História em quadrinhos traz para debate a questão da homossexualidade no futebol - Revista Esquinas

História em quadrinhos traz para debate a questão da homossexualidade no futebol

Por Luca Castilho : setembro 21, 2018

O Outro Lado da Bola apresenta a vida de um jogador de futebol que resolve se assumir homossexual publicamente

Já imaginou o melhor e mais popular jogador do seu clube se assumir homossexual em rede nacional? Essa é a narrativa tratada no livro O Outro Lado da Bola. Em 214 páginas, a história em quadrinhos relata a vida de Cris, camisa dez e capitão do Alvinegro Paulista, fictício clube da cidade de São Paulo. Com texto de Alê Braga e Alvaro Campos e desenhos de Jean Diaz, a HQ nacional, publicada em 2018 pelo Grupo Editorial Record, discute o tema recorrente na esfera social, mas que ainda é tratado como um tabu no âmbito esportivo. Até os dias de hoje, nenhum jogador brasileiro se revelou oficialmente homossexual.

Casado com Suzana e padrasto de Kika, Cris é o principal jogador do clube mais popular da capital, o Alvinegro Paulista. Meio-campo de muita habilidade, o atleta recebe o carinho da torcida e é o líder da equipe dentro das quatro linhas. Entretanto, esconde do público o fato de ser gay. O “deixa de viadagem” é uma constante nas suas partidas. Até que, certo dia, um casal homossexual é agredido na rua por dois integrantes da torcida organizada do Alvinegro. Um deles morre. Apesar de parecer mais um fato “banal”, este era Guto, professor e ex-namorado de Cris.

No dia seguinte, o atleta participa de um programa de televisão ao vivo, veiculado em rede nacional. Conturbado pelo ocorrido, Cris responde aos questionamentos da jornalista que o entrevista de maneira despretensiosa. Incomodada com o comportamento do convidado, a apresentadora resolve intimar o jogador, no intervalo, a falar algo com alguma importância no bloco seguinte. Na volta dos comerciais, Cris fala da morte de Guto e revela sua homossexualidade.

Veja mais em ESQUINAS

Sem avareza: garçom relembra trajetória no tradicional Itamarati, o restaurante do “pendura”

“A arte é um jeito de se fazer ouvir”: professora cria Museu do Isolamento com alunos do 6º ao 9º ano

Cinemas de rua: um retrato da resistência

A partir de então, a ficção ganha uma nova e, aliás, triste cara. Ao mesmo tempo que recebe mensagens de apoio, Cris é alvo de inúmeras mensagens de ódio e ameaças. Ele é perseguido pela torcida organizada do clube, os patrocinadores ameaçam encerrar o vínculo, a enteada vira alvo de bullying na escola e alguns companheiros do time se voltam contra o capitão, principalmente aqueles ligados à igreja evangélica. “Aqui é lugar de homem” e “Alvinegro não merece chacota”, ouve o atleta quando se aproxima do estádio do seu time.

Em meio a esse caos, o jogador tenta se restabelecer tanto dentro quanto fora de campo. Paralelamente, a obra também mostra alguns episódios específicos da vida de Suzana. A esposa do atleta, que poderia ser apenas criação de um casamento de fachada, se mostra uma pessoa essencial para a aceitação de Cris. A HQ também traz a trajetória de um dos assassinos de Guto e sua própria tragédia pessoal.

Em um país onde a homossexualidade é referida como doença, como Cris seria tratado? Em um país onde um homossexual, vítima de homofobia, é assassinado ou se suicida a cada 19 horas, segundo a ONG Grupo Gay da Bahia, como Cris seria tratado? Em país onde os torcedores criam cânticos homofóbicos para os adversários, como Cris seria tratado? Resta a reflexão para você, torcedor ou não: qual seria sua reação? A crítica proposta pela história em quadrinhos O Outro Lado da Bola é um importante marco para a causa começar a ter uma atenção especial e a ser discutida dentro do mundo do futebol.