Festival Okinawa: como festividades ajudam a manter viva a cultura japonesa no Brasil - Revista Esquinas

Festival Okinawa: como festividades ajudam a manter viva a cultura japonesa no Brasil

Por Gabriel Cól, Gabriela Salomoni e Miguel Teles : fevereiro 26, 2024

Agricultores japoneses do bairro de Itaquera por volta de 1930/Foto: Reprodução/UNIFESP

Há 115 anos, o navio Kasato Maru, vindo diretamente de Osaka, atracava no porto de Santos, e dava início a imigração japonesa no Brasil

Hoje, o Brasil é a casa da maior comunidade japonesa fora do Japão, com mais de 1,4 milhão de descendentes, dos quais cerca de 80% vivem em São Paulo.

A cultura japonesa segue pulsante no estado, através de diversas festas e eventos organizados pela comunidade, como o Festival das Cerejeiras, em Garça, e o Okinawa Festival, no Carrão.

Durante o início da imigração, a zona leste foi uma região onde uma grande quantidade de imigrantes japoneses se estabeleceram, principalmente os vindos da região de Okinawa. A chegada dos japoneses à região começou pelo bairro de Itaquera, em 1925, enquanto os imigrantes originários do arquipélago de Okinawa, por sua vez, se alocaram na Vila Carrão. E, para celebrar a cultura okinawana e manter viva suas tradições, a Associação Okinawa de Vila Carrão realiza todos os anos o Okinawa Festival.

Okinawa pertence a uma das 47 prefeituras do Japão, localizada no arquipélago de Ryukyu, ao sul do território japonês. Sua cultura apresentava traços distintos do resto do país e contava inclusive com um dialeto próprio, e então a discrepância cultural levou a discriminação dos okinawanos por parte dos outros japoneses. Por isso, muitas famílias Okinawanas decidiram fugir da ilha, e o destino escolhido foi o Brasil. Atualmente, a Vila Carrão abriga mais de 500 famílias que possuem descendência okinawana, a maior comunidade fora da ilha.

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Nikkei Shimbun, jornal publicado no Brasil em japonês, noticiando a realização do Okinawa Festival.
Foto: Reprodução/Facebook

A grande influência cultural dos okinawanos na zona leste fez com que fosse fundada, em 1956, a Associação Okinawa de Vila Carrão, que busca celebrar a cultura e as tradições do povo. Com isso em mente, a Associação realizou em 2003 o primeiro Okinawa Festival, evento que ocorre anualmente, e em 2023 foi realizada sua 19ª edição.

O evento conta com atrações tradicionais japonesas e okinawanas, entre elas estão as danças clássicas da região, tocadores de sanshin, taikô e wadaiko, instrumentos tradicionais de Okinawa, e diversas barracas de comida local.

As gêmeas Juliana e Laissa Machida, de 20 anos e nascidas no Japão, são frequentadoras de eventos como este. Segundo elas, essas festividades têm grande impacto na vida da comunidade nipo-brasileira. Filhas de brasileiros, as irmãs nasceram na cidade de Yatomi, durante o período em que os pais viveram na cidade a trabalho. Elas contam que quem ajudou a manter a forte presença dos costumes japoneses em casa foram os avós, Isono Kurimoto Machida e Yasunori Machida, nascidos respectivamente em Nara e Gunma, no Japão. 

Desde a infância, as irmãs frequentam eventos dedicados à cultura nipônica em São Paulo. Levadas pela avó Isono, elas contam que, por sua influência, a culinária, língua e costumes japoneses ainda são presentes em suas vidas. Juliana relata que a cultura oriental “sempre esteve presente” durante sua criação, e acrescenta:

“A gente sempre viveu como uma família japonesa, só que no Brasil.”

Laissa conta que as festividades feitas no Brasil são “formas de representar o Japão, assim como mostrar para a sociedade brasileira um pouco da cultura japonesa”. Sua irmã completa dizendo que “a cultura local está presente nesses eventos, porém, não são capazes de trazê-la a fundo e mesmo sendo de grande importância, os eventos não se comparam a entrar em contato com as pessoas que realmente vivem isso. Então, nada melhor do que a experiência de ir até o país e ver realmente como é, como as pessoas agem”. Para ela, os japoneses que vivem no Brasil ainda carregam parte dos costumes nipônicos, mas acabam se adequando à população brasileira. 

Quando perguntadas se conseguem se ver representadas em eventos como o Okinawa Festival, as respostas foram divergentes. Laissa conta se sentir bem representada, que se sente entre suas raízes, pois mesmo não tendo crescido no Japão, vê familiaridade com o que sempre viveu dentro de casa. 

Já Juliana diz não se sentir tão representada. A jovem comenta ter “crescido mais no Brasil do que no Japão”, e completa dizendo que, apesar de ter costumes brasileiros, muito dessas festas lhe é familiar: 

“A população japonesa, pelo menos a que eu tive contato, tem uma coisa bem familiar com esses eventos. Então, em questão de tradição ou material mesmo, é como se eu estivesse aqui em casa. Lá tem bastante coisa que eu sei que na casa de qualquer pessoa que mora aqui no Brasil, de um brasileiro, não teria. Têm algumas tradições, desenhos, músicas que a gente cresce escutando, que a gente escuta lá, e que passam um ar bem familiar.”

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O Okinawa Festival, assim como outros eventos e organizações nipo-brasileiras, são a forma que imigrantes encontraram de manter viva a cultura de sua terra natal no Brasil. Porém, essas festas parecem transcender seu intuito. 

Ao final da entrevista, Juliana reforça o valor de reconhecer o papel sócio-cultural dessas celebrações. Eventos em localidades específicas, organizados por parcela da população de um bairro, como Okinawa Festival, simbolizam mais do que uma mera festividade sazonal, mas uma afirmação da presença de uma cultura em um ponto específico de uma cidade, no caso, São Paulo. 

“Eu acho que a importância desse tipo de festa aqui no Brasil também é para mostrar um pouco para a população brasileira a nossa cultura, e eu tenho certeza que ela é encantadora. Em todos os âmbitos e quesitos, ela é encantadora”, diz Juliana Machida.

Editado por Mariana Ribeiro

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