“O campo continuará prioritariamente para o futebol, embora outros eventos possam ocorrer em outras áreas do Complexo”, afirma o CEO da Allegra Pacaembu
O palco que já sediou tantos confrontos históricos do futebol paulista está mudando de cor. A grama verde do estádio adquiriu nos últimos meses um aspecto acinzentado do asfaltamento e perdeu espaço para as reformas que vêm sendo feitas. Inaugurado no dia 27 de abril de 1940, o Pacaembu enfrenta desde 2021 uma longa jornada de reformas que divide opiniões.
Em processo iniciado por João Dória e concluído na gestão de Bruno Covas, o estádio Paulo Machado de Carvalho, popularmente conhecido como Pacaembu, foi concedido à iniciativa privada pelos próximos 35 anos, por mais de R$111 milhões. A falta de rentabilidade foi colocada como a principal justificativa para a ação. “Anualmente, tinha um déficit que podia variar de R$ 5 milhões a R$ 9 milhões”, explica Américo Sampaio, coordenador da Rede Nossa São Paulo.
CEO da Allegra Pacaembu e responsável pela administração do estádio, Eduardo Barella afirma que o espaço nas mãos do poder público havia se tornado deficitário por não oferecer uma estrutura adequada ao se comparar com outros estádios mais modernos da capital:
“Os clubes acabaram migrando todos os seus jogos para seus estádios e o Pacaembu ficou em segundo plano, justamente por não oferecer a melhor experiência para o público. É um equipamento antigo e que ainda utilizava banheiros químicos, por exemplo. A Prefeitura não teria como investir em uma modernização”, conta Barella.
O administrador ainda acrescenta que com a nova administração, o Pacaembu terá espaço para um “modelo de negócios capaz de atrair novas receitas que não venham somente do futebol”.
Mas nem todos concordam com isto. Em entrevista para ESQUINAS, Demétrio Vecchioli, jornalista, autor do Blog Olhar Olímpico no UOL Esportes, e um dos principais responsáveis por acompanhar a cobertura das obras do complexo, comenta sobre sua visão à respeito da privatização do estádio e a maneira como a concessão foi feita: “Eu não acho que a privatização seja a única solução, e nem acho que a forma que foi utilizado o dinheiro dessa economia é saudável. Pessoalmente, eu aceito a privatização para reduzir custos. O investimento no esporte, ele existe por algum motivo. Ele existe porque ele traz saúde, ele traz bem-estar, e isso não está sendo feito. No fundo, o que eles querem é gastar cada vez menos. E isso, a curto, médio e longo prazo é ruim em todos os sentidos.”
Demolição da história: o fim do Tobogã
A arquibancada sul do estádio foi a mais demorada e – aos saudosistas, em especial – dolorida parte da reforma. Chamada de “Tobogã”, a estrutura localizada atrás de um dos gols era o setor mais popular do estádio, com os preços que variavam entre R$ 20,00 e R$ 60,00 (a depender do confronto). As obras começaram a partir da demolição da área, em junho de 2021 e, desde então, correm em ritmo acelerado para que terminem dentro do previsto.
Questionado sobre a eventual elitização de acesso ao estádio com a demolição do setor mais popular, o CEO da Allegra afirma que isso se trata de um mito: “Teremos espaço para ingressos mais acessíveis também. O que se deve destacar é que vamos melhorar o nível de conforto, segurança e acessibilidade para todos.”
Onde localizava-se o Tobogã, passará a ser ocupado por um edifício multifuncional de nove andares, sendo quatro deles subterrâneos. Em três dos andares funcionará um hotel, em parceria com a Umusic Hotels. Além disso, ainda terá espaço para restaurantes, cafés, bares, lojas, escritórios, um centro de eventos e convenções com capacidade de até nove mil pessoas, uma arena destinada para atividades de E-sports e mais um estacionamento subsolo.
A grama verde virou um asfalto cinza: o palco cimentado
Asfaltaram o Estádio do Pacaembu. pic.twitter.com/XCFcXfXInq
— Demétrio Vecchioli (@Olhar_Olimpico) January 12, 2022
Em janeiro de 2022, um vídeo postado por Eduardo Barella provocou muitas reações e questionamentos nas redes sociais. Nele, é mostrado o solo, antes colorido pelo verde do gramado, sendo cimentado por máquinas. Esse asfaltamento é temporário, de acordo com a Allegra, sendo necessário atualmente para facilitar o transporte de máquinas e ampliar o canteiro de obras, onde será construído o “Edifício Multifuncional”.
Mesmo assim, ainda existem sérias dúvidas se o futebol voltará a ser o foco do estádio, as quais foram aumentadas por falas de administradores exaltando o espaço como lar de eventos musicais e culturais.
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Pacaembu e o futuro: o retorno do espetáculo
As obras de modernização do complexo Pacaembu começaram no final de Junho de 2021 e têm data prevista para duração de 24 a 28 meses. “Iniciamos em junho de 2021 com previsão de término no fim de 2023”, como afirma o atual administrador do complexo. Entretanto, as atividades inaugurais começarão a ser feitas a partir do mês de Abril, na área denominada “Pavilhão Pacaembu”.
Será inaugurado no dia 30 de Abril um espaço temporário para a realização de eventos, sob uma tenda de quatro mil metros quadrados, com capacidade para até nove mil pessoas e toda equipada com isolamento acústico, que será erguido em parte do local onde ficava o campo de futebol. O espaço sediará uma apresentação da cantora Gal Costa, para um público de três mil pessoas. Os ingressos já estão à venda e podem ser adquiridos pelo site oficial do Pacaembu, com preços que variam entre R$ 97,75 (meia) a R$ 195,50 (inteira).
Em relação à conciliação entre os eventos culturais e futebolísticos, Barella afirma que “uma coisa não exclui a outra. Teremos espaços dedicados a recepção de eventos e shows no subsolo do novo edifício que será construído no lugar do tobogã. O campo continuará prioritariamente para o futebol, embora outros eventos possam ocorrer em outras áreas do Complexo paralelamente”.
O último jogo disputado no Paca antes da paralisação do futebol por conta da pandemia da covid-19 e, posteriormente, devido à reforma, foi um 0 a 0 entre Palmeiras e Santos, em duelo válido pela 9ª rodada do Campeonato Paulista, no dia 29 de fevereiro de 2020. Com a demolição do Tobogã, a capacidade do estádio passa de 40.199 pessoas a 28.437, reduzindo assim a quantidade de público nas arquibancadas do Paulo Machado de Carvalho.