Por que megaeventos gratuitos como o de Lady Gaga não acontecem em São Paulo? - Revista Esquinas

Por que megaeventos gratuitos como o de Lady Gaga não acontecem em São Paulo?

Por Eduarda De Nadai Generato, Lavínia Vilas Bôas e Luiza Fazzi  : maio 6, 2025

São Paulo e o Rio têm realidades diferentes quando o assunto é a realização de megaeventos gratuitos. Foto: Vishnu R Nair/Pexels

Apesar da infraestrutura, a cidade enfrenta desafios políticos e financeiros que dificultam a realização de shows gratuitos, como os do Rio

Após Lady Gaga movimentar Copacabana com seu megashow no último sábado (3), vários fãs relembraram a passagem de Madonna, também no Rio de Janeiro. E a dúvida que fica é: por que momentos como esse não acontecem em São Paulo?

Apesar de ser uma das maiores metrópoles do mundo, São Paulo ainda enfrenta obstáculos quando o assunto são megaeventos gratuitos de música. Enquanto cidades como o Rio de Janeiro conseguem levar artistas como Madonna e Lady Gaga às ruas sem cobrar ingressos, a capital paulista esbarra em desafios políticos, logísticos e econômicos que impedem a realização desse tipo de espetáculo. Produtores e especialistas apontam o que falta para a cidade entrar nesse circuito.

O que São Paulo tem de especial?

São Paulo é um dos maiores polos de eventos da América Latina. De acordo com a União Brasileira dos Promotores de Feiras (UBRAFE), a capital paulista concentra cerca de 75% das feiras de negócios realizadas no país, movimentando setores como turismo, hotelaria, alimentação e transporte. Além dos encontros corporativos, a cidade também recebe anualmente alguns dos maiores festivais de música do Brasil, como o Lollapalooza e o The Town, além de eventos de escala internacional, como a Fórmula 1, a CCXP e a Campus Party.

Segundo o economista Caio Schmidt Duarte Vaz, o diferencial de São Paulo está na estrutura e na forma como é possível viabilizar seus grandes eventos. Ele destaca a diferença entre os modelos de financiamento adotados por São Paulo e por outras capitais brasileiras. “O Rio de Janeiro é muito dependente de subsídios públicos, o que garante a realização desses megaeventos sem custos para o público.” Já em São Paulo, o modelo econômico se baseia principalmente em parcerias público-privadas, o que reduz a necessidade de investimento estatal direto para grandes produções. “São Paulo não tem a mesma dependência de subsídios públicos que o Rio, e isso é um fator determinante.”

De acordo com Caio, a infraestrutura de São Paulo é mais que suficiente para sediar megaeventos gratuitos, desde que sejam feitas as parcerias certas. “Não há obstáculos significativos em termos de infraestrutura.” O que falta, na visão do economista, é uma articulação eficaz entre os setores público e privado para financiar eventos desse porte sem sobrecarregar os cofres públicos. “O modelo ideal para São Paulo seria uma combinação de incentivos públicos e privados, como já acontece em eventos como a Fórmula 1, em que grandes marcas entram com investimentos substanciais.”

Por que os megaeventos escolhem o Rio?

Para a produtora especializada em planejamento e gestão de eventos, Priscila Nicacio de Souza, São Paulo é, sim, capaz de realizar grandes eventos. Ela cita a Avenida Paulista e seus arredores como sede de muitos que já ocorreram na capital. No entanto, compara a atratividade com a do Rio de Janeiro. “O Rio é uma cidade essencialmente turística. Ele é moldado para ser mundialmente pensado. Está no imaginário coletivo global como a cidade do samba, do Carnaval, do futebol, do Cristo e da praia. Já São Paulo tem um turismo mais voltado ao mundo corporativo, concentrado especialmente na região da Paulista.”

Pelo lado financeiro, Nicacio destaca que, mesmo sem a receita proveniente da venda de ingressos, muitos custos precisam ser considerados. “Se tem uma coisa que não é de graça, é um megaevento. Uma atração caríssima, altamente regulamentada. A polícia recebe por um megaevento, a CET, a prefeitura, todo mundo na cidade que está envolvido na execução recebe taxa pelo evento que está acontecendo.”

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Produção de megaeventos: como sai do papel?

Fugindo dos padrões já conhecidos, as produções de megaeventos gratuitos, como os shows de Madonna e Lady Gaga, estão se tornando cada vez mais recorrentes. Porém, ao se afastarem do usual, geram curiosidade sobre seu planejamento, uma vez que a ideia de acessibilidade a artistas de forma gratuita é vista como algo distante da realidade.

Segundo o produtor de eventos Antonio Moysés Hallage, shows como os realizados na capital carioca se enquadram como eventos sociais, ou seja, são incentivados pelo governo. Ao serem vistos como uma boa causa para a população, essas produções são oferecidas ao público de forma gratuita, o que acaba gerando grande repercussão. No entanto, esse investimento precisa gerar retorno de algum modo, começando pela movimentação do comércio local. “Mas ao redor, nós temos várias coisas que vão acabar girando ali, né? O governo fomentando isso, o dono do hotel vai ganhar dinheiro, o dono do Uber vai ter mais corridas, ou seja, o comércio vai se movimentar.”

Com a massiva circulação de pessoas na cidade, o valor que seria obtido por meio da venda de ingressos acaba retornando de outra forma, beneficiando não só os que prestigiam o evento, mas também os vendedores locais e ambulantes, que são favorecidos pelo aumento do turismo.

Além do investimento por parte da prefeitura, há também diversos patrocinadores que contribuem para a produção desses eventos. Por exemplo, o show de Lady Gaga contou com o apoio de marcas como Guaraná Antárctica, Beats, Zé Delivery, Santander, entre outras. Ou seja, grande parte das contribuições veio de empresas privadas que atuam como parceiras comerciais, associando suas marcas ao artista e, consequentemente, ganhando maior visibilidade a partir desses eventos.

Do Rio de Janeiro para São Paulo

Então, como essas produções podem passar a fazer parte dos eventos promovidos em São Paulo? Para Antonio, a pesquisa com o público é a chave fundamental quando falamos de eventos sociais. Grande parte da população de São Paulo foi até o Rio de Janeiro para os megaeventos, o que leva à reflexão sobre o motivo de não trazer esses eventos para as pessoas, considerando que o estado de São Paulo é o mais populoso do Brasil.

“Uma pesquisa no local do evento, lá no Rio de Janeiro, para entrevistar paulistas e saber se gostariam de ter um show desse tipo em São Paulo. Eles estão saindo daqui para gastar o dinheiro lá no Rio, enquanto poderiam gastar dentro de casa.”

No caso em questão, ter uma opinião pública favorável à realização de megaeventos gratuitos na cidade de São Paulo é um passo importante para a chegada dessas produções, já que a cidade possui espaços que logisticamente são capazes de comportar o evento, como o Parque Ibirapuera, o Parque Villa-Lobos, ou até mesmo a Avenida Paulista, onde é realizado o Réveillon, que reúne milhões de pessoas.

Editado por Enzo Cipriano

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