmara dos Deputados de São Paulo. “Todo esse universo de luta e resistência é muito presente na minha vida, e eu amo fazer um personagem que tem esses ideais”, completa.
A Claudinha
Intérprete da personagem Claudinha no musical, uma garota à frente do seu tempo, Anna Clara Gobatto também nunca tinha atuado antes. Até que conheceu o TeenBroadway, onde começou a fazer um curso livre. “Só durou quatro semanas, mas já conseguiu me mostrar o quanto eu amava aquilo que eu estava fazendo: cantar, dançar, atuar”, diz. “Foi a partir daí que eu resolvi me arriscar no curso profissionalizante e me apaixonei totalmente”.
Essa será a primeira vez que Anna irá pisar em um palco para contar uma história do início ao fim para uma plateia grande. “Eu estou superempolgada e emocionada por ser uma história já tão valiosa o meu primeiro encontro com o teatro musical de verdade”, conta a atriz.
Sobre a sua personagem, Anna é só elogios: “A Claudinha é maravilhosa”. Também estudante da Mackenzie em 1968, diferente de muitas pessoas que a cercam, Claudinha quer ter contato com outras coisas, entender um pouco do mundo ao redor dela e ser livre, poder vestir, falar e amar quem ela quiser, e a qualquer momento. “Eu acho ela é uma inspiração, ela é sinônimo de liberdade pra mim. Eu me sinto extremamente honrada”, conclui.
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O processo e a produção no teatro
Os ensaios, que começaram com o diretor Marcelo Klabin, hoje são responsabilidade da atriz, diretora e bailarina Paula Flaibann, que fez parte do elenco original da primeira montagem de “Se Essa Rua Fosse Minha”. Responsável pela direção musical da peça, Gabriel Fabbri afirma que a principal dificuldade foi esbarrar com uma pandemia na frente do caminho. “Esse elenco foi um dos mais prejudicados que já trabalhei na vida e o mais dedicado, por outro lado”. Com um mês e meio de ensaio, teve início a pandemia e se tornou impossível trabalhar coro, por exemplo. “Decidi junto à direção, dar aulas de história da música brasileira para eles. Acabou que eles tiveram uma formação sólida sobre as bases dela. Foi quase unânime a paixão pelos anos 60, pela música de protesto”, conta. “Nas aulas, além de falarmos de música, discutimos muito sobre história e geopolítica”.
Durante o processo, Gabriel ainda conta que foram tiradas algumas músicas do original e adicionadas outras. Entre essas, Roda Viva, do Chico, que participou do Festival de 1967, e que gerou uma peça homônima, em 1968. “Quando decidimos colocar na peça, não imaginávamos que íamos nos apresentar no teatro Ruth Escobar, justamente palco da temporada paulista de 1968”, explica Gabriel Fabbri. Nesse mesmo palco, o teatro brasileiro vivenciou uma enorme violência: o Comando de Caça aos Comunistas (CCC) invadiu o teatro, quebrou e depredou as estruturas, agrediu o elenco e vandalizou a produção. Era dia 18 de julho de 1968.
A importância do musical para o teatro
Para Anna Clara Gobatto, o musical se destaca ao trazer um contexto histórico tão importante e, infelizmente, tão atual. “Hoje em dia, a gente vem enfrentando um governo que não valoriza a classe artística, que censura e faz coisas muito piores”, explica. “A história não é uma linha reta, muitas coisas se repetem e, para que isso não se concretize e aconteça, é preciso que as pessoas se informem, seja através dos livros de História, das aulas, dos filmes, das músicas e dos musicais. O ‘Se essa rua’ faz esse papel social importantíssimo e conta um pouco da nossa história”.
Lucas Lira reforça o comentário de Anna ao refletir que os personagens da peça podem ser vistos e estão presentes nos dias de hoje, tanto no sistema político brasileiro quanto nas faculdades e nas ruas. “A realidade que não é tão distante da do texto cria em mim um alerta, para que o que aconteceu, não torne a acontecer”.
Concordando com o alternante, Lucas Marques ainda lembra que não faz nem 40 anos que estamos de volta a um regime democrático. “A gente tem que pensar mais nisso e também dar mais valor para não perder”, reforça.
SERVIÇO:
Onde: Teatro Ruth Escobar – Rua dos Ingleses 209 – Bela Vista
Dias: 25, 26, 27 e 28 de novembro de 2021
Horários: Quinta e sexta às 20h30, Sábado e Domingo às 16h e 20h
Classificação etária: 14 anos
375 lugares
Vendas de ingressos: bilheteria.com.br
Valor do ingresso: Inteira – R$100,00
Rede social: @musicalseessarua