A animação da Capivara Animation Content já possui mais de 176 mil visualizações e satiriza negacionistas da covid-19
Mato Grosso do Sul, Campo grande. Mais um dia comum na vida de Francisco Jonathan de Lima Joaquim, 28 anos. O publicitário acompanhava suas redes sociais e algo chamou sua atenção: um tweet sobre o jogo Dumb Ways to Die. O game surgiu derivado de um vídeo publicitário criado pela equipe ferroviária de Melbourne, Austrália, e nele mostra maneiras “estúpidas” de morrer. Vendo aquele conteúdo, Francisco se perguntou por que não havia uma paródia musical com aquele estilo abordando a pandemia e, principalmente, como os negacionistas lidam com o assunto.
No dia seguinte à ideia, o publicitário começou a produzir o videoclipe. Francisco assumiu o papel de diretor-criativo do projeto e reuniu alguns ilustradores, designers e animadores com quem já havia trabalhado. As etapas de direção e ilustração do projeto foram divididas ao meio, de maneira que Francisco ficou com uma parte e o ilustrador Bruce Fábio ficou responsável pela outra. “Depois de reunir o pessoal, tive que organizar as etapas e funções, pois era meu papel como diretor. O Fernando Henryque, roteirista do vídeo, escreveu o texto e nos enviou, então demos sugestões para encaixarmos algumas frases e, juntos, fomos ‘lapidando’ a letra. Apesar disso, a redação é dele, quase 100%”, explica Francisco.
Após essa situação, a equipe enfrentou alguns problemas técnicos. “Na etapa de animação, o animador, Arthur Ruiz, viu que não iria conseguir entregar o projeto no prazo que esperávamos, mas era importante que fosse concluído o mais rápido possível, pois a informação se torna antiga rapidamente”, conta o diretor.
A luz no fim do túnel foi Antonio Souza, um profissional chamado por Arthur para ajudar no processo de animação. A partir daquele momento, o trabalho fluiu muito bem. O diretor-criativo deu total liberdade aos animadores em suas tarefas, o que tornou a produção bastante colaborativa.
Agora, só faltava encontrar a voz que interpretaria a canção. O roteirista Fernando Henryque enviou para a equipe um vídeo de Jool, uma cantora de Campo Grande. Todos assistiram e concordaram que Juliana Araújo Gomes, 20 anos, deveria ser a intérprete da música. A estudante de música na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) gostou da ideia e aceitou participar do projeto.
Como o tempo era escasso, só havia um dia disponível para gravar a música, mas isso não foi um problema para ela. “O Fernando falou comigo e mandou a letra à noite. O prazo era um pouco curto para gravar, mas eu já conhecia a melodia da música, então foi bem mais fácil para mim. Peguei o backing track (música de fundo), um áudio que eles me mandaram e fui encaixando da minha forma, colocando um elemento mais falado, porque achei que combinava com o ar irônico da letra. Ensaiei até ficar forte na minha cabeça, gravei no outro dia de manhã, em casa mesmo, e enviei”, conta.
A animação ainda tinha perspectivas de repercussão internacional, por isso foi solicitado à Ligia Burton, professora de inglês, que traduzisse a letra da música. E como desejavam os produtores, o vídeo alcançou portais nacionais, como o B9 e o Rolling Stone, e países como Espanha, Argentina e Cuba.
“Como assim? A gente está famoso”, foi como Juliana reagiu ao sucesso do vídeo. Apesar da surpresa, ela já esperava que a animação fosse repercutir bastante, por conta do teor e da qualidade da produção. “É uma coisa que não é natural, não é todo dia que a gente vê um negócio desse. Você vê os outros, mas não se vê reagindo a isso”, comenta a cantora.
De acordo com ela, a originalidade do vídeo foi o principal fator que contribuiu para o sucesso. “Acho que eles encaixaram as frases certas na hora certa. A letra da música tem um clímax, então a voz também precisava ter. Tive todas as condições para fazer isso, por conta da letra e do que os meninos me deram. Eu tenho a necessidade de colocar minha personalidade no trabalho. Se estou fazendo, tem que ter uma marca minha ali”, conta.
Ela ainda explica que a crítica não foi às pessoas que precisam sair para trabalhar e sustentar a família, mas para quem têm a possibilidade de ficar em casa e, mesmo assim, não respeita o isolamento social. “No final, a música não representa toda a dor que essa pandemia causa”, comenta.
A princípio, o próprio diretor do projeto não queria que o vídeo possuísse nenhum teor político, pois sua intenção estava relacionada à doença, não nas escolhas governamentais do país. Ele sugeriu uma discussão sobre o assunto no grupo, mas logo foi convencido a mudar de ideia. “Acatei o que a maioria queria, mas no final acredito que era necessário mesmo, senão não teria o impacto que teve”, conta Francisco.
Na opinião da cantora, a divergência de opiniões é normal, mas o posicionamento é fundamental. “Posicionamento político hoje em dia é religião. O nosso vídeo é apartidário. Não estamos a favor de ninguém, mas estamos contra um lado. Chega um momento em que, se você não se posiciona, mesmo que não seja a favor, você está contribuindo para que algumas coisas continuem a acontecer. A arte é uma forma de se posicionar e acho que é muito importante ter vídeos como esse”, conclui.